Uma turma de estudantes do curso de Medicina da Universidade de Caxias do Sul (UCS) abriu, nesta terça-feira (31), uma reclamação administrativa no Procon do município contra a empresa Brave Brasil, investigada por aplicar golpes em estudantes de diferentes regiões do país. A intenção é rescindir o contrato em que a Brave é responsável pela formatura dos alunos. Em notificação encaminhada à empresa na última quinta-feira (27), os estudantes solicitaram o congelamento das parcelas que estão prestes a vencer, mas não tiveram retorno dos responsáveis.
A mobilização teve início no sábado, 21 de janeiro, após a repercussão do caso da formatura de mais de 100 alunos, também de Medicina, que ficaram sem o baile. Em reportagem exibida pelo Fantástico no último domingo, os formandos, que são de Maringá, no Paraná, afirmam que sofreram um golpe de cerca de R$ 3 milhões por parte da Brave. A Polícia Civil está investigando.
A formatura dos alunos da UCS, que gira entre R$ 500 mil e R$ 1 milhão - a depender de jantar e convites - teve contrato fechado em meados de 2022. Entre os serviços oferecidos para a celebração, estava a realização da festa Meio Médico, que ocorreu ano passado. O evento que arrecadava lucros para a formatura, tinha um caixa à parte que também era administrado pela Brave.
Antes de contratar a empresa, a comissão dos 54 alunos buscou diferentes opções e, após avaliar pelo CNPJ, não encontrou qualquer irregularidade com a empresa de Florianópolis (SC), que atua há cerca de 15 anos e se auto denomina "especializada em formaturas de Medicina".
Conforme informou o Procon à reportagem, após o recebimento da reclamação, a Brave Brasil terá o prazo de 10 dias para se manifestar. Caso o órgão não receba uma resposta convincente referente à solicitação dos estudantes, o procedimento seguinte será recorrer à Justiça para dar continuidade e verificar a possibilidade de aplicação de multa.
Contato perdido após repercussão negativa
Desde que o assunto veio à tona, representantes da empresa deixaram de se comunicar com os estudantes da UCS. O contato era feito por meio de grupos no WhatsApp.
— Não estão mais dando retorno em nenhum dos contatos que a gente tinha. Agora, quando eles mandam mensagem é pra dizer que estão se desligando da empresa. A gente tem uma lista enorme das pessoas que já se desligaram da empresa desde a repercussão da formatura em Maringá — revela a estudante Viviane Lamberty.
Ainda conforme a aluna, os profissionais, quando respondem, enviam a mesma mensagem aos estudantes para informar sobre os desligamentos. Confira a íntegra:
“Prezados (as) Formandos (as), a partir de hoje retorno minhas atividades profissionais e venho por meio desta informar que não faço mais parte da família BRAVE BRASIL. Agradeço demais a parceria até aqui e tendo em vista o carinho e a importância da sua turma para a Brave, informo que o Presidente Rafael Brogni, em pessoa, ficará responsável por interceder por vocês a partir de agora. Desejo a todos vocês muito sucesso e um ano de 2023 repleto de bençãos. P.S - Favor não disponibilizar o contato dele para outras comissões ou demais formandos, haja vista que a equipe estará à disposição para eventuais esclarecimentos de dúvidas”.
Procedimento legais
Segundo a jovem, que faz parte da comissão de formatura, o pai de outra aluna, que é advogado, está prestando auxílio sobre as informações e procedimentos legais nesse caso. O profissional Eduardo Bridi informou que será difícil recuperar o valor já pago, estimado em 30% do custo total.
— Se a empresa não conseguir dar continuidade aos eventos, por causa dessa repercussão negativa e porque estudantes de todas as partes do país estão congelando os pagamentos, ela pode fechar. Essa é a apreensão de todos os pais, porque nesse caso é provável que o valor não seja recuperado. Nos reunimos no Procon, pais e alunos, para dar seguimento à esse caso. Muitos alunos não têm mais dinheiro para pagar porque optaram pelo pagamento à vista, que tinha desconto — conta Bridi.
Ainda conforme o profissional, a orientação que receberam do Procon é de que cada estudante dê andamento à reclamação administrativa de forma individual. A preocupação de pais e estudantes está, além do valor já pago, na multa de 20% estipulada no contrato, no caso do cancelamento.
— Nós temos parcelas para pagar até 2025, que é o ano da nossa formatura, e o contrato diz que a gente vai ter que pagar uma multa se rescindir, por isso estamos tentando de todas as formas congelar esses pagamentos. Tiveram pessoas que pagaram à vista, entre R$ 12 e R$ 15 mil. Eu já paguei R$ 4 mil, então são quantias altas, nós estamos muito preocupados — afirma Viviane.
A intensão no contato feito com o Procon é resolver a situação de forma amigável. Na notificação enviada na última semana pelos alunos à empresa, foi solicitada uma explicação em 24 horas, que, conforme Bridi, não foi respondida.
— Com a notificação, os pagamentos podem ser congelados, mas o ideal, no caso da situação não ser resolvida pelo Procon, será cada estudante contratar um advogado para entrar com a ação judicial porque os contratos estão em vigor. Os alunos que negociaram com cartão de crédito estão tendo problemas. Abrimos essa reclamação administrativa para buscar um entendimento com a empresa antes de dar início à essa ação na Justiça — explica o advogado.
Estudantes do Rio de Janeiro alegam calote de R$ 1,3 milhão
Uma turma de Medicina da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), que também tinha contratado a Brave Brasil, alega ter sofrido calote de R$ 1,3 milhão. A formatura dos estudantes foi realizada neste final de semana, mas por outra empresa que fez a celebração a preço de custo.
Após a situação dos estudantes de Maringá, os formandos do Rio entraram em contato com representantes dos serviços que seriam prestados e foram informados - na semana da formatura - de que os pagamentos pelos serviços não haviam sido feitos.
Um representante da Brave Brasil teria informado aos estudantes que, por força de medida cautelar imposta pela Justiça do Paraná, os bens da empresa foram bloqueados por alguns dias e não teria como desembolsar os valores para pagar pelos serviços.
O que diz o advogado da Brave Brasil
Em entrevista concedida à reportagem, o advogado do presidente Rafael Brogni e da Brave Brasil, Ricardo Medeiros, afirmou que após a repercussão do caso de Maringá, os canais de atendimento da empresa ficaram congestionados, por isso os estudantes não tiveram mais resposta.
Conforme explica o profissional, a "intensão da Brave é dar atenção e retorno a todos". Os estudantes que optarem por acionar advogados, serão atendidos com reuniões online, visando esclarecimento do andamento dos contratos. A prioridade legal da empresa no momento está em resolver e realizar formaturas previstas para acontecer neste início de 2023.
— Estamos marcando reuniões com advogados do Brasil inteiro. A empresa vai entrar em contato com todos eles, sem exceção. Facilita no caso dos que acionam advogados porque nós conseguimos marcar reuniões para explicar a situação — afirma Ricardo.
Questionado sobre a preocupação dos pais dos estudantes com a possibilidade de fechamento da empresa, o advogado diz que "os envolvidos estão unindo todos os esforços para equacionar a questão" e explica que os bens da empresa terem sido bloqueados pela Justiça do Paraná, acabou prejudicando a realização da formatura no Rio de Janeiro.
Ricardo menciona ainda que "houveram bloqueios em outras contas da Brave, em outros processos", mas que todos os envolvidos estão "trabalhando para buscar desbloquear e colocar a empresa, entre as próximas semanas ou no próximo mês, novamente nos trilhos para que ela volte a operar como sempre tem feito".
Os bens da empresa, que haviam sido bloqueados, foram desbloqueados na última semana.