ESPECIAL SILVIA DALCIN DALMAS - A jornalista é barbosense e foi passar três meses na Jordânia para aprender árabe, antes de ir à Palestina – onde vive hoje –, para atuar num campo de refugiados.
Uma cultura misteriosa, um idioma completamente diferente e novas histórias para contar fazem parte do cotidiano de Joel Cornelli, 52 anos, desde julho de 2019. Na ocasião, ele aceitou o convite para trabalhar como técnico de um time de futebol da Jordânia e, desde então, passou a viver na capital, Amã. A mais de 11 mil quilômetros de casa, ele conta um pouco mais sobre essa nova experiência.
Cornelli nasceu em Encantado, mas sua família mudou-se para Caxias do Sul quando ele tinha seis anos. Sua história no futebol começou no Caxias, onde trabalhou por 20 anos, jogando em todas as categorias, até ser assistente do técnico Tite ( quando conquistou o título de campeão gaúcho no ano 2000). Logo após, ele mesmo assumiu a posição de treinador. É casado com a pelotense Mauren Cornelli, com quem tem duas filhas – uma vive no bairro Bela Vista, a outra em Dublin, na Irlanda.
– Já morei em muitas cidades diferentes, em função do trabalho, mas Caxias do Sul é a minha casa. Sou caxiense de coração. Tenho muito orgulho da minha história no Caxias, devo muito ao time pela minha formação, especialmente em relação ao trabalho com o Tite, que vai ficar na história. Sou torcedor do time até hoje – conta.
O convite para deixar Caxias, por várias vezes, é tido com naturalidade. Em algumas delas, precisou viver em um país com cultura e religião completamente diferentes e costumes intrigantes. Nada disso foi um problema para Cornelli, que conta que a nova rotina na Jordânia o surpreendeu positivamente.
Ele afirma que não sente grandes diferenças em relação ao trabalho no Brasil – exceto pelas reuniões da diretoria, em que os árabes fazem questão de fumar muito narguilé e cigarros, mesmo em ambientes fechados:
– Os hábitos e costumes são semelhantes a outros países árabes, mas vejo a Jordânia como um país bastante aberto. Fiquei chocado, mas de maneira positiva. Não vejo fanatismo, ou preconceito com outras religiões. Nunca me senti rejeitado por minhas crenças ou origens.
Essa, aliás, não é a primeira experiência do técnico em países árabes. Ele já havia trabalhado antes nos Emirados Árabes, no Al Ain e no Al Shabab – foi assim que surgiu o convite para trabalhar em Amã, treinando a equipe Six Yard.
Isso tornou a adaptação com o clima e o idioma muito mais fácil.
– Os Emirados são mais artificiais, pois tudo foi construído em um deserto. Aqui, não. É uma cidade com milhares de anos de história. Além disso, a paisagem natural é linda. Tem montanhas, rios, deserto, mar, até mesmo neve – conta.
NO MEIO DO CONFLITO
A Jordânia está localizada no centro do Oriente Médio, fazendo divisa com Líbano, Israel, Palestina, Iraque, Síria e Arábia Saudita. A localização, talvez, cause um pouco de medo, mas a sensação de estar no país é justamente contrária, diz Cornelli. O local é seguro e pacífico:
– Não tem guerra no país. O dia a dia é muito tranquilo. Não vejo assaltos ou violência. Me sinto mais seguro aqui do que no Brasil, saio na rua em qualquer horário do dia – afirma, dizendo que, apesar disso, a tensão recente com o Iraque o tenha assustado um pouco.
Lá, cerca de 90% das pessoas seguem a religião muçulmana, então o chamado para orar soa cinco vezes por dia. O consumo de álcool ( embora alguns muçulmanos o façam) e da carne de porco são proibidos. A maioria das mulheres muçulmanas ainda usa o véu, mas não é obrigatório por lei.
– Nos Emirados, o treino para nos horários da prece e todos os atletas rezam. Aqui, não. Mas eles têm muito respeito pela sua religião e tentam manter a sua cultura, o que eu vejo como outro ponto positivo – afirma.
O técnico conta que, nas horas livres, gosta de passear pela cidade, ir ao cinema e aos shows de artistas locais.
Para Cornelli, a parte mais difícil foi em relação ao trabalho em si. Mas pelo fato de não estar mais acostumado a trabalhar com jovens, não por causa do idioma:
– Aqui todos falam inglês. Sei algumas palavras básicas em árabe, mas meu auxiliar é também meu intérprete, então ele traduz para os atletas.
Seleção feminina é melhor do que a masculina
A equipe Six Yard, treinada por Joel Cornelli, ainda está em fase de formação, assim como o futebol, de modo geral, na Jordânia. A liga profissional conta com 13 equipes, mas nenhuma se destaca no continente.
A seleção do país tampouco tem reconhecimento nessa área, já que nunca disputou uma Copa do Mundo e está muito abaixo no ranking, até mesmo em comparação com outros países árabes.
– O objetivo aqui é formar atletas, estruturar o time para jogar na liga profissional, que começa em março, e, é claro, empregar as técnicas brasileiras – relata o técnico.
Apesar do mau desempenho atual no cenário internacional, Cornelli vê muito potencial no país:
– O futebol aqui ainda está engatinhando, mas a qualidade dos jogadores locais é melhor do que em outros países árabes. O que falta é trabalho, metodologia e planejamento para que jogadores possam se destacar.
O Oriente Médio agora vive a expectativa da Copa do Mundo no Catar, em 2022, e isso também cria um cenário otimista, na opinião de Cornelli. Ele acredita que o evento tonará o futebol mais popular no continente asiático e, assim, atrairá mais investimento das empresas privadas.
Quando se trata da seleção feminina, porém, o cenário é diferente:
– A seleção feminina daqui é muito melhor do que a masculina. Está mais bem colocada nos rankings.
Um país de paisagens cinematográficas
Dizer que a Jordânia tem paisagens de cinema não é exagero. De fato, Petra ( do grego, pedra) foi um dos cenários do filme Indiana Jones e a Última Cruzada ( 1989), e o deserto de Wadi Rum serviu de locação para os filmes Lawrence da Arábia ( 1962) e do mais recente Aladdin ( 2019). Devido à beleza dessas paisagens, combinado aos fatos históricos, o turismo hoje se tornou a principal fonte de renda do país. Mas a importância de Petra vai muito além de ser cenário de filmes.
A história da“ cidade rosa” começa em 312 a. C., quando era a capital dos nabateus, uma tribo nômade árabe. Foram eles que esculpiram as impressionantes tumbas nas rochas. A cidade serviu como rota comercial estratégica entre Ásia e Europa para o transporte de seda, incenso, mirra, entre outras especiarias.
Depois de ser dominada por bizantinos, romanos e hebreus, ficou esquecida no tempo por séculos, pois somente os beduínos sabiam sua localização exata. Em 1812, o suíço Johan Ludwig Burckhardt a redescobriu e até hoje os arqueólogos não decifraram todos os seus segredos, já que apenas metade do território foi explorado.
O templo mais conhecido é Al Khazneh ( o Tesouro, famoso pela cena de Indiana Jones), mas o sítio arqueológico tem 264 metros quadrados, contando com teatros criados pelos romanos, cisternas da época dos nabateus, tumbas, trilhas entre as rochas e o impressionante Monastério, que se encontra ao final do parque. Sendo assim, para desbravar a fundo o local, são necessários pelo menos dois dias. Também é possível tirar algumas horas para descansar e tomar um chá com os beduínos, enquanto você conversa e aprende mais sobre a cultura local.
SAIBA MAIS
Como chegar Não há voos diretos do Brasil para a Jordânia. Quem optar pelo trajeto aéreo terá de fazer ao menos uma conexão na Europa ou Oriente Médio. A capital é Amã, que fica a três horas de Petra ( na cidade de Wadi Musa).
Brasileiros precisam de visto de turismo para a Jordânia, que pode ser obtido diretamente na chegada ao aeroporto.
CURIOSIDADES
Petra é considerada Patrimônio Mundial da Unesco desde 1985 e, desde 2007, foi incluída na lista das Sete Maravilhas do Mundo. Depois de 1985, o governo da Jordânia construiu habitações para realocar todos os beduínos que viviam nas cavernas de Petra. Hoje, eles vivem em uma vila há poucos metros do parque, chamada Um Sayhoun. A cidade já sobreviveu a dois terremotos.
Outros locais para visitar no país
Mar Morto, Jerash, cidadela de Amã e Wadi Mujib.
Site oficial
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