Como dizem no vocabulário popular: poderá ser uma “indiada”. Mas para o seu Paulo Neri Sales da Silva, aos 61 anos, percorrer os 81,4 km da Travessia Torres-Tramandaí, a maior prova de corrida do Rio Grande do Sul, que ocorre neste sábado, é um desafio instigante.
– Quem está fora questiona: para quê ter isso no currículo? Quem corre, sabe que é uma questão de orgulho – afirma ele.
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A história de amor pela corrida de rua começou por um problema de saúde. Uma doença nos rins levou o corredor a fazer 90 dias de hemodiálise, somados a muitos remédios. Pesando 98kg na época, Seu Paulo buscou no esporte uma mudança de vida.
Ele começou na academia do Recreio da Juventude e lá conheceu o professor Diego Menegassi. Na esteira, começou a surgir um estímulo para a corrida. Quando essa vontade conheceu a rua, virou paixão. E se tornou um amor quando Paulo entrou para o grupo de corridas do clube, que hoje tem 92 atletas.
– A corrida significa uma conquista pessoal muito grande e um relacionamento social maravilhoso. Imagina um velho no meio de uma gurizada jovem. Agradeço a eles por me aceitarem ali no meio – conta Paulo.
Desde o momento de ingresso, o corredor vem evoluindo.
– É surpreendente a evolução do Paulo. Ele nunca tinha corrido, começou com o estímulo da esteira e depois foi para a rua aumentando a distância gradualmente até chegar numa ultra. Ele evoluiu muito rápido – opina o professor Diego Menegassi.
Dos octetos até a prova solo
Os primeiros cinco quilômetros de corrida do Seu Paulo foram em Porto Alegre, em 2012. Desde então, os metros vão aumentando a cada passada. Entre as duas caixas de medalhas que tem em casa, a mais emocionante até hoje foi a Maratona de Porto Alegre, em 2016. E lógico, as participações na prova do litoral gaúcho.
– No ano passado, fiz a TTT em dupla. Esse ano não tinha mais o que fazer. Já fiz octeto, quarteto e dupla. Faltava a solo. Para quem corre, sabe o quão importante é – conta Paulo.
Só que dar este passo a mais, unem-se a vontade e uma dose de loucura.
– Se é para um guri, tudo bem. Agora que está chegando mais perto da prova estou ficando com medo. Estou representando o grupo que eu amo, o clube. Achava que conseguia, treinei para isso e agora estou consciente do que tenho que fazer. Agora é psicológico – opina o corredor.
O ano de treinamento também não foi fácil. Uma lesão no joelho atrapalhou. Tanto que seu maior percurso foi de 38 km, pouco menos de 50% da prova. Mas uma notícia foi ainda pior. Sua esposa, Dirce Tedesco da Silva, morreu em dezembro.
– Minha falecida esposa não acreditava que eu ia fazer (a prova). Ela faleceu agora em dezembro e disse que eu iria morrer antes que ela, fazendo a TTT. Agora farei em homenagem à ela – conta Paulo.
Todos os percalços deixaram o corredor mais forte. Paulo é um exemplo de persistência, amor e foco num objetivo.
Com 3,2 mil participantes
A TTT é a principal ultramaratona do Rio Grande do Sul. Isso se expressa em números, afinal serão 3.200 atletas percorrendo o litoral norte gaúcho. Além da corrida solo, ainda existem as modalidades em equipes: duplas, quartetos, octetos e octetos masters.
Só de Caxias do Sul serão mais de 10 times, além dos corredores avulsos, ultrapassando o número de 400 pessoas da Serra na prova. Para quem estiver no litoral, não estranhe as várias barracas e os pontos de hidratação, praticamente a cada 2,5km.
A movimentação será intensa. A partir das 5h, as areias de Torres já estavam cheias e por cerca de 10 horas subsequentes, até a chegada em Imbé, haverá muitos corredores no percurso. Todos enfrentando dois inimigos comuns: o clima e o cansaço.
– Os organizadores pedem quanto tempo você vai precisar para fazer os 81,4 km. Ao mesmo tempo, não fornecem informações sobre a maré. Onde vai estar, nas dunas ou mais recuada? Vai chover no dia ou ter ásol? Vai ter o Nordestão (vento)? A dificuldade é o clima. É uma corrida com desgaste grande e que muitos sonham em fazer. Porém, poucos conseguem. Espero estar nesse grupo que termina a prova – avalia Paulo.