Febre entre crianças e adultos, o álbum da Copa do Catar, assim como os de Copas passadas, chegou nas bancas antes do técnico Tite divulgar sua lista de convocados. Faltando dias para que o evento iniciasse não era incomum que muitos encartes já tivessem sido completados por seus colecionadores. Para além da ansiedade de ver o álbum preenchido com o rosto dos principais jogadores do planeta, a prática estimulou, nos mais jovens, hábitos de gerações passadas. Ainda hoje, grupos se encontram para trocas de figurinhas e nos intervalos e saídas das escolas a brincadeira de "bater bafo" caiu no gosto da criançada.
No entanto, para fazer parte da onda do momento é preciso investir. O álbum desse ano tem espaço para 670 figurinhas, e para completá-lo é preciso que sejam adquiridos no mínimo 134 pacotinhos, em um investimento de R$ 534. A conta ainda não leva em consideração o custo do álbum, de R$ 12, e o fato de que entre as centenas de pacotinhos comprados, uma boa porcentagem será de figurinhas repetidas.
Em Bom Jesus, nos Campos de Cima da Serra, uma professora da Escola Municipal de Ensino Fundamental Irmãs Ramos viu de perto o interesse pela brincadeira ficar apenas no campo da vontade entre a maioria dos seus alunos. Na turma comandada por Kétlin Ramos Camargo, dos 19 estudantes de sete a oito anos, apenas três tinham o álbum e compartilhavam entre si o desafio de acumular as figurinhas. Também por isso, as trocas foram proibidas em sala de aula e permitidas apenas no recreio.
A cada retorno do intervalo os lamentos se acumulavam entre àqueles que não tinham as figurinhas para bater ou trocar. Mas, depois de uma semana de trabalho, fotos posadas em frente à um fundo amarelo, apoio da direção e muitas folhas de ofício, a profe Kétlin surpreendeu os alunos com a confecção do álbum próprio da turma. Nas páginas, lugares reservados não para craques milionários, mas para retratos singelos de cada um dos 19 colegas do segundo ano.
— Eu queria uma maneira de mostrar para eles como era o álbum, para eles terem noção de como é trocar e colar as figurinhas. Eu não tinha condições de comprar um álbum para cada um, então fiz do nosso jeito e coloquei as figurinhas nos pacotinhos para eles terem. Inclusive, a surpresa de ver o que vêm dentro — explicou Kétlin.
Com a ajuda de um software gratuito de edição de imagens, as fotos dos alunos foram impressas em folhas A4 e recortadas com seus nomes, a bandeira brasileira e a taça símbolo do Mundial do Catar. Diferente das mais de 600 figurinhas necessárias para que o álbum oficial seja completo, o projeto da Escola Irmãs Ramos conta com 19 espaços para aqueles que passaram a ser chamados "craques da turma".
— Eles vivenciaram exatamente como se fosse o álbum da Copa, ela se preocupou até em fazer o pacotinho e colocar figurinhas a mais para que as crianças pudessem brincar de bater bafo — contou a diretora Amanda Soares de Castilhos Cunha.
Para Amanda, a ideia posta em prática trouxe auto-estima para os alunos que sentiram a grandeza de figurarem em um álbum.
—Eles sabem que quem está ali é quem está representando o seu país, então eles se sentiram importantes. E além disso, de terem os colegas como protagonistas e poderem levar para casa uma recordação da turma — disse.
O álbum de figurinhas do segundo ano ganhou o interesse de outras turmas da escola, que já desenvolvem seus próprios encartes. Desde a primeira partida do Brasil na Copa, os 450 alunos atendidos pela escola do bairro Santa Catarina se reúnem, junto com os craques da profe Kétlin, para torcer pela Seleção.