Colocar a leitura em dia. Manter a rotina de atividades físicas. Começar um curso de aperfeiçoamento online. Aprender uma receita nova. Maratonar uma série. Organizar as gavetas de documentos.
Planos não faltavam, mas os dias foram passando e o tempo livre da quarentena não se confirmou como um oásis de produtividade. Resultado: frustração diante das metas planejadas e não cumpridas.
Para a psicóloga Tatiana Rocha Netto, esse sentimento é mais comum do que se imagina, sobretudo em tempos de isolamento. Com 36 anos de atuação clínica em Caxias do Sul, ela explica que emoções negativas, como tristeza, medo ou insegurança, são mais difíceis de lidar quando as pessoas não se propõem a encará-las de frente.
— Muitas pessoas têm dificuldade até para nominar os sentimentos. E o recolhimento social tem nos colocado frente a frente com eles. Acontece que muitas pessoas não estão preparadas para isso. Eu tenho atendido muitos pacientes, por videochamada, que estão relatando justamente essa frustração — conta Tatiana.
Na mesma linha de raciocínio, o psicólogo Fernando Sandi acredita que certo grau de decepção é quase inevitável diante das incertezas causadas pela pandemia. Conforme o profissional, “as pessoas se sentem aflitas por não saberem os próximos passos e o quanto serão afetadas”:
— Quem já possui algum histórico de ansiedade pode se sentir mais decepcionado neste momento. Não diria que existe um grupo mais propenso que outro, mas vejo que a ansiedade gera maior dificuldade em lidar com o cenário atual.
São muitos os fatores responsáveis pelo desânimo. Além do excesso de metas traçadas no início da quarentena (que, consequentemente, geram expectativas no subconsciente), o maior tempo dedicado às redes sociais favorece a sensação de impotência. Afinal, basta alguns minutos no feed do Instagram para vermos amigos fazendo exercícios, se aventurando na cozinha ou assistindo algum lançamento badalado da Netflix.
Entre as dicas para evitar o embaraço emocional, os especialistas sugerem diminuir os níveis de expectativa e auto cobrança. Outra recomendação é se libertar da ideia de que o período de isolamento seja uma competição pela produtividade: ou seja, não há nada de errado em investir o tempo livre para descansar e não produzir.
— Se a pessoa está frustrada, ela precisa rever o que planejou. Por exemplo: organizar o armário, ler os livros que estão na cabeceira da cama, fazer exercícios, pintar o cabelo… Primeiro, ela não precisa fazer tudo num dia só, colocar esse excesso de atividades. Depois, é preciso jogar a expectativa mais para baixo, assim a chance de frustração não fica tão alta. Uma palavra fundamental para o momento é equilíbrio. Equilíbrio para saber o que podemos e, principalmente, o que desejamos fazer — explica Tatiana.
Por outro lado, caso você não tenha conseguido evitar a frustração, o ideal é manter a calma e reorganizar a lista de prioridades. Outro ponto importante é encarar um dia por vez, evitando projeções a longo prazo.
— Cada pessoa é diferente da outra. Não somos um robô, uma máquina de produtividade. Temos nossas particularidades e é preciso respeitar isso. Se você colocou como meta ler um livro e isso é realmente o que deseja, tente se desligar um pouquinho de outras tarefas e comece a ler. Sempre respeitando o próprio tempo, sem tanta cobrança — sugere Sandi.
Confira as dicas dos psicólogos para evitar a frustração:
:: Seja menos exigente. O excesso de cobrança aumenta as chances de decepções.
:: Quarentena não é competição de produtividade. Não há nada de errado em ficar ocioso durante o tempo livre.
:: Mantenha o equilíbrio. Reorganize sua rotina com base no que você realmente precisa e deseja fazer.
:: Durante o isolamento, evite traçar metas muito distantes. Encare um dia de cada vez.