Uma decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) trouxe novo ânimo e é aposta de melhor qualidade de vida para uma jovem caxiense de 29 anos e para os pais dela. No último dia 6, o colegiado da 7ª Turma do Tribunal decidiu, por maioria, que a família não será penalizada por cultivar cannabis para fim medicinal. Na prática, significa dizer que eles farão o plantio, cultivo e extração do óleo da planta, que servirá para tratamento de saúde, e não serão enquadrados na lei antidrogas.
A jovem, que tem a identidade preservada, teve uma parada cardiorrespiratória durante uma broncopneumonia grave em 2008. As sequelas foram distúrbios neurológicos dos movimentos físicos. Um deles é caracterizado por contrações involuntárias dos músculos e outro por rigidez muscular.
O fisioterapeuta José Eloy de Jesus, especialista em fisioterapia neural, emitiu parecer que foi juntado ao processo. Segundo ele, a cannabis atua como relaxante muscular, é natural e não tem efeito colateral.
– Está mais do que comprovado que ela (cannabis) traz um relaxamento muscular que beneficia a fisioterapia. É um excelente medicamento coadjuvante, proporcionando relaxamento cardiorrespiratório, em que o paciente consegue um aporte respiratório bem melhor e também o benefício do relaxamento do trato urinário – explicou o especialista, se referindo a áreas geralmente afetadas em pacientes neurológicos.
No pedido feito à Justiça, a família também anexou parecer de um neurologista que fala sobre os estudos existentes e o resultado da cannabis nos pacientes com problemas nessa área. Durante anos, a família comprou o óleo para uso da jovem e confirma a melhora dela. Mas, cada 100ml, suficiente para tratamento de 45 dias, custa 250 dólares, o equivalente a R$ 1,4 mil, considerando cotação da moeda americana na quinta-feira. Além do alto custo, a composição do produto industrializado é duvidosa. A família também investe em fisioterapia e fonoaudiologia há 12 anos e outros medicamentos que a jovem precisa, o que torna o tratamento bastante oneroso.
A decisão renovou as esperanças da mãe da jovem que já estava desacreditada de uma posição favorável. O advogado que representa a família, Patrick Mezzomo, ingressou com ação em dezembro do ano passado. Mas a Justiça Federal não acolheu o pedido na primeira instância, alegando que seria caso administrativo e não criminal. Ele, então, recorreu. No TRF4, o entendimento foi diferente, de que o caso é sim é uma questão criminal porque ela pretende fazer o plantio e a extração em casa, ou seja, não se trata de pedido para importar o produto.
– Entrei com um salvo-conduto para que eles possam plantar sem sofrer uma repressão por parte dos órgãos de polícia. Porque, via de regra, quem planta é enquadrado como tráfico de drogas e é penalizado. É uma vitória muito importante, pois o tema é bastante polêmico e possui como plano de fundo o debate sobre a liberação da planta para uso medicinal – pondera o advogado.
Como o Ministério Público Federal emitiu parecer antes do julgamento favorável à solicitação e, portanto, não deve recorrer da decisão, a família poderá plantar até 12 pés da cannabis e fazer a extração do óleo de forma caseira para uso no tratamento da jovem.
– Eu não cabia em mim de felicidade porque lutamos muito por isso e faz muito tempo que esperamos por esta resposta. Ela (jovem) ficou muito feliz (com a notícia). Daqui a pouco, isso vai poder ajudar outras pessoas que nem sabem que existe (esse tratamento) ou que tem preconceito. Eu mesma tive que vencer o preconceito que tinha. Mas só quem acompanha sabe a necessidade dessa gotinha para ela – disse a mãe.
O que já é permitido
:: O Brasil ainda não permite o plantio da cannabis. Mas, é possível importar o óleo extraído da planta para o uso medicinal.
:: A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou uma resolução em janeiro deste ano, que revoga resoluções anteriores e estabelece os critérios e os procedimentos para a importação de produto derivado da cannabis. A importação por pessoa física, para uso próprio, precisa ser mediante prescrição de profissional legalmente habilitado, para tratamento de saúde.
:: O produto a ser importado deve ser produzido e distribuído por estabelecimentos devidamente regularizados pelas autoridades competentes em seus países de origem para as atividades de produção, distribuição ou comercialização.
:: O paciente também tem que ser cadastrado na Anvisa. A entrega, venda ou doação a terceiros é proibida.