Comerciantes e prestadores de serviço da Rua Jacob Luchesi, via que passa pelos bairros Santa Catarina e Santa Lúcia, em Caxias do Sul, estão assustados com a insegurança. De 52 estabelecimentos de serviço ou de comércio consultados pela reportagem, ao menos 15 sofreram ataques de ladrões neste ano, alguns mais de uma vez. Foram pelo menos 29 ações envolvendo ladrões armados, furtos ou tentativa de arrombamento, porém, com uma diferença: a parte da Jacob Luchesi inserida no Santa Catarina sofre com os arrombamentos à noite. Já os donos de estabelecimentos do Santa Lúcia relatam maior frequência de assaltos durante o dia.
A rua é importante via de ligação com a Zona Oeste da cidade: leva para a Rota do Sol (ERS-122) e à localidade de Monte Bérico, por exemplo. Concentra serviços importantes, caso da Central de Abastecimento do Rio Grande do Sul (Ceasa), além de indústrias, lojas, restaurantes e serviços diversos. Tanta variedade atrai bandidos.
No fim da tarde de segunda, uma ação que durou poucos minutos evidenciou a insegurança. Pela quinta vez no ano, o posto Capoani e a Farmácia do Círculo, que ficam lado a lado, foram assaltados.
– Virou rotina. De quatro assaltos, a gente têm certeza de que são os mesmos criminosos porque já reconhecemos a abordagem deles. Chegam de moto, não tiram o capacete e entram aqui já falando para passar o dinheiro do patrão. A gente não pode fazer nada, além de obedecer. Eu trabalho com medo diariamente – conta a atendente Chaiene Bordin, 26 anos.
A frequência dos ataques não só preocupa, como desmotiva os trabalhadores, que diariamente precisam esquecer o medo e encarar a jornada de trabalho.
– Nunca esteve tão perigoso. A gente tem medo de trabalhar, tem medo até de dormir, porque sabemos que a qualquer hora eles (os criminosos) podem aparecer por aqui. Vemos policiais passando na rua, mas nem a presença deles intimida os bandidos. O nosso bairro não é mais como antes. Não temos mais sossego – desabafa Ana Lúcia Pistore, 57, que mantém a Adega Pistore na Jacob Luchesi há quase 30 anos.
Para a farmacêutica Bruna Lizot Trentin, 25, o perigo não se restringe ao comércio. Há relatos diários de pedestres assaltados, carros furtados e residências arrombadas. Em abril, uma mulher foi baleada durante assalto na rua.
– Nos últimos 15 dias, fomos vítimas duas vezes de ladrões armados. Todos os dias sabemos de crimes que ocorreram pelo bairro, estamos reféns desses bandidos. Vir trabalhar está complicado, não sabemos o que pode acontecer. A gente teme pela nossa vida – diz Bruna, gerente da Farmácia Farbene.
Vítimas criaram grupo virtual para monitorar suspeitos
Cansados da criminalidade, comerciantes da Jacob Luchesi decidiram se unir: criaram um grupo no WhatsApp para tentar combater a ação dos criminosos. A ideia surgiu após uma sequência de arrombamentos, que prejudicou diversas lojas no trecho perto do entroncamento com a Perimetral Norte.
Chamado “Comércio Seguro”, o grupo é usado para alertar movimentações de pessoas e veículos suspeitos que passam pela rua, além de repassar informações sobre a abordagem utilizada pelos bandidos. Membros da Brigada Militar (BM) estão entre os cerca de 50 participantes.
– Ter o grupo não nos dá imunidade contra a bandidagem, mas nos fez prestar mais a atenção nos detalhes. Costumo dizer que agora estamos em estado de alerta. Se passa alguém suspeito na rua, a gente já se comunica para alertar os outros empresários. Essa é a forma de nos protegermos – explica Cláudio Hermann, 40 anos, proprietário da loja Tato Lilo Kids.
Para Handalla Bakri, 29, dono da Fórmula Jovem, os criminosos estão organizados, mas os comerciantes também.
– Aqui na loja, antes de arrombar eles vieram cortar os fios do alarme, depois retornaram para entrar. Tenho câmeras também, mas a sensação que tenho é que nada disso inibe eles. Por isso, ter essa parceria com os outros nos fortalece. Não podemos ficar parados enquanto eles (os criminosos) levam o nosso ganha pão – diz Bakri, que no último arrombamento teve um prejuízo de mais de R$ 35 mil.
Segundo o empresário Elvio Luis Gianni, 45, a criação do grupo fortaleceu a parceria com os policiais. Hoje, situações mais complicadas e perigosas são repassadas diretamente para a BM, por meio do aplicativo.
– Conseguimos criar uma parceria forte com a BM e isso tem nos ajudado. O comércio também está mais unido e em alerta – diz Gianni.
Empresários estão desmotivados
A insegurança provocada pela frequência de assaltos tem mudado as atitudes dos comerciantes. Vinícius Chilanti, 28 anos, e Adriano de Faci, 41, proprietários do Mercado Tradição, investiram em segurança particular para evitar prejuízos.
– A nossa sobrevivência é o mercado, então temos que nos proteger como podemos para seguir em frente. A gente sabe que eles não agem sozinhos. Aqui, vieram a pé. Depois, entraram num carro que já esperava por eles. Também já chegaram de moto. Tivemos que deixar de investir no mercado para pagar segurança particular – diz Chilanti.
A ideia de arrumar a fachada da loja também foi adiada pela empresária Delurdes Gianni:
– Deixar a vitrine mais bonita para quê? Logo que abrimos, o nosso produto era outro, mas mudamos devido aos assaltos. Neste ano aumentou muito a criminalidade. Todos os dias sabemos de alguém que foi vítima.
Região é monitorada diariamente pela BM
De acordo com o capitão Amilton Turra de Carvalho, a Jacob Luchesi é acompanhada de perto pela Brigada Militar, em virtude do número de comércios e do movimento que possui. As comunidades do entorno da via também integram um dos núcleos do policiamento comunitário.
– Diariamente monitoramos a região. Procuramos fazer um trabalho cuidadoso e capaz de reduzir a sensação de insegurança da comunidade. Por isso, ter um apoio dos comerciantes, nos torna mais fortes diante da criminalidade. Comparando com outras regiões, a Jacob Luchesi não é das mais perigosas. Mas é claro que vamos seguir fazendo o nosso trabalho, que é proteger o cidadão – afirma Turra.
Para o delegado Mário Mombach, da Delegacia de Roubos, Furtos, Entorpecentes e Capturas (Defrec), existe uma série de investigações sobre grupos que agem no comércio da cidade.
– Se tornou mais difícil identificar esses criminosos por área de atuação, mas as investigações seguem. O nosso papel é desarticular esses grupos e isso tem sido feito em todos os bairros de Caxias – alega Mombach.
ATAQUES NO ANO
A Rua Jacob Luchesi concentra pelo menos 100 empresas do comércio, da indústria e de serviços distribuídas em 28 quadras. A via começa no entroncamento com a Perimetral Norte, próximo à Casa de Pedra, e termina no cruzamento com a ERS-122 (Rota do Sol). Assim como em outros locais, a BM não divulga os números da violência na via. Abaixo, confira as empresas que foram alvo de algum tipo de crime desde o início do ano. Mais ações podem ter ocorrido no período, mas a reportagem não conseguiu contatar todos os responsáveis pelos empreendimentos:
Locadora Casa de Cinema - um arrombamento em fevereiro
Fórmula Jovem - um arrombamento em julho
Tato Lilo Kids - um arrombamento em junho
Dimaq - três arrombamentos neste ano
Vó Lúcia - uma tentativa de arrombamento
Gianni Center - dois arrombamentos em uma semana
Adega Pistore - um assalto em abril deste ano
Rancolor Tintas - um arrombamento em junho
Farmácia Farbene - dois assaltos em 15 dias
IBR Redutores - tentativa de arrombamento neste ano
Game Show Eventos - um assalto em julho
Posto Capoani - cinco assaltos neste ano
Farmácia do Círculo - cinco assaltos neste ano
Posto BR - dois assaltos neste ano
Mercado Tradição - dois assaltos neste ano