O sonho de ser mãe se transformou em aflição e angústia para Natália Ribeiro da Silva, 22 anos. Ela corre contra o tempo em busca de ajuda para tentar reverter uma lesão provocada durante o parto do filho, Waysler Ediel da Silva Kinast.
Ao nascer, o menino teve fratura na clavícula e lesão de plexo braquial, que são danos causados em um conjunto de nervos que conduz sinais da medula espinhal para os membros superiores. Isso comprometeu o movimento do braço direito do bebê.
A história de Waysler poderia nem vir a público, se não fosse o diagnóstico passado à mãe do menino pelo especialista em traumatologia que o atendeu no Centro Especializado em Saúde (CES). A consulta do último dia 13 provocou dor e trouxe incerteza quanto à recuperação do filho.
— O médico me disse: "Olha, mãe, a lesão dele é crônica e ele não vai voltar a mexer o braço. Talvez mais pra frente, na vida adulta, ele faça cirurgia e recupere algum movimento do cotovelo e do ombro, e talvez do punho" — conta Natália.
O médico teria acrescentado que a lesão é grave e encaminhado o bebê para consulta no Hospital Pompéia.
— Estou esperando ser chamada, mas se for a lesão que o médico acredita que é, pelo que ele me disse, meu filho pode ser operado até os três meses e ele já vai fazer dois.
O desabafo da mãe nas redes sociais, na última sexta-feira chegou às advogadas Alesandra Rannow e Marieli Mercali, que se ofereceram para representá-la, sem custo algum, e ingressar com uma ação contra o Hospital Geral. Marieli afirma que acompanhou o caso sobre a morte do bebê Teylor Terra da Fonseca (leia no mais), 10 meses, porque é amiga da família e que a situação enfrentada pelas duas mães a tocou para que lutasse em busca de melhoras consideráveis na saúde pública. Alesandra diz que atualmente 25% das mães sofrem violência obstétrica, e há cada vez mais relatos de mães sobre partos complicados no Hospital Geral.
— A mãe, no momento do parto, está muito sensível, com dor, e diante do que a Natália viveu e do quadro do bebê, vamos entrar com uma ação indenizatória. Ela implorou uma cesárea e sofreu por 24 horas e o bebê sofreu com ela. Vamos pleitear o pagamento do tratamento do menino, assim como uma possível pensão vitalícia, diante dos danos da lesão crônica no braço do bebê. Também iremos buscar a responsabilidade civil mediante a negligência, imprudência e imperícia dos médicos e a responsabilidade do hospital — afirma Alesandra.
A advogada também classifica as condutas praticadas com a mãe como violência obstétrica, incluindo-se as tentativas de induzir o parto, a Manobra de Kristelle (pressionar a parte superior do útero para facilitar a saída do bebê) e procedimentos dolorosos sem consentimento da mãe.
24 horas de dor
Natália conta que o pré-natal na unidade básica de saúde (UBS) Diamantino foi tranquilo, mas a ginecologista já alertava que o bebê era grande ( nasceu com 53 centímetros e 3,970 quilos). Quando completou 39 semanas de gestação, a ginecologista indicou que Natália procurasse o Hospital Geral. Segundo ela, foi quando os problemas começaram, porque apesar da ginecologista da UBS considerar que o bebê estava pronto para nascer, no HG lhe mandaram voltar só quando estivesse com 41 semanas.
Nesse meio tempo, com 40 semanas, ela voltou à UBS, e a médica garantiu que estava na hora do bebê nascer. Como não apresentava dilatação, a médica alertou sobre a necessidade de cesárea e no encaminhamento, Natália constava como paciente de alto risco. Mas o hospital a teria mandado para casa mais uma vez. Quando ela chegou pela terceira vez ao HG, às 11h do dia 23 de maio, lhe pediram que caminhasse pelos corredores porque tinha apenas um dedo de dilatação. Não adiantou, então decidiram induzir o parto com comprimidos e exercícios, também sem resultado. Por fim, às 14h do dia 24, com fortes dores foi levada para a sala de parto. Emocionada, Natália relembra horas de dor e agonia, e conta que uma médica que estava na sala de parto se apavorou porque ela já havia sido cortada três vezes, e não havia espaço para o beber nascer:
_Eu implorei por uma cesariana, porque não conseguia mais fazer força. Eu senti aqueles ferros dentro de mim, o fórceps, elas não perguntaram se podiam usar, simplesmente senti e eu implorei que elas tirassem, mas me ignoraram.
A tensão seguiu até que uma das enfermeiras fez força em cima da barriga de Natália, empurrando até Waysler nascer. Os momentos de aflição continuaram. Segundo a mãe, o bebê precisou ser reanimado duas vezes e só quando foi intubado com o oxigênio ele passou a reagir. Depois de duas horas, já no quarto a pediatra lhe deu duas notícias:
— Uma era que os testículos dele estavam presos no canal inguinal , mas que com o tempo desceria. A outra era que ele teve uma fratura na clavícula e a lesão de plexo braquial. Ela explicou que o nervo dele foi esticado, mas disse que estava tudo bem. Ela me garantiu que ele seria encaminhado para fisioterapia e para ortopedista e ele voltaria a mexer o bracinho.
Dois dias depois, Natalia teve alta e levou o pequeno para casa com o braço imobilizado. Após 14 dias, ele passou a ir até o fisioterapeuta três vezes por semana, mas o bebê não apresentava melhoras.
— Passou um mês e eu não vi resultado nenhum e então marcaram consulta pra ele no CES lá o médico me disse que é muito difícil que ele mexa o braço. Não posso deixar assim! Quantos bebês, mamãe e famílias vão sofrer ainda pelo descaso e negligência deles? Meu bebê era perfeito, minha gravidez foi um sonho, tranquila e feliz, e ele era um bebe grande e saudável por causa da incompetência deles, meu bebê pode ter problemas pra sempre.
Solidariedade na rede social
Na sexta-feira após o diagnóstico do médico, Natália entrou em desespero e postou um texto no Facebook onde desabafa sobre o que aconteceu com o bebê. A postagem teve tocou diversas pessoas e provocou revolta em outras mães. De acordo com a jovem em um dos comentários lhe indicaram um médico de Santa Catarina, que seria um dos poucos especialistas que poderia reverter a lesão. A consulta sairia R$ 400 reais, fora os gastos com a viagem, e com a cirurgia, que é um dinheiro que não tem para pagar o procedimento:
— Minha mãe tem me ajudado muito financeiramente porque eu não estou trabalhando, e para poder levar o bebê às fisioterapias e aos médicos sempre preciso ir de taxi ou de Uber. Para que eu possa fazer essa cirurgia e mudar a vida do meu filho eu dependo da ajuda das pessoas, eu faria qualquer coisa, mas não tenho como pagar uma cirugia particular. Eu faria sem piscar, mas não tenho esse dinheiro, fiz tudo pelo SUS porque não tinha como pagar um plano de saúde, eu não sei o que fazer.
CONTRAPONTOS
Posição do Hospital Geral
A reportagem entrou em contato com o Hospital Geral. Por meio do setor de relações públicas, a instituição informa que abriu sindicância para investigar o caso. Nesta quarta-feira, às 14h, a direção e a equipe médica irão se reunir para analisar os prontuários da mãe e e do bebê.
O que diz o Centro Especializado de Saúde (CES)
A direção do CES não quis se manifestar e indicou que a família poderia buscar o prontuário completo do bebê, e caso desejasse, poderia divulgar o conteúdo.
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Caso Teylor
A morte do bebê Teylor Terra da Fonseca, 10 meses, no último dia 9, repercutiu na Câmara de Vereadores de Caxias do Sul. O presidente da Comissão de Saúde e Meio Ambiente, vereador Renato Oliveira (PCdoB) protocolou pedido de informação sobre o caso. O menino morreu no Hospital do Círculo em decorrência de uma bronquiolite aguda grave. Familiares registraram ocorrência policial para denunciar uma suposta negligência no atendimento prestado à criança no Pronto-Atendimento 24 Horas (Postão) e no Hospital Geral.
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