Foi com um misto de orgulho e tristeza que Regina Aparecida Cecato de Alexandre abriu as portas da Escola Estadual de Ensino Fundamental João Pollo, da qual foi diretora por oito anos, em São Marcos, para a reportagem na manhã da última quarta-feira. Desde o dia 19 deste mês, a escola entrou em processo de fechamento. É a segunda instituição de ensino da rede estadual a cessar atividades no período de um ano na área da 4ª Coordenadoria Regional de Educação (4ª CRE), com sede em Caxias e que abrange outras 13 cidades. A medida faz parte da reorganização do número de escolas realizada pela Secretaria Estadual de Educação (Seduc) em função da redução na quantidade de matrículas em algumas instituições de ensino.
Mesmo tendo feito uma espécie de campanha de captação de alunos de porta em porta no bairro Michelon, onde fica o colégio, a instituição que mantinha, em média, cem alunos teve uma queda acentuada na procura no final de 2016. Dos 97 estudantes, apenas 60 se matricularam para o ano letivo de 2017. Com isso, a escola, que atendia do 1º ao 8º anos, perdeu turmas e deixou de oferecer o ano inicial e o final. Também no ano passado, já por não ter o mínimo estabelecido de cem estudantes, a escola não conseguiu renovar o programa Mais Educação, que mantinha as crianças em atividades na escola no turno inverso ao de aula. Para a diretora, isso teria sido determinante para o declínio na demanda.
O golpe final ocorreu no final do ano passado, quando a projeção de alunos para 2018 despencou dos 52, que encerraram o ano letivo de 2017, para 26 que indicaram interesse em permanecer na escola. Quase sem alunos, o fechamento se tornou inevitável.
– A João Pollo é a minha casa. Meu pai, meus irmãos, meus sobrinhos e meus filhos estudaram aqui. Então, para mim, este processo é muito dolorido. Parece que estou vivendo um luto. Como se um familiar meu tivesse falecido. Toda a vez que venho aqui e que fecho uma porta... (se emocionou) mas uma escola não existe sem alunos – lamentou a diretora.
Em Jaquirana, a Escola Estadual Ensino Fundamental Albino Pezzi, fechou no início do ano passado. Segundo a Secretaria de Educação do município, a escola tinha cerca de 15 alunos, um diretor e duas professoras, ficava na localidade de Barra da Chapada, no interior do município, a cerca de 30 km da área urbana.
Com salas vazias, saída é cortar turnos
Se fechar as portas é um golpe duro nas comunidades escolares, a redução de turnos é um alerta e um indicativo de que a instituição pode estar caminhando para o fechamento. Drama vivido por duas escolas estaduais de Ensino Fundamental de Caxias do Sul, a João Magalhães, no Centro, e a Ivanyr Euclinia Marchioro, no Jardelino Ramos, que passarão a receber os alunos apenas à tarde.
Na João Magalhães, a medida teve como consequência a perda de duas professoras. Além disso, para abrigar os alunos da manhã, a biblioteca virará sala de aula e os livros serão dispostos em um hall. Segundo a diretora, Carla Varta Pergher, o encolhimento da escola se deu de forma gradual de três anos para cá. Em 2015, havia turmas de 1º ao 6º anos. Em 2016, por determinação da Secretaria de Educação do Estado, não foi ofertado o 6º ano. Em 2017, foi excluído o 5º e, em 2017, o 1º ano. Ou seja, atualmente, a escola atende a 85 crianças do 2º ao 4º anos.
Para Carla, a redução no número de alunos ocorreu porque muitas famílias que moravam nas redondezas e tinham seus filhos na escola mudaram para o loteamento Campos da Serra. As crianças passaram a estudar em uma instituição naquela região. Outro fator foi a migração de alunos da rede estadual para a municipal. Depois do fechamento de turmas, outro aspecto que poderia motivar os pais a optar por outra instituição é a continuidade do ensino em uma mesma escola.
Apesar de temer que o fechamento seja o destino das pequenas escolas, a diretora sai em defesa da manutenção da instituição. Ela argumenta que o trabalho da João Magalhães vai além da educação, abrange também a questão social:
– Aqui conhecemos as crianças uma a uma. Se temos que ter esse olhar para o âmbito familiar, que reverte na aprendizagem, a escola pequena faz isso de maneira mais eficiente. Como educadora, acredito que escola não se fecha. Entendo as demandas do Estado, pelo aspecto de gestão administrativa, porém, como diretora vamos batalhar e tentar encontrar alternativas para manter a escola aberta.
Ivanyr Marchioro se esforça para manter atividades
Na Ivanyr Marchioro, que assiste basicamente a comunidade do bairro Jardelino Ramos, os 148 alunos previstos para 2018 serão acomodados à tarde e com cinco professores a menos. A diretora Marli Petrocelli Cardoso receia que a mudança agrave ainda mais a situação, pois muitos alunos e pais preferem o turno da manhã.
– Isso afeta todo o planejamento das famílias. Um pai me disse: "é só um primeiro passo para fechar a escola". Gostaria que retomassem (governo) essa pauta e analisassem de forma mais humana, enxergando o aluno e família que precisam do apoio, da escola perto. O interesse nosso é que a escola continue – argumenta a diretora.
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Escola Ivanyr Marchioro, em Caxias, sofre com estrutura precária e frequentes alagamentos
A Ivanyr Marchioro conseguiu reabrir uma turma de 1º ano que havia sido fechada, mas perdeu o 9º ano para 2018. A oferta, então, ficou apenas para alunos do 1º ano e do 4º ao 8º ano. Além da redução de estudantes, a instituição enfrenta problemas na infraestrutura do prédio.
Interesse é prejudicado por greves e turmas multisseriadas
Segundo Janice Moraes, coordenadora da 4ª CRE, a redução de estudantes na rede estadual se deve à queda na natalidade e, também, ao fato de as famílias optarem por matricular os filhos na rede particular ou municipal.
Nos últimos três anos, segundo Janice, o número de alunos na rede estadual só caiu. São 1.386 alunos a menos na área da 4ª CRE. Eram 51.390 em 2015, 50.697 em 2016 e 50.004 em 2017.
Conforme a CRE e as próprias direções de escolas, entre os motivos alegados pelas famílias para a migração entre as redes figuram a chamada multisseriação, quando o professor trabalha de forma simultânea, na mesma sala de aula, com alunos de várias séries. Isso ocorre quando não há o número mínimo de 16 alunos para cada turma, exigido pela Seduc. A greve dos professores do Estado também está entre os fatores que podem ter levado os pais a preferirem outras redes.
– Foi necessária essa reorganização para garantir a qualidade, para que o Estado possa atender melhor. Mas nada é feito sem ouvir a comunidade – disse Janice.
Pessoal e materiais serão remanejados
De acordo com a 4ª Coordenadoria Regional de Educação (4ª CRE), quando são cessadas as atividades de uma escola, os professores concursados, os funcionários e os alunos são realocados em outras instituições estaduais. Já as estruturas podem ter diferentes destinos.
No caso da João Pollo, de São Marcos, os móveis, equipamentos, livros e materiais serão retirados do prédio e levados para a 4ª CRE que vai distribuí-los conforme a necessidade das escolas da região. A estrutura que conta com salas de aula, dos professores e de música, laboratório de informática, biblioteca, playground, quadra aberta de esportes e uma área verde com trilha ecológica será ofertada ao município por meio de cessão de uso.
Já o prédio de Jaquirana poderá ser vendido ou ter outro fim, porque a prefeitura não demonstrou interesse em ocupá-lo. A maioria dos alunos foi direcionada para uma escola municipal, a Deotília Cardoso Lopes, na área urbana. Os professores foram encaminhados para outra escola estadual da cidade.
PANORAMA NA REGIÃO
De acordo com as três Coordenadorias Regionais de Educação (CREs) sediadas na Serra, não há previsão de fechamento de mais escolas em 2018
4ª CRE, em Caxias
– Com o cessamento das atividades de duas instituições de Ensino Fundamental, a 4ª CRE, passa a ter 120 escolas, em 14 cidades, num total de mais de 51,2 mil alunos.
– As escolas fechadas foram a Albino Pezzi, em Jaquirana, e a João Pollo, em São Marcos, entre o final de 2017 e o início deste ano.
– Outras duas escolas em Caxias do Sul, a João Magalhães e a Ivanyr Marchioro, terão turnos reduzidos a partir deste ano.
– Não há previsão de fechamento de mais escolas ou de adoção de turno únicos em outras instituições a curto prazo.
16ª CRE, em Bento Gonçalves
– Segundo o coordenador, Leonir Razador, os últimos fechamentos de escolas estaduais ocorreram no final de 2016 – uma em Garibaldi, que teve quatro alunos matriculados, e uma em Nova Bassano, que tinha menos de 10 alunos.
– Atualmente, são 74 escolas, entre elas dois núcleos prisionais e um núcleo de Ensino de Jovens e Adultos (EJA).
– Total de mais de 22 mil estudantes em 25 cidades.
– Do total de escolas, cinco de Ensino Fundamental já funcionam em turno único desde 2017. Duas ficam em Garibaldi, uma em Bento Gonçalves, uma em São Valentim do Sul, e uma em Nova Bassano. Ainda conforme o coordenador, a medida foi adotada porque as escolas tinham entre 20 e 23 alunos cada e funcionavam em dois turnos.
– Segundo Razador, não haverá fechamento nem outras escolas com turno único em 2018.
23ª CRE, em Vacaria
– Não teve escolas fechadas recentemente, segundo a coordenadora Gilvana de Fátima Rissardi Baldin.
– As últimas instituições que tiveram redução de dois para um turno em 2017 atendiam em Ipê, com 50 alunos, e em Pinhal da Serra, com 16 alunos.
– Não há previsão de novas reduções para 2018.
– Atualmente, são 30 escolas, com pouco menos de nove mil alunos nas nove cidades de cobertura.