Teti escolheu o esporte. Ela preferiu o futsal feminino, mas poderia ter seguido outros caminhos na vida. Não por ter nascido e crescido na periferia de Caxias do Sul, mas é que as escolhas erradas não são determinadas por classe social ou local.
Ketlin Borges cresceu na comunidade ao lado do Estádio Centenário. Você pode chamar de Vila do Cemitério ou qualquer outra denominação pejorativa, mas Teti chama o bairro Euzébio Beltrão de Queiróz de casa. E foi saindo de casa que Teti foi convocada para a seleção brasileira e voltou com o título de campeã mundial de futebol de salão clássico.
— Ver a emoção da minha mãe e da comunidade onde me criei não tem preço que pague. Ver eles felizes e me mandando mensagens foi incrível — comemora a jogadora.
A conquista, que ocorreu na Espanha, no final de novembro, foi a consagração de um ano que parecia perdido para Teti. A atleta de 24 anos era um dos destaques da MGA Games. A equipe caxiense abandonou a disputa do Campeonato Gaúcho de futsal por falta de recursos após não receber a verba do Fiesporte.
A ala/pivô teve que deixar a cidade rumo ao ADTB, do Paraná. Porém, ela não esconde a tristeza com o fim do time que foi bicampeão estadual:
— Quando acabou a MGA fiquei decepcionada, arrasada. Foi a equipe que meu deu a base que eu precisava. Até pensei em desistir. Eu faria tudo para manter aquele time. Lá eu estava em casa. E quando acabou achei que não dava mais. Quando chegou a proposta do Paraná pensei muito, mas fui. E foi chegando lá que tudo começou a andar.
A ida para a seleção de futsal clássico foi uma surpresa para Teti. Até então, ela nunca havia jogado na modalidade que difere do futsal que ela praticava tradicionalmente. As diferenças estão nas cobranças de laterais e escanteios, que são feitas com as mãos, e no tempo para ultrapassar o meio-campo — 15 segundos a partir da saída de bola.
— Eu pensei: Será que consigo? Mas o técnico (Anderson Oliveira) disse “tu consegues. Teu futebol é muito grande e tu és esperta”. Quando cheguei lá e ele me colocou para jogar, só queria dar o meu melhor. E não errei nenhuma vez. Até me surpreendi como me adaptei rápido — lembra.
A ida para Balaguer, na Catalunha, foi a primeira experiência de Teti fora do país. A menina do Beltrão de Queiróz teve que enfrentar gente de todo o mundo. Pelo caminho, ficaram taiwanesas, suíças, catalãs e as colombianas, campeãs do mundo em 2013, na semifinal. A vitória brasileira garantiu a vaga na decisão. No duelo final, contra a Argentina, nova vitória por 5 a 2 e título para o Brasil
Reconhecimento e esperança no futuro
A notícia do título mundial de Teti correu a cidade. Além das páginas do Pioneiro, na época, a conquista se espalhou pelas redes sociais. Ainda sem saber como reagir ao reconhecimento, Teti lembra do retorno à Caxias:
– Fui em uma loja e teve um rapaz que me parou e me chamou de seleção. Tomei um susto, porque eu não o conhecia. Fiquei com vergonha por não poder dar um abraço nele, ou de como dar um abraço.
Ainda com contrato com a equipe paranaense, a caxiense lamenta a falta de apoio na cidade para que o futsal feminino tenha continuidade.
– Em Caxias falta o futsal feminino ser mais valorizado. Tem tanta menina boa aqui. Chega a ser injusto não ter nenhum time da cidade representado no Estadual. É um pecado elas não estarem jogando o Gaúcho. Tem a Renatinha (Adamati, que joga na Itália), a Diana (Santos, campeã brasileira com as Leoas da Serra-SC e da Copa América com o Brasil) e eu. São três meninas de seleção que saíram daqui – diz Teti, emocionada ao lembrar o que representa sua conquista para as pessoas que a acompanham desde o início:
– Não tem preço ver minha comunidade me abraçando e me fazendo estrela de uma favela. Tenho orgulho de onde eu vim. De poder mostrar para aquelas crianças que elas podem ser alguém. Eu quero ser o exemplo para elas. Quando cheguei lá fizeram uma festa surpresa para mim. Chorei bastante quando vi minha mãe chorando. Era um sonho meu, mas dela também. Ela sempre acreditou em mim. Disse que eu iria vencer. E venci.