Um prato de origem europeia, criado para aquecer e nutrir camponeses, se tornou, nos últimos tempos, o carro-chefe de restaurantes da Serra no inverno. Com sequência salgada e doce, servido de forma farta e geralmente harmonizado com vinho, o fondue é capaz de triplicar o movimento e gerar fila de espera em estabelecimentos ouvidos pela reportagem nas estações mais frias do ano.
Reduto do prato na Serra, a Região das Hortênsias conta com pelo menos 70 restaurantes que servem fondue, segundo estimativa do Sindicato da Hotelaria, Restaurantes, Bares e Similares da Região das Hortênsias (Sindtur Serra Gaúcha), que abrange Gramado, Canela, Nova Petrópolis, Picada Café e São Francisco de Paula.
Basta uma breve pesquisa no Google para entender a vocação, principalmente de Gramado e Canela, na produção da iguaria. São inúmeras as opções que aparecem nos resultados da página online, com diferentes avaliações e preços.
— O fondue faz parte da nossa culinária e da nossa cultura. É muito importante não só no inverno, como durante todo o ano. Muitos turistas chegam aqui perguntando e querendo entender o prato, porque nós que estamos aqui e conhecemos sabemos como funciona uma sequência de fondue e imaginamos que todos saibam, mas muitos dos que chegam não conhecem, é novidade. E eu entendo que é uma experiência muito bacana para todos que nos visitam — opina o presidente do Sindtur, Claudio Souza.
Na região, uma sequência tradicional do prato costuma contar com carnes, queijo e chocolate (esses dois mantidos aquecidos e derretidos em acessórios próprios sobre a mesa dos clientes), mas também há variações com camarão, leite ninho e doce de leite, por exemplo. Os valores, em média, partem de R$ 110 por pessoa.
De onde vem o fondue?
O professor do curso de Gastronomia da Universidade de Caxias do Sul (UCS) Gustavo André Ruffato conta que o fondue tem origem na Suíça, em um prato muito menos sofisticado e gourmet do que o que é oferecido hoje em dia nos estabelecimentos da Serra.
— Os camponeses aproveitavam os pedaços de queijo e derretiam com vinho e, então, era comido com pão. No início, era uma forma de se ter um prato nutritivo e que também trouxesse uma questão de aconchego, aquecimento — conta o docente.
As variações cruzaram fronteiras, ganhando novos e elaborados ingredientes. Na região, na opinião do professor, houve um forte apelo turístico e comercial em torno do prato a partir das baixas temperaturas:
— O cardápio que a gente consome entre inverno e verão são totalmente diferentes. No inverno, queremos algo que nos aqueça, que traga um conforto, como o fondue. Já no verão, trabalhamos muito saladas, coisas frias — sinaliza Ruffato.
"Qualquer aviso de neve ou geada, a procura mais que dobra", revela proprietário de restaurante no Vale dos Vinhedos
Localizado no Vale dos Vinhedos, em Bento Gonçalves, desde 2017, o Restaurante Chamonix tem a alta temporada entre os meses de abril e agosto. Na opinião dos proprietários, Fernando Henrique Lima Batista e Thalita Abrantes Moreira, é o frio, aliado à vocação vitivinícola da região e as férias escolares de julho, que torna o prato mais procurado neste período do ano.
O casal é de São Paulo e encontrou na Serra o lugar ideal para empreender em um ramo fora da profissão original de ambos, que é a engenharia civil.
— O inverno é o forte porque as pessoas vêm aqui à procura do vinho. E vinho é muito mais agradável você tomar no inverno. Além disso, qualquer aviso de neve ou geada, a procura mais que dobra — revela Batista.
— Como não somos daqui, sabemos como é o olhar dos turistas para o Rio Grande do Sul. As pessoas vêm para passar frio, querem sentir a experiência e apetece muito mais comer um chocolate, um prato quente — acrescenta Thalita.
A demanda pelo alimento também cresce exponencialmente em datas comemorativas, como o Dia dos Namorados. O casal conta que as reservas para a noite romântica se esgotam até três meses antes e a alta procura exige uma logística especial de atendimento: o restaurante oferece três rodadas de jantares, conseguindo, assim, atender até 240 pessoas na data — o estabelecimento tem capacidade para 80 clientes simultaneamente.
— Neste ano, por conta das chuvas de maio, foi atípico. Lotamos, mas as reservas esgotaram apenas duas semanas antes — salienta o proprietário.
Outro fator observado pelos empresários é uma mudança no perfil dos clientes conforme os meses do ano. Batista explica que nas estações mais frias o Chamonix costuma receber famílias e grupos, enquanto que em outros períodos do ano os casais predominam.
O ambiente, com decoração acolhedora, oferece as versões doce, com leite ninho ou com chocolate puro, e salgada, com queijo gruyère, além de carnes e camarões, por exemplo.
Estabelecimento de Caxias amplia em 30% o número de lugares no inverno
Foi uma pesquisa de mercado, cujo resultado apontou para uma carência na oferta de fondues na cidade, que motivou a abertura do Arcanjo Restaurante há nove anos, em Caxias do Sul. De lá para cá, a casa se tornou referência no prato no município, mudou de endereço para acomodar melhor a clientela e passou a abrir de domingo a domingo diante do aumento da demanda. Hoje, também há opção de delivery, na qual o consumidor recebe o fondue pronto para comer em casa.
— Naquela época, o fondue era servido em alguns hotéis, mas sazonalmente, entre junho e julho. Hoje, é o nosso carro-chefe, servimos todos os dias do ano, inverno e verão. No frio, nosso movimento triplica — conta a proprietária, Viviane Smiderle.
O próprio salão do estabelecimento é reconfigurado para acolher mais pessoas no outono e no inverno, ampliando em 30% o número de lugares em relação aos dias de temperatura amena e de calor. Uma parede móvel também permite que o espaço se adeque para receber formaturas, casamentos e outros eventos simultaneamente aos atendimentos tradicionais.
Para Viviane, oferecer a sequência de fondue em um evento como uma formatura, embora ainda não seja tão comum, representa um diferencial, que costumeiramente é elogiado e lembrado pelos convidados.
— A grande maioria das pessoas que vêm em formaturas, em aniversários, nunca comeu fondue. Ainda é uma novidade, e quem come se surpreende. Recebemos grandes comentários quando chegam no caixa — orgulha-se Viviane.
A proprietária ressalta que a localização ao lado de um hotel também contribui para atrair turistas de negócios, que estão na cidade de passagem rápida e buscam facilidade e qualidade na refeição.
— Durante a semana, atendemos representantes comerciais, vendedores que vêm visitar os clientes e jantam conosco, porque o fondue é algo que eles não comem sempre. Nos finais de semana, nosso público é mais da região e de Porto Alegre — conta a empreendedora.
Experiência é o diferencial para empresário de Gramado
Não estranhe se, ao visitar ou contatar o Castelo Landelom, em Gramado, você for chamado de "vossa majestade". É que, além de oferecer uma sequência de fondue, o restaurante temático propõe que cada cliente viva uma experiência diferente.
Isso significa ser "coroado" ao entrar pela porta do estabelecimento e também assistir a um espetáculo teatral durante o jantar. Além disso, toda a estrutura é decorada e planejada como um castelo, fazendo com que os clientes se sintam na época medieval.
— Vamos para o lado do humor, com o Bobo da Corte, para as batalhas, com lutas medievais aqui dentro. Também temos danças, com camponeses e as bruxas. Estamos bem engajados para oferecer a melhor experiência possível — ressalta o proprietário, Fernando Monteiro.
O "banquete" oferece fondue com queijo e acompanhamentos como pão, batata, polenta frita e minimilho. As carnes, na pedra, são servidas com 15 tipos de molho e, por fim, o cliente pode provar as opções com doce de leite e chocolate, que acompanham marshmallow, waffer, coco queimado, biju e amendoim.
Monteiro acredita que o fondue se diferencia de outros pratos por "aquecer o corpo e alma" e também por ter adquirido um viés romântico, principalmente na Região das Hortênsias.
— As pessoas não vêm só pelo sabor. Vêm para colecionar bons momentos, levar boas lembranças daqui. Elas postam a foto nas redes sociais para causar uma inveja a quem ainda não conhece — comenta, brincando.
Em relação aos outros meses, o proprietário estima que, no inverno, o movimento aumente entre 35% a 40%, sendo julho o principal mês de serviço, diante da temporada de férias escolares.
Saiba mais
- Quanto custa: em média, a partir de R$ 110 por pessoa.
- Variações: com queijo, carnes, camarões, chocolate, leite ninho e doce de leite. Nas versões salgadas, ganha acompanhamentos como pão, cenoura, batata, brócolis, aspargos, polenta frita, entre outros. Nas doces, os atrativos são frutas como uva, banana, morango, além de chocolate, marshmallow e waffer, por exemplo.