Após cerca de sete anos ofertando 50 vagas para o acolhimento de homens, a Casa de Apoio Celeiro de Cristo, no bairro Reolon, encerra nas próximas semanas o convênio com a FAS. A parceria garantia subsídios públicos para custeio de pessoal e manutenção de parte dos serviços de assistência social. As justificativas para o fechamento são a insustentabilidade financeira causada pela insuficiência de recursos próprios e pela iminente interrupção dos repasses do município, após o Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS) determinar o cancelamento da inscrição por inadequações no atendimento.
De acordo com parecer elaborado pelo CMAS, a Celeiro de Cristo tem características de casas terapêuticas, que eram atividades desenvolvidas no local quando foi inaugurado, em 2001. Com isso, tornou-se inválido o convênio devido ao fato de a entidade não se enquadrar mais, conforme a avaliação, nos critérios que definem a assistência social.
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— Não tivemos recursos para continuar a pagar técnicos, assistentes sociais, psicólogos, educadores e não tínhamos mais condições financeiras próprias para nos mantermos. Infelizmente, as dívidas se acumularam e ficou inviável. Neste ano foram repassados R$ 218 mil, mas, independentemente do valor, ia fechar. É uma entidade privada, mas não tinha mais condições. Sem contar que, devido à crise, patrocinadores nos deixaram — explica Paula Cidral, coordenadora da Celeiro de Cristo.
Apesar de comentar que a entidade foi alvo de cobranças do Conselho de Assistência Social, ela elogia a nova gestão da FAS, a qual afirma ter aberto o diálogo com maior facilidade.
— Tivemos abertura para o diálogo, o que nunca tínhamos tido antes de forma tão ampla. A própria ex-presidente da FAS nunca foi nos visitar e a mais recente foi. Até quando deliberamos encerrar foi uma decisão da entidade, mas fomos chamados pela FAS, que ofereceu possibilidade de abrir um edital, ou usarmos uma outra estrutura do município. Por questões de recursos, não aceitamos, pois sabemos que não teríamos como nos manter — complementa.
Apesar de a FAS ter encaminhado o remanejo dos usuários da Celeiro de Cristo, ainda assim, Paula acredita que em médio e longo prazo, haverá insuficiência de vagas na rede de acolhimento.
— A probabilidade de que tenham pessoas na rua posterior a esse processo de transição é muito grande. Se hoje todos os nossos serviços de acolhimento estão sempre lotados, alguma coisa está errada. Com certeza isso vai voltar a acontecer. Agora estamos numa época diferente, final de ano, verão, pessoal migra para a praia. Talvez os problemas se tornem mais evidentes depois.
Apesar de elogiar as propostas apresentadas pela FAS, ela afirma que o fechamento da Celeiro de Cristo deve forçar uma reorganização da assistência social do município.
— Eu acho que foi correta a decisão de fechamento do Caxias Acolhe, o que eles não contavam era que a Celeiro fosse fechar, então para não ter problemas eles vão precisar investir. O investimento na população adulta ainda é pouco. Todos apoiam entidades que auxiliam idosos e crianças, mas não adultos em situação de rua. Acho que uma boa seria manter uma das entidades 100% pública, acredito que seria um retrocesso conveniar todas. A Celeiro, por exemplo, é privada, e a gente decidiu fechar e vai fechar, já o público, é público, não pode fazer isso simplesmente quando decide — argumenta.
Abrigos de menores estão superlotados
Os três abrigos que atendem crianças e adolescentes de zero a 18 anos em situação de risco em Caxias estão superlotados. Cada casa tem capacidade máxima de 20 usuários, mas atendem praticamente o dobro do limite previsto. A situação gera transtornos para funcionários, sobrecarregados diante da desproporcionalidade, e também aos usuários, que acabam muitas vezes recebendo pouca atenção. Duas das unidades do serviço são públicas e uma funciona por meio de parceria com uma entidade.
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— Além da superlotação, temos fila de espera. Estamos falando de crianças vítimas de violência. Tem casos de meninas que chegam grávidas do próprio pai. Precisamos ter mais atenção a esse público e, por isso, muitas vezes os adolescentes ficam jogados, pois ninguém quer cuidar deles. Sem contar que temos bebês, crianças e adolescentes, todos misturados — comenta uma das servidoras, que prefere não se identificar.
Ela relata que apesar de não haver falta de doações da comunidade, a gestão da FAS estaria dificultando as condições dos trabalhadores.
— Qualquer coisa eles falam que estão abrindo processo administrativo ou sindicância. Chegaram a abrir sindicância porque descobriram que os funcionários tinham um grupo de WhatsApp. A gente vive um processo de tortura psicológica, tanto do dia a dia quanto dessa pressão da FAS — acrescenta.
A intenção da FAS em alterar a modalidade de atendimento a crianças e adolescentes abrindo três novas casas-lares — cujos editais já foram lançados — também é uma decisão questionada pela servidora:
— Ouvimos é que eles querem simplesmente fechar. Essa precarização já vinha acontecendo, mas piorou demais nesse ano e além de tudo colocaram gente sem capacitação. Abrigo é o lugar mais difícil de trabalhar, mas se dessem condições e organizassem melhor, dava para fazer um ótimo trabalho. Eles só querem cortar todo tipo de gasto. As casas lares custam de três a cinco vezes menos, mas a queda de qualidade é proporcional, qualquer pessoa pode trabalhar lá — aponta uma servidora.