Toda vez que passa em frente ao Monumento Nacional ao Imigrante, Nelson Zanotti, 67 anos, faz o sinal da cruz e pede a graça de alcançar a idade do avô, que morreu aos 85, quando ele tinha apenas nove.
Nelson é neto de Luigi e Enrica Zanotti, casal que serviu de modelo para o monumento. Como era muito pequeno quando o marco foi inaugurado, em 28 de fevereiro de 1954, as únicas lembranças que tem são das histórias contadas pelos avós, como as vezes em que foram fotografados para que as imagens fossem utilizadas pelo artista Antônio Caringi, que esculpiu o molde de gesso, e a inauguração com a presença presidencial de Getúlio Vargas.
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A fotografia dos avós com o presidente está em um quadro e é exibida na parede da casa de Nelson, em São Virgílio da Sexta Légua, nas terras onde o avô se instalou ao chegar em Caxias do Sul.
O neto se emociona ao recordar a história de superação dos avós. Ao contar que Luigi passou fome e até morou em um tronco oco de árvore, ainda criança, ele chora.
– Não é todo mundo que tem esse privilégio de ter os avós como símbolo nacional dos imigrantes.
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Lucinara, filha de Nelson, fez questão de dar ao primogênito, hoje com cinco anos, o nome de Luigi. Ela tem orgulho da participação da família na construção da memória da cidade.
– É o retrato da imigração italiana, do sufoco que eles passaram. A gente olha (para o monumento) e vê o que eles superaram – diz.
A reação do casal – Luigi tinha 80 anos e Enrica, 79, quando a obra foi inaugurada. No Pioneiro de 9 de janeiro de 1954 consta que, quando o monumento ficou pronto, o casal foi levado para vê-lo e Enrica disse: “Parece que os dois falam, não é, Luigi? Olha, ela tem o rosário e ele, a sacola. Era mesmo assim que faziam quando iam cortar mato ou capinar. Levar junto a comida na sacola. Carregar os filhos e ir com a serra, o machado e a foice e derrubar o mato.”
Muitas mãos
Para dar forma à ideia de Compagnoni, muitas pessoas se envolveram no projeto, como o escultor Antônio Caringi, que esculpiu o molde em gesso no seu ateliê, no Rio. O molde foi trazido para Caxias para ser fundido na Metalúrgica Abramo Eberle pelo mestre italiano Tito Bettini.
Na fábrica, cerca de 40 operários se dedicavam a dar forma ao monumento. Um deles era o jovem Elio Nogueira de Almeida, com 14 anos na época. Secretário do chefe da seção, era responsável por fazer a limpeza do metal e anotar a produção de cada trabalhador do setor.
Almeida não tinha dimensão da importância do trabalho que desenvolvia.
– Quando o prédio da Maesa foi doado ao município pelo Estado (em 2014), eu estava lá ao lado dos netos do Abramo Eberle. O prefeito falou que eu era o único operário vivo que tinha construído o monumento. Eu levantei e me segurei para não chorar – recorda, emocionado, hoje aos 81 anos.
Ideia lançada em editorial do Pioneiro
Símbolo da imigração e ponto turístico caxiense, o Monumento Nacional ao Imigrante não representou somente um marco para a cidade, mas também para a primeira década de existência do Pioneiro. A ideia de uma obra que comemorasse os 75 anos da colonização italiana, aliás, teve a participação fundamental do jornal.
Em 30 de dezembro de 1948, Luiz Compagnoni, deputado e proprietário do Pioneiro, lançou a ideia em editorial. Ele tratava a obra como “símbolo de veneração àqueles que, em lutas ingentes e sacrifícios constantes, nos legaram um patrimônio moral e material invejável para qualquer outra cidade e outro povo”.
Entre muitas possibilidades sobre como seria o monumento (arco, bloco monolítico, estátua), parecia consenso a ideia de um casal de pioneiros: jovens, corajosos, representando um “sinal de união dos que habitam Caxias, de qualquer origem”. Para que se concretizasse, falava-se da necessidade da união de forças “produtoras”: governo, intelectuais e imprensa, o que acabou mobilizando toda a sociedade.
Curiosidades
:: O obelisco mede 20,96 metros de altura, em granito.
:: A estátua de bronze tem cinco metros de altura e pesa cerca de três toneladas. O casal está vestindo trajes da época da imigração (entre 1875 e 1885). Eles representam o espírito e os ideais dos imigrantes que superaram as dificuldades e construíram uma nova pátria.
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