Promovido pelas Nações Unidas, o Dia Internacional da Pessoa com Deficiência é nesta terça-feira. A finalidade da data é buscar compreensão sobre o tema e mobilizar a defesa da dignidade, dos direitos e o bem-estar das pessoas.
Dados da Organização Mundial da Saúde apontam que mais de 1 bilhão de pessoas têm algum tipo de deficiência e mostram a necessidade de se pensar em políticas públicas e maneiras de incluir essas pessoas no ambiente familiar e na sociedade. Destas, uma em cada dez, é criança.
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Miguel Dellazeri Theo, 7 anos, enfrenta desde cedo a luta por inclusão e acesso à educação. O menino nasceu em 9 de julho de 2012 e foi diagnosticado com Drenagem Venosa Anômala Pulmonar Total, (Dvapt) — alteração das artérias que vão do pulmão ao coração. O problema provocou saturação baixa, que ocasionou anoxia cerebral. Aos 11 dias de vida, o menino foi operado. As lesões no cérebro ocorreram em uma região que afetou a parte motora.
Miguel não tem o movimento das pernas. A primeira batalha encarada pelos pais foi encontrar ajuda para cuidar dele em casa:
— Tínhamos uma pessoa que nos ajudava nas tarefas em casa, mas desistiu. Ela disse que cuidar de uma criança que não caminhava era muito desgastante — conta o pai Jean Carlos Theo, 42 anos.
Os desafios diários se transformaram em aprendizado e vitórias para a família. Também os fortaleceu na luta por direitos iguais para o menino.
A difícil tarefa de conseguir uma escola
Com pouco mais de três anos de idade, os pais de Miguel começaram a busca por escolinhas.
— Minha esposa ligava e tinha vaga, mas quando ela chegava para conhecer o espaço, muitas nem abriam o portão ao ver que ela estava com o Miguel no colo, e perceber que ele não caminhava. As educadoras diziam que não tinham como cuidar do nosso filho — lembra o pai.
Depois de algum tempo, conseguiram uma escola preparada para receber Miguel. Os anos passaram e chegou o momento de matricular o filho na primeira série do Ensino Fundamental.
— Tentamos atrasar o ensino dele porque por mais que lutássemos por inclusão, não suportávamos pensar em ver mais portas fechadas. Falamos com a Defensoria Pública, que nos informou sobre uma lei que determina que as escolas precisam estar preparadas para receber alunos com deficiência e que não podíamos manter ele na escolinha — conta o pai.
Apesar da lei, não foi fácil encontrar um colégio preparado para incluir Miguel. Jean e a esposa, Débora, 38, mais uma vez começaram uma maratona em busca de vaga.
— Como estudei em escolas particulares, essas foram as primeiras opções. Fomos em três e apenas uma se dispôs a aceitar o Miguel, mas disse que aprenderia com ele, porque não estavam preparados. Em outra, chegaram a falar que não havia vagas, sendo que as matrículas estavam abertas.
Para o pai, não é apenas despreparo, mas também preconceito:
— Infelizmente há um olhar diferente, um certo preconceito — reclama.
Catulo abriu as portas
O pai de Miguel resolveu mudar o foco e decidiu procurar uma escola pública. A Catulo da Paixão Cearense é um colégio focado nos anos iniciais e reconhecida por abrir as portas aos portadores de necessidades especiais. Foi lá que Miguel encontrou acesso à educação.
— Ele está adaptado, é bem cuidado e as crianças não o tratam como alguém com deficiência. Ele é apenas mais uma criança e está tendo o direito à educação e à acessibilidade assegurada. A conscientização passa também pela escola — diz Theo.
Para a diretora da escola, Adriana Scott Amaral Restelatto, para receber bem os alunos foi preciso antes abrir as portas e aprender com eles:
— É preciso adaptar o currículo para que eles aprendam melhor. É um desafio diário, mas estamos abertos ao diálogo com a família em busca de soluções. Todos os professores da escola já tiveram um aluno especial. Cada criança tem o seu tempo e trabalhamos currículos diferentes para cada um. A escola tem banheiro adaptado, rampas e barras nas paredes.
"Miguel é como um filho”, diz cuidador educacional
Miguel conta com os cuidados de Émerson de Souza, 36. Ele é cuidador educacional e acompanha o menino diariamente desde o início do ano letivo. Os pais levaram um andador para a escola e Emerson pesquisou como adaptar o equipamento, transformando em um brinquedo.
Tímido, o menino não esconde a alegria ao brincar no pátio do colégio:
— Eu gosto de estudar aqui — conta, sorridente.
A cumplicidade entre os dois é visível.
— O Miguel é como se fosse um filho. Estou ao lado dele desde que entrou na escola. É complicado para o professor porque o Miguel requer mais atenção, então como o município tem um cuidador facilita o aprendizado e a parceria é diária.
Um dos momentos que o menino mais gosta é quando chega ao colégio um caminhão para entregar bananas. Miguel até nomeou o veículo:
— É o bebê porque ele é pequeno — conta, sorrindo.
Abraçado a Émerson, que chama de tio, Miguel se prepara para o futuro e conta com a ajuda dos colegas:
— Ele desenha, brinca com as palavrinhas, é querido. Gosto de estudar com o Miguel. Ele gosta muito da escola e do tio Émerson — conta a colega Gabriele Lourenço, seis anos.
A alegria do menino inspira, porque mesmo apesar das adversidades ele mantém um sorriso no rosto:
— Ele tem uma felicidade que contagia, veio para a nossa família como uma bênção e espalha essa alegria por onde ele passa — emociona-se o pai.
Émerson acrescenta:
— Ele faz trabalho em grupo, participa das atividades. Ele é uma paixão, não há quem não se encante com a alegria dele.