Em menos de duas semanas, três eventos movimentaram a área central de Caxias do Sul: a programação da Temporada da Cultura Negra, os shows do Caxias Soul Duetos e o 15º Mississippi Delta Blues Festival. Neste fim de semana será a vez do Grande Espetáculo de Natal realizar, na Rua Sinimbu, sua oitava edição. O indicativo de uma efervescência cultural no entorno da Praça Dante Alighieri não é coincidência, e vai de encontro à intenção anunciada pela prefeitura de revitalizar o centro da cidade, estimulando para isso a melhor utilização do espaço e dos prédios históricos. Ao mesmo tempo em que saúdam esta virada de chave, produtores culturais apontam, contudo, a necessidade de qualificar a infraestrutura a fim de poder oferecer eventos ainda melhores.
Envolvida com a montagem da estrutura do Grande Espetáculo de Natal, Cali Troian considera que a convivência social em espaços públicos é fundamental para construir uma cidade sustentável, e a cultura é quem melhor sabe prestar este serviço à comunidade. Quando se fala sobre o envolvimento do poder público nesta dinâmica, porém, Cali considera que é preciso avançar para além de discutir autorizações, para tratar de como melhorar questões de mobilidade e de melhor aproveitamento do espaço.
- Para o Grande Espetáculo de Natal, há dois anos nós solicitamos a retirada de um pórtico que está em frente da casa (Magnabosco), e que prejudica a montagem de estruturas temporárias. Nós temos de organizar demandas como esta para que a prefeitura possa nos atender, ajudando a reduzir a presença de placas que trazem informações duplicadas, de postes que ficam no centro da calçada, de pórtico com uma única placa de sinalização, excesso de fiação, entre outras coisas que poluem visualmente o nosso centro. É preciso qualificar estas estruturas para melhor atender a estes eventos que consequentemente atendem à comunidade _ avalia.
Responsável por produzir eventos como o Cinema de Verão, que a cada ano realiza sessões gratuitas em diversas praças do interior e da cidade, incluindo a Dante, Robinson Cabral avalia que, se não houver uma contrapartida no sentido de melhorar a estrutura para acolher eventos, falar em revitalização será mera demagogia da gestão reeleita.
- Uma das coisas mais importantes para que uma ocupação do espaço público ocorra bem deve ser a criação de estruturas que possam receber os eventos, como boas instalações elétricas e sanitárias. A ocupação dos espaços públicos também deve respeitar a característica do espaço, agindo de forma integrativa e não invasiva, ainda mais se tratando de locais que possuem bens tombados. Não adianta voltar com os desfiles de carnaval na Plácido de Castro, por exemplo, a estrutura para o público e a iluminação serem péssimas. Na maioria das praças e parques da cidade não existe um regramento específico para o uso da iluminação pública na ocupação de eventos. E, em muitos casos, sequer há um ponto de luz para tal. Sem infraestrutura mínima para receber as pessoas e os eventos, teremos apenas um discurso demagógico e nada funcional.
Buscar o exemplo nos vizinhos
Cabral sugere ainda que Caxias do Sul deveria começar a discutir a possibilidade de ter uma rua coberta, assim como as vizinhas Gramado, Bento Gonçalves e Nova Petrópolis já possuem.
- Está caindo de maduro a ideia de uma Rua Coberta na cidade. Pois não adianta cobrir apenas um palco em praças e deixar a população ao relento pegando chuva ou sol, assim como também não adianta utilizar o espaço público para um evento institucional da prefeitura, levando luzinhas e decoração, para depois deixar o resto do ano a praça às traças, como ocorre, muitas vezes no nosso interior. Para que o espaço público seja ocupado ele precisa estar em ordem no dia a dia, em respeito à população. Não adianta abrir os museus aos domingos e não existir um domingo ao mês, no mínimo, com passagem gratuita para os pobres aproveitarem a cidade - provoca.
Embora concorde que questões pontuais possam melhorar, como a ampliação da rede elétrica para possibilitar a oferta de espaços gastronômicos, playground e outras atividades de lazer em eventos como Caxias Soul Duetos, do qual é produtor, Jorge de Jesus, o DJ Mono, pontua que o produtor cultura também precisa fazer a sua parte em se adequar ao que o espaço a ser ocupado oferece, além de ser proativo em ir atrás daquilo que pode ser feito para melhorar:
- O produtor precisa ter o olhar do que precisa para que o evento seja realizado no espaço público e saber se adequar, senão ele estaria negligenciando a sua própria função. Acho que o que eu teria para cobrar é pouco diante da possibilidade que foi oferecida para realizar o meu evento no centro da cidade, com uma estrutura que considero boa.
Abertura para mais parcerias com a iniciativa privada
Entusiasta da ideia de que ocupar a praça central e prédios históricos com atividades culturais promove uma maior sensação de pertencimento das pessoas com a cidade, conectando passado, presente e futuro, a secretária municipal de Cultura, Cristina Nora Calcagnotto, considera que há questões a serem melhoradas, tanto no sentido de contribuir com quem produz os eventos, quanto em minimizar o impacto no trânsito, na limpeza pública, entre outros pontos:
_ Temos o entendimento de que, onde há uma maior movimentação populacional, isso gera uma sensação de segurança, o que se torna um grande benefício para a cidade. A gente também propõe e incentiva as pessoas a ocuparem os nossos espaços urbanos, por considerar que isso traz mais vida para a nossa cidade como um todo.
A secretaria destaca que, por vezes, a pasta é cobrada pela realização de mais eventos, como se fosse a própria secretaria uma produtora de atividades desta natureza, o que não é o caso. Por conta disso existe, também, o viés de apoiar iniciativas que venham a promover mais arte e cultura, seja no centro da cidade, na periferia ou no interior.
- A secretaria da Cultura não é uma realizadora de eventos, mas sim uma prestadora de serviço público, que tem políticas públicas voltadas à arte e à cultura para benefício da sociedade. Então, quando perguntam por que a gente não faz mais eventos na Praça Dante, ou na Praça das Feiras, a gente acha que já realiza um grande número de eventos, mas entende que precisa estar junto com a iniciativa privada neste sentido. Já existem os mecanismos de fomento que propiciam à sociedade civil realizar, por meio de verba pública, aquilo que acha que está faltando, ou que atenda as comunidades que não estão bem atendidas - analisa.