Dados de 2020 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que 23% dos estudantes já foram vítimas de bullying na escola. Destes, a motivação foi dividida entre corpo (16,5%), rosto (11,6%) e etnia (4,6%). Por conta disso, a Coordenadoria da Juventude de Caxias do Sul lançou, nesta semana, a cartilha Conhecendo para deter: Bullying e Cyberbullying. O informativo tem como objetivo alertar e discutir sobre esta forma de violência, que infelizmente vem crescendo de forma alarmante no Brasil.
Abordando a fundo a temática do bullying em suas diversas variações, a cartilha foi definida como fundamental pela doutora em Direito e especialista em bullying e cyberbullying, Gabriela Amato, que palestrou para jovens no dia do lançamento do informativo.
— A importância dessa cartilha é fundamental, especialmente porque ela vai ser veiculada nas escolas, que são o melhor local de prevenção contra o bullying e cyberbullying. Esse trabalho da Coordenadoria da Juventude de elaborar a cartilha é de extrema importância e relevância, porque é a partir da abordagem desses assuntos que a gente trabalha a prevenção — disse.
A especialista lembrou também que, segundo a pesquisa Global Web Index de 2020, o Brasil é o segundo país que mais pratica cyberbullying. Por isso, de acordo com ela, é preciso trabalhar e naturalizar para as crianças e adolescentes a questão das diferenças, pois é essa a principal motivadora da violência.
— As questões físicas, de etnia, raça e cor fazem com que eles, por não entenderem essa naturalização sobre aquilo que é diferente, acabem praticando mais bullying e cyberbullying. Então, para além da prevenção direta, eu diria que é de extrema relevância a gente começar a naturalizar as diferenças para que eles entendam que ser diferente é o que nos torna únicos — relatou.
É importante destacar que a cartilha foi desenvolvida com layout estrategicamente pensado para chamar a atenção de crianças e adolescentes, sendo de fácil identificação, principalmente por conter ilustrações temáticas e um texto acessível, o que facilita a compreensão do conteúdo.
— A ideia surgiu partindo de demandas recorrentes da Smed (Secretaria Municipal da Educação) e também pelas noticias que chegavam até nós de casos de bullying e cyberbullying. A gente já tinha uma preocupação também com a saúde mental dos jovens, porque esses casos vão além do ato de violência. Eles acarretam muitas outras consequências, como ideação suicida, suicídio, automutilação, etc. Foi pensando nisso que elaboramos esse material — destacou o titular da Coordenadoria da Juventude, Morvan da Costa e Silva.
A cartilha
A cartilha foi dividida em 16 páginas que abordam explicações como o que é bullying; tipos de bullying; o que é cyberbullying; tipos e características da violência online; diferenças entre brincadeira e bullying; Lei 13.185/2015, que garante a dignidade do ser humano e o seu pleno desenvolvimento; e formas de denúncia.
O que é Bullying?
É a violência sistemática, física ou psicológica, consubstanciada em atos de intimidação, humilhação ou discriminação e, ainda, ataques físicos, insultos pessoais, comentários sistemáticos e apelidos pejorativos, ameaças por quaisquer meios, grafites depreciativos, expressões preconceituosas, isolamento social consciente e premeditado e pilhérias.
Quais são os tipos de bullying?
- Verbal: quando há insulto, xingamento, apelidos pejorativos;
- Moral: quando o agressor difama, espalha boatos, acusa de crimes não praticados;
- Sexual: quando ocorre assédio, indução ou abusos;
- Social: quando o agressor ignora, isola ou exclui a vítima;
- Psicológico: quando há ameaças, perseguição, intimidação, chantagens;
- Físico: quando há atos de violência física;
- Material: quando os pertences da vítima são furtados, roubados, destruídos;
- Virtual: a partir da reverberação de conteúdos digitais que visam causar danos à vítima.
O que é cyberbullying?
É a versão eletrônica do bullying, praticada por meio de agressões verbais e escritas na internet.
Tipos e Características da Violência online
- Disseminação não consentida de imagens íntimas: humilhar, expor, constranger alguém por divulgação de imagens íntimas. Por vezes, mencionada como cybervingança ou pornografia de vingança;
- Discurso violento: constranger ou diminuir, fazendo uso de discurso agressivo;
- Vigilância eletrônica: ocorre quando o agressor vigia as ações ou monitora suas conversas em meio eletrônico ou plataformas digitais;
- Sextorsão ou sexting: vazar ou usar imagens íntimas para chantagear ou extorquir a vítima;
- Cyberbullying: ofender e agredir alguém em ambientes digitais. Fazer montagens ou criar “memes”, com intuito de humilhar, ridicularizar, expor, constranger;
- Perfil falso: é também conhecido como perfil fake ou impersonation. Diz respeito a situações nas quais alguém usa uma identidade falsa e comete atos que prejudicam a vítima ou que resultam em ganhos pessoais para o falsificado;
- Perseguição: utilizar a internet ou outro meio digital (como mensagens no celular) para perseguir, assediar ou ameaçar, causando medo. A perseguição ou monitoramento também pode acontecer por meio das redes sociais de amigos, parentes, filhos e conhecidos da vítima;
- Censura ou controle: impedir que o indivíduo tenha acesso aos meios digitais (deletar perfil, trocar senhas das redes sociais, etc.). Silenciamento por meio de intimidação e ameaça (denunciar fotos e postagens).
Quem é quem?
- Agressor: também conhecido por bully, é quem pratica a violência. Pode ser apenas uma pessoa, uma dupla, um grupo ou uma coletividade indefinida;
- Vítima: é quem sofre a violência, muitas vezes calada, o que dificulta sua identificação;
- Testemunha: é quem presencia ou fica sabendo da violência. Há casos, porém, nos quais ela não existe, pois o bullying ocorre somente entre a vítima e o agressor, sem a presença ou conhecimento de terceiros. É a chamada violência silenciosa.
Brincadeira X Bullying
Às vezes, o bullying e o cyberbullying parecem brincadeiras, mas não podemos nos deixar enganar. Não há uma fórmula para identificar esse tipo de violência. É preciso bom senso, consciência sobre a real intenção, noção de limites da liberdade de expressão e pensar antes de agir se a agressão fosse contra você.
A diferença está no tratamento e na balança de poder. No bullying, somente o agressor está se divertindo, enquanto que na brincadeira ambas as partes saem felizes no final da ação. O bullying machuca e deixa cicatrizes emocionais nas pessoas.
A Lei 13.185/2015
Trata-se de uma lei que garante a dignidade do ser humano e o seu pleno desenvolvimento, na medida em que tutela sua integridade física e psíquica. Ela busca não apenas atribuir responsabilidades, mas principalmente afirmar a necessidade de conscientização e respeito com o outro. Tem como objetivo prevenir e combater tal prática mediante a colaboração de toda a sociedade, por meio de campanhas de conscientização, capacitação de docentes, orientação das famílias para identificar o problema, assistência psicológica, social e jurídica, bem como disseminar uma cultura de paz, respeito e tolerância.
Onde denunciar?
- Disque 100: Disque Direitos Humanos (canal de denúncias sobre violações de direitos humanos)
- Plataformas on-line para denúncia: Nethics
- Se a violência sistemática for na internet, como um todo: Safernet
- Secretaria de Direitos Humanos: Disque 100
- Se a violência sistemática for no Facebook: facebook.com/safety/bullying
- Aplicativo Proteja Brasil
Como identificar o bullying?
De acordo com Gabriela Amato, uma das principais formas de identificar que os filhos estão sofrendo bullying e cyberbullying é a questão do isolamento. Ela alegou que esses casos sempre começam com uma falta de interesse em ir para a escola. O outro ponto é contar com o apoio da escola, pois é ela que está à frente dessas relações sociais.
— Normalmente é a escola que vai chamar a atenção da família para buscar entender e ampara a vítima, mas não só ela. É importante a gente pensar também em amparar aquele que está agredindo, porque manifestação de agressividade nessa fase de desenvolvimento da vida certamente tem a ver com alguma questão mais profunda daquela criança ou adolescente — revelou.
A importância do apoio familiar
Bullying e cyberbullying são problemas extremamente graves da sociedade contemporânea. Segundo Gabriela, esse já era um problema muito grande antes da pandemia, mas depois dela os relatos de agressividade no retorno da convivência social entre crianças e adolescentes aumentaram significativamente. Por isso, é muito importante os pais terem um diálogo franco, direto e aberto com seus filhos, pois isso facilita que a criança ou adolescente procure por eles quando estiver sendo vítima de bullying ou cyberbullying.
— Muitas vezes as crianças não buscam a ajuda da família justamente por medo de receber algum tipo de punição. Por isso, ter esse canal aberto é uma das melhores alternativas para que os pais sejam procurados pelas crianças quando elas estiverem no foco dessa situação — finalizou Gabriela.
* Com supervisão de Daniel Angeli