Ainda que estancar a epidemia do vírus HIV seja prioridade do poder público pela gravidade da doença, há um índice para ser comemorado: a taxa de transmissão de mãe para filho em Caxias do Sul foi zerada, segundo a Secretaria Municipal de Saúde. No país, houve redução de 36% nesses casos.
Leia mais
Medicação e hábitos saudáveis garantem vida normal a portador de HIV de Caxias do Sul
Adoção de criança com HIV em Caxias é bom exemplo para o país
Discriminar pessoas com HIV é crime. Veja direitos dos soropositivos em Caxias
A estatística é positiva graças à detecção precoce do vírus em gestantes, ao reforço na oferta de medicamentos durante a gravidez e ao serviço oferecido gratuitamente no Centro Especializado em Saúde (CES). Os dois únicos casos que surgiram desde 2014 são de crianças contaminadas na fase de aleitamento materno, porque as mães contraíram a doença após o parto.
– A chance de a criança nascer já negativada é de quase 90% quando o tratamento é feito corretamente. Quanto mais cedo for descoberta a doença, maior é a chance de não transmitir para o bebê – afirma a médica infectologista Nicole Alberti Golin, da Secretaria da Saúde.
É importante detectar a doença o mais cedo possível, e isto pode ocorrer em dois momentos da gestação, já que exames pré-natais são feitos no primeiro e no segundo trimestre da gravidez. Foi próximo do sétimo mês que a caixa Grasiele, 25 anos, descobriu-se soropositiva. Era o quarto filho dela e o primeiro de um novo relacionamento. O diagnóstico a abalou bastante, principalmente porque se preocupou com a saúde do bebê.
– Eu me desesperava quando pensava que ele poderia ser soropositivo. O foco, naquele momento, era todo na saúde do meu bebê – desabafa a mãe.
O parecer médico indica que Grasiele provavelmente foi contaminada durante a gestação. Ela tomou medicação duas vezes ao dia até o dia do parto. Os efeitos colaterais não eram tão fáceis de digerir: ela vomitava e tinha diarreia com frequência, e precisou de bastante repouso. Emagreceu seis quilos até o nascimento do filho.
Leia também
Primeira diagnosticada com HIV em Caxias do Sul optou por vida sem medicação
HIV cresce ano após ano entre jovens de Caxias do Sul
Laboratório em Caxias do Sul investiga avanço e estatísticas do HIV
No entanto, cumpriu com as orientações médicas e hoje faz os exames de controle que, até agora, indicam que o bebê de um ano e dois meses está livre do vírus. Ele tomou remédio nos primeiros meses e, agora, recebe acompanhamento mensal. O menino nasceu com 3,9 quilos e 48 centímetros, de cesárea.
– Meu marido assistiu à cesárea e diz que os médicos tiveram tanto cuidado que parecia que estavam cuidando de um tesouro. E claro que era – afirma Grasiele, que pretende manter a saúde em dia e encontrar um emprego no próximo ano.
Final feliz para Vicente
Aos quatro anos, o pequeno Vicente tem esbanjado saúde e vivido em um lar amoroso. Ele foi adotado com poucos meses pelo casal de caxienses Taís e Edemar em uma condição especial: a criança tinha 88% de chance de ser soropositiva. Abandonado pela mãe, o pequeno provou aos novos pais que, com boas doses de cuidado e carinho, é possível, sim, reverter a doença logo após o nascimento.
Vicente chegou à casa de Taís e Edemar no final de 2012, pouco depois de o casal conseguir engravidar de uma menina. Valentina e Vicente têm um mês e meio de diferença.
– Não esperávamos pela Valentina nem que fôssemos chamados tão depressa para a adoção. Mas como no formulário havia uma pergunta sobre doenças tratáveis, e a gente assinalou que sim, pode ter ajudado a ser mais rápido – acredita Taís.
Leia ainda
Mais de cem mil pessoas no Brasil vivem com HIV e não sabem, diz Ministério da Saúde
Você já parou para pensar nos riscos que corre de pegar Aids?
No RS, o índice de Aids é o dobro do restante do país
Mesmo que houvesse a chance de o menino ser soropositivo, entre o casal nunca existiu a possibilidade de devolvê-lo ao abrigo. O acompanhamento foi bastante rígido: aos quatro meses, Vicente tomou um coquetel chamado AZT por dois meses. Brinquedos, mamadeiras, chupetas e todos os objetos precisavam ser limpos e higienizados após o uso, para o bebê não correr nenhum risco de contaminação. O cuidado intenso garantiu a saúde plena do menino, que hoje está livre do vírus.
– Infelizmente houve preconceito, inclusive de alguns membros da família, criticando a adoção e a possível situação da doença. Mas isso ficou para trás. Ele tem até o olhinho puxado, como eu. É meu filho do coração – afirma Taís.
Números
:: O índice de transmissão do HIV de mãe para filho é de zero, segundo a Secretaria Municipal de Saúde.
:: Atualmente, 22 gestantes com HIV passam por tratamento em Caxias do Sul. Neste ano, já passaram por atendimento 30 mulheres nestas condições.
:: No cadastro da secretaria, há 56 crianças filhas de gestantes soropositivas que enfrentarão acompanhamento por dois anos, para certificar-se de que não estão contaminadas.
:: Nos dois últimos anos, apenas duas crianças com menos de dois anos contraíram HIV. Isto ocorreu porque a mãe contraiu o vírus após o parto e o transmitiu pelo aleitamento materno.
:: O número total de crianças infectadas, de 2 a 11 anos, chega a 22.