Invisíveis para muitos, os telefones públicos, os chamados orelhões, fazem parte do cenário urbano das cidades brasileiras. Em Caxias do Sul, não é diferente. É verdade que a maioria das pessoas hoje sequer nota a presença deles, já que tem o celular sempre ao alcance das mãos. Talvez você nem lembre quando usou um orelhão pela última vez, mas se precisar do aparelho, em alguma emergência, caso o celular fique sem bateria ou sinal ou ainda caso você esqueça o aparelho em casa, terá de caminhar muito para encontrar um que funcione.
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A reportagem do Pioneiro percorreu duas das principais vias da cidade, a Rua Sinimbu, da Avenida Itália até a BR-116, e a Avenida Júlio de Castilhos, do cruzamento com a Perimetral Oeste até o Monumento ao Imigrante para verificar a conservação dos telefones. O levantamento deixa evidente a má conservação e descaso com os orelhões: de 30 aparelhos, apenas dois estavam funcionando na última segunda-feira. Um na Júlio, em São Pelegrino, e outro na Sinimbu, em Lourdes.
Na caminhada, constatou-se que o número de aparelhos foi reduzido, principalmente, na Júlio, onde os telefones ficavam nas calçadas e também nos canteiros no meio da avenida. Do Monumento ao Imigrante até a esquina com a Alfredo Chaves, não há nenhum aparelho. O mesmo ocorre da Dr. Bozzano até o cruzamento com a Perimetral Oeste.
A constatação da reportagem é confirmada pelos dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que apontam que hoje há 268 telefones públicos em Caxias. Em outubro de 2018 eram 1.680, ou seja, uma redução de 1.412 aparelhos. Dos 268, apenas 166 se encontram ativos. Os demais estão em manutenção.
A redução ocorreu porque em 20 de dezembro do ano passado foi aprovado o Decreto nº 9.619, que dispõe sobre o novo Plano Geral de Metas para a Universalização do Serviço Telefônico. Segundo a Anatel, entre as alterações consta o fim da obrigação da concessionária em manter um orelhão a cada 300 metros nas localidades atendidas com acesso individual. Outro ponto é que não há mais obrigatoriedade de garantir a densidade de 4 orelhões para cada 1 mil habitantes. A estimativa da agência é que até o final do ano ocorra uma redução de 77% da quantidade de orelhões existentes até dezembro de 2018.
Os poucos que sobrevivem na área central não estão apenas mudo, mas sujos e depredados, com os fios amarrados, sem partes do fone ou totalmente destruídos.
Uns não usam, outros sentem falta
Osório Saldanha, 80 anos, é um dos que sente falta dos aparelhos. Ele reclama que no Centro os orelhões não funcionam e conta que no Desvio Rizzo, onde mora, os que estavam em funcionamento foram desligados.
– Estamos há meses tentando resolver a situação dos orelhões desligados no bairro. Já procuramos ajuda e fomos ao Procon porque tem muitas pessoas que não têm telefone e usavam o telefone público e eles foram desligados. No Centro, tem que caminhar muito para encontrar um que funcione, porque 90% estão estragados – destaca Saldanha.
Ao contrário dos mais velhos, que mesmo que tenham se rendido aos celulares, às vezes ainda utilizam os aparelhos, grande parte dos jovens usou os orelhões poucas ou nenhuma vez:
A assistente de comunicação, Joice Oliveira, 28, passa pelos orelhões, mas nem percebe mais a existência deles:
– Quase nem reparo nos orelhões. Usei na infância apenas, hoje nem lembro mais quando foi a última vez que fui até um telefone público para fazer uma ligação – conta Joice.
O aposentado Nilton Figueira Pires, 77, não usa um orelhão há mais de dez anos.
– Depois que comecei a usar celular não utilizei mais telefone público, é sempre o fixo em casa ou o celular. Hoje percebo que a maioria é usado apenas para atrair vândalos e ser depredados – ressalta Pires.
Acabou a bateria do celular e agora?
Mesmo com o celular sempre ao alcance da mão, visto que hoje o Brasil conta com 230 milhões de celulares ativos, de acordo com pesquisa da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP), os aparelhos são considerados uma opção emergencial para situações específicas, como quando acaba a bateria do celular.
O metalúrgico Hélio Almeida Alves, 57, precisou recorrer a um orelhão depois de anos sem usar um telefone público.
– Há cerca de um mês precisei usar o orelhão e tive sorte porque encontrei um que funcionava.
O comerciante Joacir Hilário Fontana, 52, conta que há cinco anos os telefones públicos na Avenida Itália com a Rua Feijó Júnior, estão fora de uso.
– Muitas pessoas tentam usar o orelhão e não tem como porque estão estragados. Já solicitamos o conserto várias vezes – afirma.
A Blitz
Da Avenida Itália, onde fica o Parque Cinquentenário, até a Sinimbu, há três orelhões. O aparelho que fica entre a Teixeira Mendes e a La Salle, é um dos que está mais deteriorado. Os dois orelhões nas esquinas da Feijó com a Rio Branco estão fora de uso. Logo mais a frente, na praça João Pessoa, na Feijó com a Sinimbu, outros dois orelhões, seguem esquecidos. Ainda na Sinimbu, entre Feijó e a Coronel, há um telefone em frente ao São Carlos, sem sinal, sujo e depredado. Já entre a Moreira César e a Marechal Floriano, também na Sinimbu, há quatro aparelhos e nenhum deles funciona.
Entre a Visconde e a Garibaldi há um orelhão, que não está apto para ligações. Na esquina da Visconde com a Sinimbu, outro aparelho, fora de uso. Seguindo em direção ao Centro, há dois na esquina com a Montaury, bem depredados. Na praça Dante, na Marquês do Herval, onde antes tinha um orelhão há apenas uma placa de metal no chão. Na quadra, entre a Borges de Medeiros e a Alfredo Chaves, há três. Todos estragados.
Da Sinimbu até a Humberto de Campos, há um aparelho funcionando em frente a um restaurante. Na quadra entre a Angelina e a BR-116, há dois, ambos sem qualquer possibilidade de uso.
:: Na Júlio, do Imigrante a Alfredo Chaves, o orelhão não funciona. Da Alfredo até a Dante Alighieri, também não há mais aparelhos. Ao chegar a Dante, há dois telefones estragados. Na quadra da Coronel até a Feijó Júnior, há três aparelhos, dois deles na João Pessoa, nenhum faz ligações. Na quadra entre a La Salle e a Dr. Bozzano, em São Pelegrino, há o único orelhão apto a fazer ligações em toda Avenida Júlio de Castilhos. Da Dr. Bozzano até o final da Júlio não há mais orelhões na via.
:: Em relação a conservação, a Anatel esclarece que qualquer pessoa pode solicitar o reparo dos telefones públicos. A orientação é que contate a concessionária que, neste caso, é a Oi, e solicite o reparo, que deve ser realizado em 24 horas. A pessoa deve anotar e guardar o número do protocolo de atendimento. Se a reclamação não for atendida no prazo, isso deve ser informado à Anatel, por meio de um de seus canais de relacionamento com os consumidores: Central de Atendimento Telefônico Gratuito: 1331 ou 1332 (deficientes auditivos); ou na página da Anatel – Registrar Reclamação.
O que diz a Anatel
A Anatel informa ainda que a comunidade pode consultar os locais onde estão instalados os orelhões e se estão funcionando, por meio do Sistema Fique Ligado, disponível no endereço sistemas.anatel.gov.br/fiqueligado/.
Sobre a quantidade de aparelhos disponíveis na cidade, a agência ressalta que “Nas localidades com mais de 300 habitantes, as concessionárias devem ativar e manter orelhões para atender os estabelecimentos de ensino regular, de saúde, de segurança pública, bibliotecas e museus públicos, órgãos do Judiciário, do Executivo, do Legislativo, do Ministério Público e de defesa do consumidor, terminais rodoviários, aeródromos e áreas comerciais. Caso algum destes locais não tenha orelhão instalado, mediante solicitação, a concessionária responsável deverá providenciar”.