O próximo final de semana será marcado pelo início da Terceirona Gaúcha, tradicional torneio que concede duas vagas à Divisão de Acesso no ano seguinte. Dentre os clubes participantes, a competição tem um sabor especial a Associação Garibaldi de Esportes (AGE). Após alguns anos sem disputar competições profissionais, o time de Garibaldi retorna às atividades. E, em seu retorno, a equipe conta com um rosto conhecido do futebol nacional na casamata.
Pedro Iarley, ídolo do Inter, campeão mundial em 2006, será o técnico do clube na Terceirona Gaúcha. O ex-jogador colorado terá, na equipe da Serra, sua primeira experiência como treinador de um time profissional, algo que já era um sonho antigo, desde que pendurou as chuteiras.
— Era um desejo. Eu não tinha dúvida. Fui para o Inter trabalhar como coordenador técnico, mas, ao mesmo tempo, já estava me preparando, estudando, fazendo os cursos da CBF, juntamente com os treinadores, todos os dias, conversando, debatendo, tirando algumas dúvidas e me preparando para o momento em que eu fosse me lançar como treinador — relatou Iarley.
A CONCRETIZAÇÃO DO SONHO
A oportunidade para comandar o Garibaldi surgiu da relação de Iarley com Rogério Loss, presidente do clube, e Pedro Oliveira, um dos investidores. A relação do ex-meia colorado com os dirigentes começou a ser construída em um jogo beneficente. A partir disso, ele passou a frequentar eventos e torneios em Bento Gonçalves, estreitando ainda mais o vínculo entre as partes.
— Conheci uma gurizada que treinava aqui e, como eu tinha formação de treinador do Inter, comecei a dar algum suporte para o Pedro, que tinha a intenção de entrar no Garibaldi. E aí, quando eu me lancei como treinador, o Pedro vinha sempre me convidando: “Cara, tu tens que ser o meu treinador”. Eu ainda estava finalizando a licença A, estava com o foco muito grande nos estudos. Mas aí, ele fez um ultimato: “Não, cara. Tu tem que vir agora. Vai começar a Terceirona, a Copinha. Vem iniciar um projeto aqui com a gente”. E assim foi — conta o técnico do Garibaldi.
O início do trabalho como treinador no Garibaldi é, de fato, uma realização pessoal para Iarley. Porém, mais do que isso, é um momento especial para o clube também, que projeta aproveitar a disputa da Terceirona Gaúcha para revelar novos talentos. A participação do tradicional clube da Serra envolve, também, sonhos de muitos jogadores, além dos do novo treinador.
— Eu acho que é o que mais me move nesse projeto do Garibaldi. É ver muitos garotos que me lembram muito o meu início de carreira. Eu trouxe, para cá, o Wilson (auxiliar) e o Marcos Tavares (preparador físico), que são pessoas com muita capacidade de desenvolvimento pessoal. Não só do atleta, mas, também, do ser humano. E isso eu prezo muito — valoriza Iarley, que complementa falando sobre a tarefa de estruturar o clube:
— Você iniciar tudo do zero, montar um departamento de saúde, com fisioterapeuta, nutricionista. Um ajuste nessa parte estrutural do clube, porque você passa muito tempo sem participar de competições profissionais e, queira ou não queira, você perde um pouco do dia a dia e da funcionalidade que é um clube de futebol. E, como nós temos esse conhecimento, a gente está, aos poucos, implantando alguns processos que o clube não tinha. O futebol não deixa de ser caro. Revelar jogadores é caro.
Conforme comentado, o cenário que o novo treinador encontra no Garibaldi é muito semelhante ao que ele vivenciou quando começou no futebol. Sendo assim, Iarley conta sobre seu início na profissão e os tipos de desafios que teve de superar para construir sua vitoriosa carreira.
— O principal é você morar na sede, né? Tem toda uma situação que é prazerosa, porque você sai da casa dos seus pais. Mas, por outro lado, você sente muita saudade dos familiares. E você tinha tudo nas mãos. Roupa passada, limpa. Aí, você vai morar na sede e não tem nada disso. Então, você tem que se virar, tem que buscar e resolver esses problemas. E eu vejo muito eles ali. Se a gente passear ali, vai ter uma roupinha estendida, vai ter alguém guardando um lanche para depois. Mas o bom daqui é que o Marcos (preparador físico) é muito detalhista e a gente já pontuou algumas coisas. Uma melhoria, uma higienização do local. A gente é muito cuidadoso com isso.
O PROJETO DO GARIBALDI
Sobre o planejamento de montagem de elenco para a temporada, com a participação na Terceirona Gaúcha e, posteriormente, na Copa FGF, a diretoria do Garibaldi optou por dar oportunidade aos jovens de sua categoria de base. Porém, o clube contratou jogadores com bagagem, como o meia Diego Torres, ex-Caxias, para formar uma mescla entre juventude e experiência.
— A competição (Terceirona) pede isso. Ela não deixa de ser profissional. Depois, nós ainda vamos ter uma Copinha, que aí sim, já é uma competição com mais qualidade. A gente se preocupou em trazer jogadores experientes, com o perfil que a gente quer. E o Diego é um cara sensacional. Um cara que tem, também, o propósito de ajudar na formação desses atletas. Não só dentro de campo, mas fora. Então, a mescla por profissionais um pouco mais experientes é justamente para sustentar esses meninos, para que os jovens possam desempenhar seu papel e mostrar seu potencial — externou Iarley.
Tendo trabalhado por cinco anos na coordenadoria de base do Inter, de 2016 a 2021, o novo técnico do Garibaldi expõe as diferenças entre a maneira de treinar um time de base para um grupo profissional.
— O modelo é específico. Para cada local, existe uma determinada gestão. Então, a gente faz uma análise, primeiramente, do local em que a gente está inserido e, daí, faz um planejamento. Se fosse um time de Divisão de Acesso, seria uma abordagem. Se fosse um time de primeira divisão, seria outra. Já seriam outros conteúdos, seria um outro tipo de qualidade. Aqui, a gente tem que fazer tudo bem do início mesmo, até ensinar coisas que, de repente, você ensina em escolinha. Porque aqui, nós temos jogadores de 17, 19 anos. Não deixa de ser escola, não deixa de ser formação — avaliou Iarley.
REFERÊNCIAS
Durante sua carreira como jogador, o ex-meia passou por vários clubes de ponta: Inter, Boca Juniors e Corinthians são só alguns deles. A partir dessas vitoriosas passagens, Iarley conviveu e foi comandado por treinadores consagrados no futebol e, para esse seu novo desafio como treinador, ele absorve e aplica o conhecimento adquirido com cada nome, servindo como espelho e inspiração.
— Eu fui um abençoado no futebol. Eu tive Vicente Del Bosque, Carlos Bianchi, Abel Braga, Muricy Ramalho, Mano Menezes, Tite. São muitos tops, né? E cada um com perfil diferente, com algo que me chamava muito a atenção. Não só na gestão de vestiário, mas, também, nas partes táticas e técnicas. Então, tudo isso é uma mescla. Eu sou mais paizão, sou mais tranquilo, tenho as emoções mais controladas. Até falei aos atletas, no início do meu trabalho, que não iriam me ver gritando, mas eu sou firme com o que eu acredito, e a nossa relação tem sido muito prazerosa — comentou.
MODELO DE JOGO
A partir do que lhe foi passado durante sua carreira como jogador pelos nomes citados, Iarley desenvolveu um estilo de jogo que mais lhe agrada. Porém, por conta das características da Terceirona Gaúcha e das condições climáticas e dos gramados, o comandante do Garibaldi relata que o modelo será adaptado de acordo com o que lhe é apresentado.
— Aqui, a gente tem que ter em conta a situação do gramado, do clima. Então, é muito peculiar. É muito da região mesmo. Nós vamos estar com o campo mais molhado, mais embarrado, com chuva, frio. Então, vai ser um futebol mais pragmático mesmo, de confronto. Daqui a pouco, um futebol um pouco mais direto. Você não consegue ter uma posse de bola, sair jogando desde trás. A gente tem que respeitar tudo isso. Eu não posso chegar aqui e falar: “Galera, nosso modelo hoje é posse de bola.”, e aí o campo não te dá essa condição de você trocar três passes. Então, a gente vai simplificar.
A REESTREIA AO FUTEBOL PROFISSIONAL
A Terceirona Gaúcha inicia neste domingo (3), às 15h, para o Garibaldi. Em casa, no estádio Alcides Santarosa, a equipe recebe o Gramadense, outro representante da Serra na competição. Às vésperas da estreia, Iarley falou sobre as expectativas sobre o desempenho do clube no torneio.
— Sempre falo que a gente nunca pode entrar em uma competição sem ir em busca do principal objetivo. A gente vai buscar situações para tentar colocar esses jovens para aparecer. É muito melhor você revelar subindo, revelar vencendo. Só que eu também sou consciente e falo para os meus dirigentes que é muito importante a gente estruturar o clube para, depois, pensar em objetivos maiores. Hoje, o Garibaldi está tendo um apoio muito bacana da comunidade. Então, quem sabe, daqui para frente, a gente tenha condições de pensar em coisas maiores. Brigar por acesso, subir, ir para a Divisão de Acesso e, quem sabe, em um futuro próximo, ir para a primeira divisão.
BASTIDORES DE 2006
O sonho para conquistar esses "objetivos maiores" é, diariamente, alimentado pelos jovens atletas do Garibaldi, através de Iarley. Campeão mundial em 2006 com o Inter, diante de um - até então - invencível Barcelona, de Ronaldinho Gaúcho, o treinador da equipe da Serra pinça as experiências vividas em Yokohama para fazer um comparativo com a realidade atual e inspirar o elenco.
— A gente tira algumas lições de que nada é impossível. A gente tenta vender para eles uma realidade, mas que eles têm que acreditar que é possível chegar. A gente tem que formar, aqui, um grupo unido, porque as condições de trabalho que a gente tem aqui são boas. São melhores do que as que eu tive quando comecei, por exemplo. União de grupo, superação, isso tudo o nosso time de 2006 fez. Jogar contra o Barcelona com estratégia. A minha estratégia de segurar a bola. Isso tudo é o que eu vendo para eles aqui. Eu falo que a gente tem que ser unido, tem que ter estratégia para jogar num campo desses, tem que ter superação, porque não vai ser fácil. Então, tem tudo a ver, né? — disse Iarley.
E por falar em futuro, Iarley já prospecta uma carreira vitoriosa como treinador, repetindo o que fez quando foi jogador. O novo técnico revela seus objetivos na profissão:
— A gente tem que sonhar grande. E o meu sonho é ser treinador de primeira divisão, isso é muito claro. Estou iniciando lá embaixo, no início, para afiar algumas coisas. Eu preciso ter essa certa experiência para, quando eu chegar lá, não bater e voltar, mas bater e ficar — finalizou.