Na noite do dia 30 de julho, a pequena Valentina Zamboni Hofmeister, quatro anos, moradora do bairro Cinquentenário, em Caxias, esperava ansiosa pela chegada do caminhão da Companhia de Desenvolvimento de Caxias do Sul (Codeca) na rua da sua casa. Ela queria presentear seu amigo, o gari Gerson Nery, que passa duas noites por semana por lá para recolher o lixo.
Do caminhão, Gerson viu que Valentina esperava por ele com um papel em mãos. Era um desenho. Ela já tinha avisado, na segunda-feira da mesma semana, que tinha uma surpresa para ele. Gerson conta que a amizade entre os dois já é antiga e que, faça chuva ou sol, Valentina espera pelos garis na janela de casa para dar, pelo menos, um oi.
— Eu a conheço desde que era bem pequeninha, porque faz tempo que estou naquele setor. Ela sempre sai na área ou na porta. No inverno, quando está chovendo ou faz muito frio, ela vem na janela e dá tchau. Foi assim que começou a nossa amizade e a nossa interação — conta.
Araceli Zamboni, mãe da Valentina, conta que a amizade com os garis começou desde que a menina era bem pequena. Ela e um vizinho abanam, diariamente, para os trabalhadores da Codeca. Araceli conta que ensinou a filha a agradecer pelo trabalho dos garis, que "levavam as fraldas dela para o lixo".
Valentina quis presentear o amigo Gerson com um dos muitos desenhos que faz. A mãe conta que, naquela noite, ela escolheu um dos desenhos que guarda numa pasta.
— Ela sempre me perguntava 'Mamãe, ele pode vir aqui em casa?' e sempre abanava. Todos eles são sempre muito queridos. Se passa o caminhão e ela não está ali na frente ela sai correndo pra dar oi.
— É muito legal essa amizade que a gente tem com as crianças. A gente se sente muito bem. É como se fosse um combustível. O serviço é pesado, difícil e, por muitas vezes, a gente não tem o reconhecimento de uma parte da população. As crianças têm verdadeira paixão pela gente — conta Gerson.
A relação das crianças com os funcionários da Codeca é de admiração, conforme Gerson. Ele trabalha na companhia há 19 anos e já foi até convidado para ser padrinho de um menino que admira o trabalho dos garis. No entanto, essa valorização vai além do carinho. Segundo Gerson, apesar de ser um trabalho pesado, é possível torná-lo mais leve com a conscientização da comunidade sobre separação, embalagens adequadas e armazenamento correto do lixo nos contêineres.
— Conscientizando as crianças, elas vão dando uns toques aos adultos. Eu vejo que os adultos falham, principalmente, no acondicionamento do lixo, na separação, nas embalagens. Se quebrou um copo, colocar dentro de uma garrafa pet ou de uma caixinha de leite, deixar um recado que ali tem vidro — exemplifica.
Gerson ainda ensina que é importante não pendurar lixo em postes porque, em dias de chuva, existe o risco de choque elétrico.
Garis também já presentearam os pequenos
A gari Scheila Ramos, que trabalha há 16 anos na Codeca, conta que já recebeu o carinho e admiração dos pequenos e que, também, já presenteou o pequeno Pietro de Oliveira da Silva, três, com uma miniatura do uniforme da Codeca. Ela conta que o menino gostou tanto do presente que não queria mais tirar. A equipe passa pela casa do pequeno aos sábados e Scheila conta que é comum a família se reunir no pátio para aproveitar o dia. Pelo entusiasmo de Pietro, decidiu o presentear.
— Eu pedi o que ele gosta e a família contou que era do caminhão e de nós, garis, porque gosta da nossa roupa também. Aí, mandei fazer a roupinha para ele. É gratificante — conta Scheila.
E Pietro não é o único amigo que ela fez nesse tempo de trabalho com a coleta de lixo. Scheila conta que a valorização das crianças é um incentivo no dia a dia.
— Tinha um menininho no Vila Ipê que ama o caminhão. A gente conseguiu um modelo parecido com os nossos para dar de presente, mas foi difícil. O que a gente pode fazer, a gente faz... Para, conversa, buzina, eles gostam muito de escutar a buzina do caminhão — diz.
Para os adultos, Scheila também deixa o recado: a separação correta do lixo é essencial. Além disso, ela relembra que a Codeca conta com o EcoPonto, um local para descarte de lixo eletrônico e móveis antigos, além do setor de Educação Ambiental, que faz palestras em escolas do município para conscientizar sobre o descarte correto de lixo.
— Temos o contato direto com o lixo, então seria bom as pessoas terem mais consciência e respeito pela gente. Saber que estamos recolhendo e tem gente lá dentro de uma reciclagem que vai selecionar esse lixo. Se tivesse uma conscientização, seria melhor.