O acidente que vitimou a secretária de Educação de Gravataí, Sonia Oliveira, e o marido dela, Ricardo Abreu, em Gramado, acendeu um alerta para a necessidade e a importância da segurança nas instalações de sistemas que utilizam gás para cozinha ou aquecimento. Essa é uma preocupação não apenas em veículos, como no caso do casal, mas nas casas também.
O empresário Edelvã Roni Pasa é sócio da Neway Motorhomes, que atua há 12 anos com a fabricação desse tipo de veículo, em Novo Hamburgo. Ele analisou a situação com base nas informações disponibilizadas pela polícia e explica que o aquecedor de água estava funcionando, tentando acender. Com isso, houve queima de oxigênio, deixando apenas monóxido de carbono no ar, o que provocou a asfixia nas vítimas. Esse fato ocorre no equipamento quando uma torneira está aberta na opção de água quente ou quando há vazamento em uma mangueira, por exemplo. De acordo com Pasa, a marca do aparelho usado é confiável, o que pode indicar problema na instalação. A Polícia Civil já havia apurado que a adequação do veículo ocorreu de forma artesanal.
— O risco está aí. Os cuidados que são tomados na indústria é ter profissionais como engenheiros mecânicos, elétricos, eletrônicos, segurança no trabalho e arquiteto. Quando projetamos um motor home tem que levar em consideração várias coisas, porque é uma casa em movimento. Tem que ter ventilação, iluminação... Tudo isso ajuda tanto para arejar quem está dentro da casa quanto para evitar de um equipamento vir a causar esse tipo de incidente — explana o empresário.
Ele comenta que um dos cuidados é ter coolers nos ambientes em que ficam o botijão de gás e o aquecedor para a circulação de oxigênio dentro dos compartimentos. Além disso, existem sensores que detectam tanto o monóxido de carbono quanto butano e propano do gás de cozinha. Outro cuidado é com o tipo de material e a resistência da mangueira utilizada.
Algumas precauções que a pessoa que pretende ter um motor home deve tomar é procurar uma empresa homologada pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), cadastrada no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea) e que tenha Certificado de Adequação ao Trânsito (CAT) expedido pelo Departamento Nacional do Trânsito (Denatran).
— O Inmetro não cobra se tem um sensor de vazamento de gás. Esse tipo de perícia é algo que está muito mais na consciência de quem está fabricando. Pelo fato de o consumidor ser leigo, ele não se dá conta disso — comenta o empresário.
Vazamento de gás também é preocupação
O uso de gás preocupa também, principalmente, na Serra, onde o Gás Liquefeito de Petróleo (GLP), popularmente conhecido como gás de cozinha, para além de cozinhar, é usado para aquecimento e sistema de calefação. Por isso, bombeiros alertam para os riscos e para a necessidade de procurar profissionais especializados nesse tipo de instalação.
— Por ser um gás de grande inflamabilidade e também, em caso de vazamento, ser um asfixiante, ele requer cuidados. E nossa população, desde sempre, é muito relapsa com as questões preventivas, principalmente com a manutenção dos sistemas, como mangueiras e registros. Cuidados básicos que evitam incidentes e até acidentes maiores — observa o tenente-coronel Julimar Fortes, comandante do 5º Batalhão de Bombeiro Militar (5º BBM), com sede em Caxias do Sul.
O bombeiro explica que, por ser mais denso do que o ar, o gás se acumula e inunda o ambiente. O gás também tem a propriedade de expandir 300 vezes de volume. Por isso, quando queima, isso ocorre na sua totalidade e costuma-se dizer que houve uma explosão.
— São questões que podem ser evitadas com ações preventivas, como trocar uma mangueira vencida, verificar registros e fazer testes para perceber possíveis vazamentos, que podem evitar problemas maiores — reforçou o comandante.
No caso de veículos adaptados, os profissionais alertam para a importância de procurar uma empresa regularizada nesse tipo de instalação.
— O motor home já é um veículo adaptado. Ou seja, ele é remodelado para aquele fim. Quando se compra o veículo, adquire o produto como um todo. Por isso, é importante saber quem fez a adaptação e, se for usado, revisar essas estruturas, porque envolve GLP, instalações elétricas, às vezes realinhamento de tanque de combustível, uma série de gases e líquidos inflamáveis num engenho mecânico que foi feito para ser uma casa móvel — pondera o coronel.
O major Lúcio Junes Lemes da Silva, chefe da Seção de Segurança Contra Incêndios do 5º BBM, explica que os principais riscos relacionados ao GLP são os decorrentes de vazamento, que podem causar explosões ou asfixia. A explosão ocorre porque, diferente da chama de um fogão, onde a queima é controlada, o gás acumula no ambiente, se soma ao oxigênio do ar e é exposto a algum tipo de ignição, como um acionamento de interruptor de luz, por exemplo. Foi o que aconteceu no apartamento de um prédio no centro de Farroupilha, em 24 de dezembro de 2018, que deixou uma pessoa gravemente ferida e outras 13 vítimas de inalação da fumaça do incêndio que houve na sequência.
A asfixia por inalação de gás de cozinha, via de regra, ocorre quando há vazamento em ambiente não ventilado e a pessoa submetida aquele local inspira grande quantidade de gás. Isso, em geral, acontece quando a pessoa está dormindo. Ou seja, não está consciente para perceber o "cheiro do gás". Aliás, esse odor é o principal alerta para vazamentos.
Os vazamentos mais comuns e recorrentes, conforme os bombeiros, são na conexão entre a mangueira e o botijão, mangueiras em mau estado de conservação ou ressecadas mas, também, em válvulas e na tubulação de gás central.
— Por isso, todo o cuidado com as instalações. O principal sinal de alerta e, aí, já é uma medida reativa, é quando se sente o cheiro no ambiente, indício de vazamento. Além de acionar o corpo de bombeiros, pelo 193, concomitante a isso, a medida mais adequada é a ventilação do ambiente por meio da abertura de portas e janelas, evitar acender luzes ou qualquer outro tipo de fonte de ignição e sair do local até a chegada dos bombeiros — orienta o major Lúcio.
As mesmas dicas valem para quem utiliza o GLP para sistema de aquecimento ou calefação.
— O mais importante é que quem for fazer a instalação seja capacitado para adotar todos os critérios técnicos que as normas estabelecem. Há empresas especializadas, justamente para se responsabilizarem e bem instalarem esses sistemas — pondera o profissional.
O alerta para procura de um serviço capacitado vale também para adaptação de veículos para funcionar como espécies de motor home.
— A principal dica é fazer essas instalações com empresas ou profissionais técnicos certificados, sob pena de colocar em risco a própria integridade e de outras pessoas — indica o major.
A morte da secretária e do marido dela ainda está em investigação pela polícia. Eles foram encontrados sem vida, na última terça-feira, dentro do furgão que usavam como motor home e no qual acampavam em Gramado no final de semana.
Você sabia?
:: O gás liquefeito de petróleo é formado pela combinação de butano e propano, dois gases derivados do petróleo. A sua principal característica é o estado líquido, quando submetido a um certo grau de pressão, e o retorno ao estado gasoso, quando submetido a uma temperatura de cerca de 70°C.
:: Ao contrário do que se pensa, o GLP não tem cheiro. Um composto a base de enxofre (mercaptana) é adicionado ao gás para gerar o odor que se tornou característico como sendo do gás de cozinha, para revelar a sua presença caso haja vazamento.