Pelo menos três hospitais de Caxias do Sul contam com um novo aliado no tratamento de pacientes graves internados com coronavírus: a dexametasona. Considerado por especialistas um medicamento promissor para ajudar no combate ao vírus, o remédio é usado nos hospitais Virvi Ramos, Geral e da Unimed. Trata-se de um corticoide de baixo custo, que foi usado em um ensaio clínico com seis mil pessoas que necessitavam de ventilação pulmonar no Reino Unido. Um estudo da Universidade de Oxford apontou que o remédio salvou a vida de um terço dos pacientes medicados.
O resultado do uso do corticoide foi comemorado na última terça-feira (16) pela Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI). Em informativo, a SBI descreveu a terça como um dia histórico no tratamento da doença. Na publicação, os especialistas afirmam que o medicamento é o primeiro tratamento farmacológico que mostrou impacto na redução da mortalidade. A medicação já fazia parte do protocolo de hospitais para pacientes graves, mas agora é indicada pela SBI para quem precisa de oxigênio ou está em ventilação mecânica.
— A Sociedade Brasileira de Infectologia ficou muito feliz com os dados. A instituição fez um informe onde anuncia que realmente pela primeira vez a gente tem um estudo que mostra que um medicamento teve impacto em mortalidade. A nossa posição é favorável e estamos ansiosos pela publicação oficial do artigo porque ainda temos apenas um comunicado da Universidade de Oxford. É um medicamento que tem sido usado em Caxias do Sul com bons resultados em pacientes graves desde o início da pandemia e ficamos felizes com o reconhecimento dessa medicação como um tratamento que fez a diferença na vida de pacientes graves — explica a médica infectologista Lessandra Michelim Rodriguez Nunes Vieira, que integra a diretoria da Sociedade Brasileira de Infectologia e atua no combate à doença em Caxias do Sul.
A médica esclarece que não há benefício em pacientes hospitalizados não graves.
— Esse medicamento diminui a mortalidade de pacientes em ventilação mecânica ou usando oxigênio. São pacientes graves e internados, mas aqueles que não usavam oxigênio e não tinha alteração e precisaram de ventilação, não teve impacto da medicação.
A especialista alerta que é preciso cuidado no uso do remédio. Ela explica que o medicamento é um anti-inflamatório potente, mas também é um imunomodulador que, em altas doses e em tempo prolongado, pode alterar a imunidade, que é a defesa do organismo.
Especialistas aprovam uso da medicação em Caxias, mas alertam para os perigos da automedicação
Os resultados do uso do remédio são promissores, mas especialistas de Caxias alertam para os perigos da automedicação com consequências para a hipertensão e diabetes. A medicação não pode ser usada sem supervisão médica. O risco do uso é que o corticoide, por exemplo, em uma pessoa diabética aumenta a glicose. O remédio não pode ser usado muito tempo, e o uso não deve ser interrompido rapidamente, mas sim aos poucos, e conforme a orientação de um médico.
A diretora da Vigilância em Saúde e infectologista Andréa Dal Bó, que está à frente do enfrentamento ao coronavírus no município, explica como funciona a medicação no tratamento da covid-19:
— O que nós vemos na covid-19 é o que chamamos de tempestade de citocinas, que é uma inflamação importante, principalmente no pulmão, que é o órgão mais afetado. A dexametasona é um corticoide, que é o anti-inflamatório mais potente que existe na medicina, e que pode ser usado de forma precoce nessa tempestade de citocinas para evitar a necessidade de intubar o paciente. É uma medicação muito eficaz para reduzir a carga viral e atuar diretamente na inflamação — diz ela.
O hospital de campanha de Caxias do Sul e o Virvi Ramos estão usando a medicação desde a terça-feira (16). A Secretaria da Saúde, inclusive, orienta o uso da medicação em caso de pacientes hospitalizados:
— Esse é o protocolo: internou, já recebe a medicação. No Virvi Ramos, estamos entusiasmados com a utilização da medicação e do plasma em pacientes que passaram pela transfusão.
"Não há margem para questionamentos sobre a eficácia em pacientes graves", diz intensivista
O coordenador da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Virvi Ramos, Roger Weingartner, ressalta que o benefício da medicação é comprovado cientificamente:
—O estudo é um trabalho de uma instituição reconhecida e que tem credibilidade para impactar de forma forte as condutas médicas. Pelo estudo, não há margem para questionamento sobre os benefícios nos casos graves. Dificilmente encontraremos uma medicação com tanto impacto positivo na recuperação, especialmente de pacientes que estão em ventilação mecânica.
Ele ressalta que todos os pacientes que estão na UTI são medicados.
— Antes do estudo, existiam indicações de uso de corticoide, mas a partir de agora há recomendação para o uso dessa medicação. É um protocolo institucional. No entanto, ele não teve benefício no paciente que não precisou de ventilação mecânica e oxigênio, por isso, não é para ser usado por qualquer paciente e sem indicação médica. A medicação é para aqueles pacientes que precisam de oxigênio ou já estão intubados.
Hospital Geral também usa medicação
O Hospital Geral já usava a medicação em pacientes internados na UTI, como parte de um estudo do Hospital Albert Einstein. No entanto, ainda não há resultados da pesquisa.
— Depois do comunicado da Sociedade Brasileira de Infectologia, o HG passou a usar o medicamento desde a quarta, seguindo as orientações da SBI. A recomendação é que todo paciente com covid-19 em ventilação mecânica e os que necessitam de oxigênio fora da UTI sejam medicados com dexametasona. A medicação é usada com efeito anti-inflamatório, ou seja, ela reduz a inflamação no organismo — explica a coordenadora da Infectologia, a médica Viviane Buffon.
Os pacientes devem receber dexametasona via oral ou endovenosa 6mg 1 vez ao dia por 10 dias, conforme orientação da SBI.
A MEDICAÇÃO
De acordo com farmacêutica Aline Cavion, a dexametasona é medicamento utilizado em processos alérgicos e inflamatórios e outras doenças que respondem aos glicocorticoides. Ainda segundo ela, é prescrito para tratar doenças reumáticas, neoplásicas, endocrinopatias, pneumopatias, hemopatias, oftalmopatias e alergopatias, entre outras. O medicamento é vendido sob prescrição médica e sem a retenção da receita.
ESTUDO
A Universidade de Oxford comparou pacientes que receberam dexametasona por via oral ou endovenosa, uma vez por dia, ao longo de 10 dias, com aqueles do grupo controle. Confira o resultado:
1) Redução de mortalidade (em 28 dias) de 1/3 (33,3%) nos pacientes em ventilação mecânica.
2) Redução de mortalidade (em 28 dias) de 1/5 (20%) nos pacientes necessitando de oxigênio e que não estão em ventilação mecânica.
3) Não houve diferença nos pacientes que não necessitam de oxigênio.
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