Passar pelas ruas do bairro Belo Horizonte, na Zona Norte de Caxias do Sul, é um convite para, de tempos em tempos, ouvir um carro de som passando com mensagens do tipo: "Atenção, povo querido! Recado importante da Fundação Marcopolo e da escola Tancredo Neves: na quinta-feira, estaremos na escola fazendo a entrega dos estudos monitorados. É isso mesmo! Das 8h30min às 17h sem fechar ao meio-dia". O áudio (confira abaixo) conta ainda com trilhas de músicas animadas para alertar os jovens estudantes de uma comunidade em que 60% dos cerca de 900 alunos da Escola Municipal de Ensino Fundamental Tancredo Neves não possuem acesso adequado à internet para acompanhamento de aulas virtuais. Mais de 77 mil cópias foram feitas entre fevereiro e abril para entregar as atividades impressas aos alunos. O responsável pela iniciativa é o professor Vagner Peruzzo, 34 anos.
— Precisávamos pensar em estratégias para dizer a eles quando era a data de vir buscar esses estudos. O Facebook é uma ferramenta, o WhatsApp também, mas nós temos 20% dos alunos que não têm acesso a essas redes, mas que moram onde o carro de som chega. Eu imaginei: vamos colocar um alto falante e então surgiu o carro de som — conta.
A iniciativa é viável porque Peruzzo buscou apoio da Fundação Marcopolo, que auxilia com a ação iniciada em 2020. Como tem dado resultado, o carro de som também segue em operação neste ano. Questionado sobre o que o motiva a inovar de forma criativa, Peruzzo afirma:
— É acreditar no ser humano, é acreditar que a Educação é uma das únicas ferramentas para transformação social. Quando pensamos nisso no território destes bairros, a gente precisa acreditar que é possível, que dá para ter uma escola melhor, uma rua melhor, uma cidade melhor. Esse melhor inicia sempre pelo processo educativo — diz.
Peruzzo atua na escola Tancredo de Almeida Neves há oito anos, sendo que em 2021 ele completa quatro na função de diretor. O educador é licenciado em Educação Física e Pedagogia pela Universidade de Caxias do Sul (UCS), além de mestre e doutor na área da Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Ele lembra bem quando, em uma reunião de pais em 2018, apenas 36 responsáveis compareceram. No ano seguinte, no entanto, o ano letivo começou com mais de 600 pais presentes.
— Foi realizado um trabalho para que eles entendessem o quanto são importantes e que a escola é deles. Em 2019 tive que colocar estrutura de som para dar conta de falar para a quantidade de pais presentes. Então, acredito que temos que focar no melhor das pessoas. Nós precisamos olhar para os "atores" do local para que eles se sintam pertencentes. Eu me apaixonei por essa comunidade — relata.
No mesmo ano em que a reunião de pais lotou a escola, a Fundação Marcopolo levou alunos dentro de diversos ônibus no turno contrário às aulas para que eles tivessem acesso a oficinas de teatro, música e dança. Esta foi mais uma ação encabeçada por Peruzzo e a equipe diretiva.
— Eles viram jazz, capoeira e violino nesse dia. É como eu relato na minha tese de doutorado sobre o enriquecimento das oportunidades educativas: importante é diversificar . Dinheiro é importante, mas força de vontade é fundamental — afirma.
Para os próximos meses, Peruzzo ainda pretende chamar a atenção com mais uma ideia. Ele quer fazer uma sessão de Cinema Comunitário onde um telão será instalado na quadra da escola. Os alunos serão convidados a levar sua cadeira de praia para assistir seu fime com direito a refri e pipoca. A atividade, no entanto, está condicionada aos protocolos que estarão em vigor devido à pandemia.
Confira a entrevista que Vagner Peruzzo concedeu ao programa Atualidade, especial de Educação, na Rádio Gaúcha nesta quinta-feira: