– Ele é muito estratégico nas palestras, funciona muito bem. Quando saímos da concentração para a decisão contra o Grêmio, cumprimentei ele na saída do hotel: “pode saber, você botou fogo nos olhos deles (jogadores)”. Até hoje, acho que o 3 a 0 foi pouco.
Essa é a definição de Alceu Fassbinder, vice-presidente de futebol do Caxias no ano de 2000, sobre Adenor Bachi. O episódio relatado ocorreu no dia 14 de junho daquele ano, quando Tite e seus comandados garantiram o maior título da história grená, numa noite memorável.
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Gil Baiano, aos 44 minutos do primeiro tempo, de cabeça, Ivair, aos três do segundo, em cobrança de falta, e Márcio Hahn, aos 22 do segundo, em um chutaço, fizeram os gols de um jogo que sobrevive na memória dos grenás. Uma semana depois, Gilmar Dal Pozzo ainda segurou o Grêmio e Ronaldinho para coroar um ano árduo de trabalho e que seria o pontapé inicial para que a carreira de Tite decolasse.
– É o melhor treinador que tem aí. Ele sabe fechar o vestiário como poucos. Sabe ganhar o grupo como poucos. Essa é a sua grande virtude. Além de ser um profissional estudioso e preparado, Tite sabe lidar muito com o psicológico do grupo. Só não ganha se der azar numa decisão, mas acho que o Brasil é um dos favoritos – aposta Fassbinder sobre a Copa da Rússia.
O ex-vice de futebol do Caxias conhece bem o técnico. Foi ele quem deu a primeira oportunidade para Tite como treinador do clube, em 1991. Fassbinder conta que foi até o apartamento do treinador para contratá-lo.
– Gostei dele. Tinha visto trabalhar na Segunda Divisão num jogo em Garibaldi. Ali, fixei a ideia de que era um profissional promissor – relembra.
Não deu certo naquele primeiro momento e Fassbinder foi novamente ao apartamento de Tite, 11 jogos após a contratação, para desligá-lo do clube. Porém, a demissão seria na verdade um até breve. Mais preparado, em 2000 Tite fez história.
Reviravolta de 2000
Tite passou por inúmeros clubes até reassumir o Caxias em 1999. Esteve, inclusive, no Juventude, dois anos antes. No retorno ao Centenário, iniciou a montagem de um grupo de jogadores que entraria para história no ano seguinte.
Fassbinder voltou ao futebol do clube no início de 2000, quando o Caxias não vivia um grande momento. Faltava dinheiro para os salários, alimentação e até a infraestrutura básica. A classificação ao octogonal final se deu graças a uma vitória do Esportivo sobre o São José-PoA porque a campanha grená foi irregular.
Com um esforço de toda a direção, o Caxias sanou as pendências. Fassbinder conta que contratou jogadores com dinheiro do próprio bolso – o que foi ressarcido depois – e bancou inúmeras situações dentro do Centenário. Dentro de campo, confiou no trabalho de Tite e na palavra dos jogadores, que alegavam atravessar um mau momento e afirmavam que a culpa não era do treinador.
– Eu recebi carta branca da direção se eu quisesse liberar o Tite. Ele estava bem, os jogadores também, o que faltava era qualidade no grupo e condições materiais. Isso foi providenciado, com esforço do presidente Nelson D’Arrigo e da direção – recorda Fassbinder.
Foram contratados o atacante Jajá, o zagueiro Rafael Carioca, os meias Luciano Araújo, Márcio Hahn e Moreno. Tudo se encaixou. O time fez um primeiro turno espetacular no octogonal, ganhando jogos importantes e conquistando o título com um 2 a 1 sobre o Grêmio, no Olímpico.
Na segunda parte da competição, o time oscilou e ficou exclusivamente pensando na final. Nos dias 14 e 21 de junho, Adenor Bachi dava o grande passo para decolar sua carreira. Foi campeão estadual. Com o ex-dirigente grená, segue a amizade e a gratidão.
– Ele foi compreensível e profissional (na campanha grená de 2000). Amadureceu muito depois e confirmou tudo que se pensava dele. Quando o Grêmio o contratou, eles acabaram me consultando e eu respondi: “ele está pronto” – fecha Fassbinder.
Campeões no Whatsapp
A foto e a nominata deixam qualquer torcedor grená emocionado. Com 20 integrantes, somados atletas, dirigentes e integrantes da comissão técnica, o grupo de Whatsapp Eternos Campeões foi a forma encontrada pelo ex-volante e hoje empresário Rogério Messias, conhecido no mundo da bola por Titi, para resgatar momentos importantes de um time campeão.
– É uma vontade do Adenor, do Tite, que a gente se encontre no final deste ano. Estamos fazendo uma força-tarefa e 60 ou 70% do grupo está ali no whats para a gente resgatar. É uma forma de demonstrar também essa união que tínhamos em 2000. A alegria de quando criei o grupo foi muito satisfatória para todos. Apesar de ter passado 18 anos, as lembranças são muito vivas – destaca o ex-jogador.
– Claro que não nos falamos todo dia, mas recordamos algumas situações, as lembranças boas daquela época. Ele (Tite) continua a mesma pessoa, na humildade principalmente. Existe a gratidão pelo começo de tudo, em 2000 – complementa o ex-volante Márcio Hahn.
Titi e Márcio foram peças decisivas para o Caxias de 2000. O primeiro já tinha sido campeão catarinense pela Chapecoense, vencido um título nacional pelo Avaí, mas diz nunca ter trabalhado em um grupo tão fechado e preparado para uma conquista.
– Quando questionado, costumo dizer que, 18 anos atrás, o Tite já era como se apresenta hoje. Ele sempre foi uma cara acima da média, um gestor de pessoas. Naquele momento, em 2000, ele precisou mostrar isso. Foi realmente vendida uma situação de o Caxias ter um grande patrocínio, mas acabou não saindo. E isso fez com que se criasse uma saia justa. O Tite teve que gerir um grupo com três meses de salário atrasado, algo que todos sabem. A diretoria tentava honrar com o que era possível, mas foi o Tite quem liderou esse processo – comenta Titi.
Na época, Márcio Hahn ainda era um garoto que buscava o crescimento profissional. Oriundo do Mogi Mirim-SP, ele chegou ao Caxias e logo se surpreendeu com a forma como o treinador motivava seus atletas.
– O que me marcou bastante foi quando eu e o Moreno chegamos do Mogi. Nas palestras ele costumava fazer um U, em forma de ferradura. Eu não estava acostumado. Os caras me avisaram, mas quando ele chegou perto de mim, deu dois tapas no meu peito e aqueles gritos de incentivo. Quase caí para trás. É algo que ele mantém até hoje. O mesmo ocorre na saída do túnel, de cumprimentar todos jogadores – relembra.
Motivação antes da final
O desafio na decisão estadual de 2000 era gigante. Por mais que os 3 a 0 na partida de ida oferecessem uma vantagem imponente, era preciso confirmar o resultado em Porto Alegre. E, no dia do jogo, uma atitude da comissão técnica ficou marcada na memória dos atletas.
– Na final do campeonato, acordamos no Ninho do Falcão, na concentração, e em cada quarto tinha uma carta escrita pelas nossas famílias. Lembro que na minha, da minha esposa e filha, dizia assim: “Pai, independente do resultado, você já é o nosso herói. Por tudo o que você já fez até hoje, passando por várias situações, és nosso exemplo. Estamos contigo até o final”. Isso aí, antes do café da manhã, no dia da decisão, me deixou querendo demais. Eu e todos os companheiros. Não podia ver ninguém de azul na minha frente. Queria o Grêmio naquela hora. O Tite sempre soube mexer muito conosco. Saímos da preleção com uma gasolina azul. Todos admiravam muito o Adenor e o grupo estava nas mãos dele – recorda Titi.
Márcio Hahn, que era reserva na primeira partida da decisão e entrou para marcar o terceiro da goleada sobre o Tricolor, reforça a questão do trabalho do grupo, sem priorizar os titulares.
– O Tite sempre passou uma confiança muito grande. Colocava todo dia que poderíamos, pela força do grupo, chegar longe. Eu não era titular e entrei na primeira partida da final para fazer um dos gols. Depois, fui titular em Porto Alegre. Um dos principais fatores no futebol é a gestão do grupo. O carisma do Tite faz a diferença. Não tem quem tenha trabalhado com ele que não goste do cara. Posso falar por 24 horas e não acharei palavras para descrevê-lo – define Márcio.