O Instituto Penal de Caxias do Sul, conhecido como albergue prisional, será interditado nos próximos dias. A representação do Ministério Público (MP) deverá ser oficializada até sexta-feira e a tendência é de que a juíza Milene Rodrigues Fróes Dal Bó acolha a decisão. O promotor João Carlos De Azevedo Fraga aguarda apenas por laudos necessários para comprovação da situação definida como "calamitosa".
Desde que foi inaugurado, em 2011, o abrigo do regime semiaberto em Caxias do Sul vem falhando na ressocialização. Também é usado pelos apenados como álibi para novos crimes: os detentos fogem por janelas dos fundos, passam horas na rua e retornam como se nada tivesse acontecido. A instituição é apenas mais um exemplo da falência do sistema de progressão de regimes no Estado, como apresentado na reportagens Sempre Aberto.
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Há dois anos trabalhando junto a Vara de Execuções Criminais (VEC) de Caxias do Sul, o promotor Fraga afirma que chegou a hora de tomar uma atitude enérgica para obrigar o Estado a cumprir seu dever.
– A realidade do semiaberto é terrível, a pior possível. Mesmo que a pessoa queira cumprir sua pena da maneira correta, ela simplesmente não consegue. Quem entra lá está em dívida por benefícios e negociações lá de dentro (no regime fechado). Ele precisa sair e cometer estes crimes para pagar estas dívidas. É o Estado reproduzindo a violência pelo sistema penal – aponta.
Em sua argumentação pela interdição, o representante do MP apontará a falta de agentes penitenciários, a incapacidade de ressocialização dos apenados e os problemas estruturais do albergue. No início da primeira quinzena do mês, o albergue abrigava 92 apenados. As medidas podem incluir a proibição do ingresso de novos apenados e o encaminhamento para prisão domiciliar de homens que já tem trabalho externo.
– Se fosse para seguir o manual de conduta, o albergue teria que ter dois agentes para cada 10 apenados. Ou seja, na situação atual, no máximo poderiam ser abrigados 40 pessoas. E temos mais de 80. O prédio não é concebido para dividir as facções (criminosas). O entorno virou um palco para assassinatos e tentativas homicídios no entorno do prédio do semiaberto. Vamos estudar estas medidas a partir de quinta ou sexta-feira – lista o promotor Fraga.
"A ressocialização é menos que zero"
A juíza Milene Rodrigues Fróes Dal Bó, titular da VEC de Caxias, demonstra sintonia com o trabalho do promotor Fraga. A magistrada aponta que a ressocialização é menor que zero, pois, além de não chegar a nenhum resultado prático, faz com que o apenado piore.
– Teoricamente, o regime semiaberto é muito interessante, pois permitiria ao apenado retomar o convívio social de forma cadenciada. Porém, na prática, reúne o pior dos dois mundos. A pessoa segue ligado ao universo carcerário e sofre as mazelas decorrentes. Possui dívidas e é pressionado a praticar novos crimes. Em liberdade (durante o dia), está suscetível à reiteração criminal, à violência policial e à própria violência de seus atos delituosos. Enfrenta todos os dissabores de estar solto e de estar preso – resume.
A titular da VEC tem conhecimento da pretensão do promotor Fraga e corrobora da opinião.
– Nosso promotor é muito sensível e lúcido sobre a situação carcerária. Em 99,9% das suas intervenções, costumo concordar na íntegra. Pelo que me antecipou sobre este tema, concordei com tudo. Precisamos esperar, mas é muito provável que eu acolha decisão – conclui a juíza Milene.