Um mosquito milimétrico, de picada bastante dolorida, voltou a ser presença incômoda e fora de época no interior da Serra gaúcha. O borrachudo, como é popularmente conhecido, se desenvolve em águas correntes e tem sua presença notada basicamente no verão, em épocas de colheita. Mas, agora, uma soma de fatores criou o ambiente ideal para o crescimento dos mosquitos adultos.
Adaptado ao ecossistema, o inseto tem seu ciclo de nascimento todo na água e, em épocas de frio, entra em estado de letargia, à espera do calor para eclodir da polpa e se tornar um mosquito adulto, que parte pelos ares em busca de alimento. A solução para a ocorrência do borrachudo é a aplicação de um larvicida em arroios, córregos e vertentes, e que controla a infestação. Mas, segundo a Vigilância Ambiental de Caxias do Sul, a aplicação do BTI, como é chamado, atrasou devido ao excesso de chuvas dos últimos meses.
— Maio e junho foram muito chuvosos, não se conseguiu trabalhar com o controle do mosquito nos arroios, porque a vazão estava muito cheia e a água muito barrenta. Agora esquentou e nasceram muitos em pouco tempo — explica o diretor-técnico da Vigilância Ambiental, Rogério Poletto.
Sem o larvicida agindo nas águas correntes e com o aumento da temperatura, as larvas se tornaram polpas, que eclodiram em uma infestação de mosquitos que invadiram as propriedades rurais, para o desespero dos seus moradores, como Mirian Nicoletto, 42 anos.
—Acontece todos os anos e cada vez mais. A contar da data da última aplicação, três meses depois já ocorre uma alta infestação, então já deveria ter um cronograma pronto —desabafa a agricultora da Capela de Todos os Santos, no interior de Farroupilha.
De acordo com a secretaria de Saúde de Farroupilha, responsável por distribuir o larvicida para líderes espalhados em 47 comunidades do interior, a próxima aplicação está programada para o dia 30 de julho, caso o clima permita. Segundo o agente de endemias, Márcio do Amaral, 44, o manejo do controle biológico deve ser feito com cautela, para que a larva não crie resistência ao produto ingerido.
— Temos que incentivar a preservação da mata ciliar. Por mais que seja um biolarvicida, não se pode abusar. Imagina se a larva se acostuma e não combata mais, aí vamos estar perdidos — alerta Amaral.
O retorno do frio nesta terça-feira (12) pode dar um alento aos agricultores e moradores do interior, que torcem para que o ciclo do mosquito seja interrompido, como prevê Poletto:
— O mosquito adulto vai acabar morrendo e as outras fases que ocorrem na água podem voltar a estar em letargia.
Ao menos é essa a esperança do agricultor Márcio Nicoletto, 44, que enfrenta o desafio de trabalhar ao ar livre sem ser picado pelo borrachudo. Nesta segunda-feira (11), antes da chuva que resfriou as temperaturas na região, a presença do mosquito se multiplicou.
— Parecia que vinham de bando, era quase impossível trabalhar, porque a picada é muito dolorida. E, sim, nos anos 1990, quando começou a aplicação do BTI, a incidência era maior no verão. Hoje parece que teve uma adaptação do borrachudo, que está presente o ano inteiro — contou.
Além do controle biológico, através do larvicida, a manutenção da mata ciliar, no entorno dos arroios, é incentivada pelas autoridades de saúde e meio ambiente. É através das árvores entre as águas e as propriedades que uma espécie de escudo é formada e evita a presença do mosquito em áreas de cultivo ou manejo de animais. Nessas áreas há mais animais silvestres, como pássaros, e o mosquito não precisa se dispersar tanto para se alimentar. Além disso, outros animais que se alimentam de insetos podem controlar a população do borrachudo.