A chegada das mulheres ao mercado de trabalho fez com que se reconfigurasse a maneira como as famílias estruturam o cuidado com os filhos. Fala-se aqui em mulheres porque, essencialmente, ao longo da história elas que assumiram essa incumbência. Embora mais pais venham tendo o papel de cuidadores, a verdade é que são ainda as mães quem mais estão às voltas com a atenção aos filhos. Em alguns casos, pode ser necessário acionar outro serviço estruturado em especial por mulheres: o de babás.
É comum ouvir relatos sobre a dificuldade de encontrar essas profissionais com um perfil adequado. Em Caxias do Sul, não é diferente. De fato, trata-se de uma profissão que exige características pessoais associadas a habilidades a serem desenvolvidas.
— O interessado deve ter caráter, responsabilidade, paciência, ser sociável, ético, comunicativo, educado, discreto, atencioso, organizado, dinâmico, proativo interessado, honesto, transparente, asseado, ter boa apresentação pessoal e bom senso, ter boa saúde corporal e bucal — aponta Inez Cirillo Carlos, docente da área de saúde e do curso Cuidador Infantil do Senac São Paulo.
Embora a ideia de babá remonte àquela figura presente diariamente na vida da criança, novos cenários têm se desenhado diante de necessidades da vida contemporânea. Mas não só. Também existe uma preocupação com o tipo de assistência que está sendo prestado aos pequenos.
— Saber planejar as tarefas do dia, desenvolver algumas habilidades manuais de educação artística, física e entretenimento e noções de primeiros socorros. Além disso, ter cuidados de higiene pessoal, higiene doméstica, higiene e acondicionamento dos alimentos e preparo culinário diversificado para a faixa etária. Habilidade de leitura e escrita são fundamentais — sugere Inez, sobre o perfil dos interessados nessa profissão.
Novos jeitos de cuidar
É nessa perspectiva de busca por um serviço diferenciado que surgiu em Caxias do Sul o Nanny in Lar, que interliga famílias e cuidadoras. A professora Juliana Teixeira Hoffmann percebeu que existia uma demanda recorrente pelas profissionais. Assim, em 2016, criou um cadastro com seis nomes para oferecer aos interessados. De lá para cá, multiplicou esse número várias vezes: são 88 cadastrados em Caxias. A maior parte, 74, é também professora. As demais são babás sem formação. O serviço ganhou novos territórios, com 10 profissionais inscritas em Flores da Cunha.
Juliana pretende expandir o negócio para outros municípios da Serra e em novas frentes. Uma delas é promover um curso de certificação no método de atuação dela. Outra ideia é, no futuro, criar um aplicativo que faça essa conexão. Atualmente, todo o trabalho é feito por ela por meio do WhatsApp (veja abaixo como contatar). Mesmo quando isso ocorrer, ela pretende manter o atual padrão de qualidade.
— Hoje, o nosso diferencial é que as nossas babás, além de cuidar, levam toda a parte de desenvolvimento infantil: as brincadeiras, a diversão, a musicalização, a ludicidade, a psicomotricidade e estímulos em bebês.
A mão de obra oferecida pela Nanny in Lar normalmente chega até a empresária por meio de indicações e, para ser cadastrada, precisa passar por uma entrevista de seleção. Juliana estima que já foram cerca de 200 famílias atendidas pelo serviço e diz que a procura é recorrente. A empresária prefere não divulgar valores para a contratação, porque diz que existem muitas variáveis, como condições de deslocamento da babá, número de crianças a serem cuidadas e tipo de atividade procurada.
Plataformas online
Esse amplo mercado oferece perfis diversos. A indicação entre conhecidos é, de acordo com os relatos, a mais comum. Mas a internet também têm sido uma alternativa. Em 2019, chegou ao Brasil a Sitly, maior plataforma de conexão entre babás em países da Europa na época e maior site de babás no Brasil hoje. Em Caxias do Sul, são 640 profissionais cadastradas, com ou sem experiência e também com formação variável. No outro lado, são 200 famílias inscritas à procura de profissionais.
Mercado informal
Quantificar as profissionais nesse universo é difícil. Primeiro porque trata-se de um mercado altamente informal. Quem não conhece a vizinha que cuida de duas ou três crianças e tem espaço para mais uma? Segundo porque a própria legislação inclui a atividade no rol de empregados domésticos, ou seja, não estratifica por tipo de atuação.
Mas há um indicativo: em 2018, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) mostrou que quase 10% das mulheres em serviços domésticos gerais se identificavam como cuidadoras de crianças. A maior parte (80%) dizia fazer serviços gerais e as demais se dividem entre cuidadoras pessoais e cozinheiras.
Como contatar
- A Nanny in Lar pode ser contatada pelo WhatsApp: (54) 99184-0702
- O site do Sitly é www.sitly.com.br
Atenção individualizada conquistou mãe
A dentista Gisele Barp, 42 anos, e o preparador físico Rodrigo Squinali, 43, têm dois filhos. O pai, que mora na Tailândia, está no Brasil para acompanhar os primeiros dias de vida de João Gabriel, que nasceu na quarta-feira (13). Deve ficar até o fim do mês, quando volta para o país asiático. Enquanto isso, Gisele pensa e articula como ficará a rotina da família. A primogênita Maria Helena, 3 anos e 2 meses, frequenta a escola, e conta com o auxílio de babás para momentos em que há necessidade da mãe.
Gisele conta que logo após o nascimento de Maria tentou a contratação por conta de uma babá, mas não teve uma boa experiência. Como consegue ter alguma flexibilidade nos horários, passou a dividir a tarefa de cuidados com a menina com as avós materna e paterna. Porém, percebeu que uma falta de maior interação da filha com as cuidadoras. Tentou levá-la à escolinha, mas após um período bem adaptada, Maria apresentou dificuldade em continuar frequentando a instituição.
Entre uma conversa e outra com pacientes sobre como precisava de um apoio nos cuidados com a filha, a dentista conheceu o Nanny in Lar, um serviço que se adequou à necessidade da família. De um dia para o outro, conseguiu uma profissional que cumpria os requisitos esperados pela mamãe: uma babá com autonomia e que proporcionava atividades de lazer e diversão para Maria.
— No primeiro dia, ela já levou um peixinho na água e encantou a Maria. Ela tinha atividades para todos os dias. Se deixava com a mãe ou com a sogra, elas cuidam muito bem, mas a criança acaba querendo ir para o Ipad e vai. Então, com a babá, elas ficavam aqui no pátio (da clínica de odontologia), eu olhava e ficava tranquila para trabalhar — relata.
A babá ficou três meses com Maria, até que ela e a mãe viajaram para ficar com o pai por três meses. No retorno, uma segunda profissional foi indicada a Gisele, que aprovou novamente o serviço:
— A criança se sente acolhida, porque ela quer atenção. E elas sabem conquistar a criança, então não tenho receio de mudar de pessoa — elogia.
Com o tempo, a mamãe percebeu que a filha estava precisando de convívio com grupos. Assim, no início desse ano, Maria voltou para a escola de Educação Infantil. A dentista ainda usa o serviço das babás de maneira esporádica, de acordo com a necessidade de ambas:
— Para mim, esse é um modelo que me adaptei bem, porque eu gosto de ter liberdade, não gosto de ter alguém o tempo todo junto de mim — detalha a mãe.
Abertura de horizontes profissionais
Trabalhando há 11 anos na Educação Infantil, a pedagoga Giovana Mazzochi, 25, começou a prestar serviços como babá devido a uma necessidade de reforçar a própria renda. Há cerca de quatro anos, ela começou a exercer essa atividade, que antes não estava nos planos, principalmente à noite.
O encanto com o trabalho e o progresso nos estudos a levou a mudar o foco dos atendimentos. Hoje cursando Letras e uma pós-graduação em Psicopedagogia, a professora segue trabalhando em escola de Educação Infantil. Giovana também permanece oferecendo o cuidado individualizado às crianças, mas com maior enfoque no reforço escolar. Ela traça um paralelo entre o que é atendimento nas instituições e o nas residências. Diz que o serviço nas casas se assemelha ao das escolas ao oferecer conforto e segurança aos pais:
— Não é só o cuidar da criança. É levar para as famílias um trabalho com excelência. É levar um pouco do nosso profissionalismo, do nosso diploma, das nossas técnicas didáticas para ajudar as famílias das crianças em um processo de desenvolvimento muito grande.
Hoje, Giovana trabalha como cuidadora de crianças em finais de semana e feriados. A agenda cheia com o trabalho formal e estudos não permite a rotina que imprimiu em outras épocas, com atendimentos também à noite.
— Hoje eu faço os atendimentos para levar meu trabalho até como pedagoga. O que eu mais atendo são reforço escolar e recreação, quando desenvolvo atividades. É como se fossem uma aula particular meus atendimentos. A gente tem muito isso de aprimorar a criatividade e o senso crítico, e oferecer dinâmicas que fogem da tecnologia.
Alternativa para momentos específicos
Benício Kahler Carvalho, 4, e o irmão Bernardo Kahler Carvalho, 1 ano e 9 meses, frequentam a escola de Educação Infantil em turno integral, mas há momento em que os pais, a médica Sabrina Kahler, 36, e o engenheiro de produção Gustavo Theodor Carvalho, 39, precisam de reforço no cuidado com os pequenos. Para essas horas, é comum acionarem um serviço de apoio de babás.
A médica chegou até o Nanny in Lar depois que a funcionária que prestava serviço à família pediu o desligamento do trabalho. Com a necessidade de apoio, a dermatologista buscou na internet por agências de babás. Um fato que contou para a escolha foi a pré-seleção feita no cadastramento de profissionais. Mas, antes disso, a família até tentou contratar uma nova babá por conta:
— Fiz entrevistas e percebi a dificuldade que era conseguir alguém para cumprir a carga horária e passar confiança — assinala a mãe.
Com o intermédio de Juliana, a contratação ficou mais fácil. No primeiro contato, os meninos gostaram da indicação e, a partir daí, a família passou a pedir sempre a mesma profissional para os momentos de apoio:
— Eu tenho meus horários a cumprir. Meu marido é engenheiro e trabalha muito viajando. Então, muitas vezes, ele não está em casa. Chamamos a babá quando as crianças ficam doentes e não podem ir à escola ou mesmo quando queremos descansar um pouco. Eu sei que tenho esse plano B, que é a agência — explica a médica.
Serviço mais buscado na pandemia
Durante o período mais crítico da pandemia, em que escolas ficaram fechadas, aumentou a procura pelo serviço de babás que, além de cuidar, ajudam no desenvolvimento das crianças. Os pais, preocupados com esse processo, passaram a buscar auxílio especializado. A pedagoga Iasmine Salvadori, 25, conseguiu conciliar o trabalho nas redes municipais de Caxias do Sul e Farroupilha com esses atendimentos.
— Foi um período muito procurado e onde a gente pode interferir com bastante qualidade de uma forma bem positiva nas famílias em um momento tão conturbado que foi a pandemia _ conta.
A professora começou a trabalhar como cuidadora infantil há cerca de cinco anos, com atendimentos no turno inverso ao emprego formal. Na época, foi uma forma de reforçar a renda e de agregar os atendimentos pedagógicos.
— Tu consegue proporcionar trabalhos, atividades propostas de acordo com a necessidade delas e também com o que os pais estão procurando, um reforço escolar ou também uma recreação, porque às vezes essas crianças estão muito em casa paradas — salienta.
Hoje, com a rotina nas escolas da rede municipal, os horários disponíveis são em finais de tarde, noites e finais de semana. Porém, há períodos em que ocorrem de forma mais estendida, como durante as férias de verão.
— A gente acaba criando um vínculo bem grande com as famílias e crianças que a gente atende. Tanto que hoje eu tenho, por exemplo, fixas famílias que já reservam datas para o ano, como as férias de verão.
Vínculo permanente
Embora muitas famílias reclamem da dificuldade de encontrar uma babá que se adeque bem à rotina da casa, existem, por outro lado, casos e mais casos de sucesso nessas relações. É o que aconteceu com a empresária Katiuscia Zadinello Mattiello, 43, e com a babá Rosângela Aristides Rodrigues, 51. Esse encontro ocorreu há 13 anos, cerca de seis meses depois do nascimento de Valentina Mattiello Corso.
Na época, uma babá já havia sido contratada pela família, mas abandonou o trabalho. Katiuscia, então, recebeu a indicação de Rosângela por intermédio de uma amiga da mãe dela.
— Quando eu vim trabalhar com a Kati, eu disse: nunca cuidei de crianças de outras pessoas, mas eu cuidei dos meus e vou cuidar da tua como se fosse minha. Então, a gente está há bastante tempo — conta Rosângela, mãe dos gêmeos Guilherme e Juliana Rodrigues, 31, e de Maria Eduarda Rodrigues, 20.
Passados cerca de dois anos da contratação da babá, que também ficou responsável pelos serviços domésticos, Katiuscia considerou a possibilidade de engravidar novamente:
— Eu sempre brinco que antes de perguntar para o pai das crianças se queria ter outro filho, eu perguntei para a Rô (se trabalharia conosco). E é verdade, porque não adiantava eu querer ter outro filho e não ter alguém como ela para me ajudar a cuidar — diz a mãe de Ana Júlia Mattiello Corso, hoje com 10 anos.
É esse clima de relacionamento familiar que predomina na casa. Tanto que a empregadora se refere à funcionária como irmã e segunda mãe das próprias filhas. Hoje, com as garotas mais independentes, a permanência de Rosângela na residência caiu de dois turnos para seis horas por dia. Mas, ainda assim, os cuidados dela parecem ser indispensáveis:
— Eu digo que a profissão dela é anjo da guarda, porque ela faz de tudo, desde a comida. Hoje, as meninas se viram bastante sozinhas, mas, às vezes, precisa levar alguma no jazz e eu não estou em casa, aí a Rosângela leva, ou precisa buscar na escola e eu não consigo, daí a Rosângela busca... Então, ela me ajuda nisso também.
Essa proximidade emocional entre os integrantes da família, construída ao longo de um convívio intenso em uma atividade que demanda que os pais se sintam seguros e confortáveis com a presença de outra pessoa no cuidado com os filhos, faz com que Rosângela pense em continuar por bastante tempo junto com Katiuscia, Valentina e Ana:
— O vínculo com as crianças é muito grande. Isso, a gente pensa muito. E não tem como tu deixar como se fosse teu filho em um lugar, porque, na verdade, eu me sinto como se fosse mãe delas também.
Os cuidados na hora de contratar
Na hora de contratar alguém para cuidar das crianças, os pais devem tomar uma série de cuidados. Eles precisam estar preparados para esse momento. Inez Cirillo Carlos, docente da área da Saúde e do curso de Cuidador Infantil do Senac São Paulo, dá algumas dicas o que fazer nesse momento:
- O contratante deve ser muito claro e definir o perfil desejado.
- Constatar por meios formais se o interessado possui formação para Cuidador Infantil
- Checar se possui referências de trabalhos anteriores como cuidador ou referências pessoais.
- Fazer entrevista com o interessado.
- Entender o limite de atuação do profissional, esclarecer muito bem quais serão as atividades que o cuidador deverá executar, os horários de trabalho, descanso, folga e período de experiência.
- Após a contratação, observar o comportamento e aceitação entre o cuidador e a criança, os critérios de higiene pessoal e preparo de alimentos, cuidados com o ambiente doméstico ocupado pelo menor e o comportamento pessoal do cuidador no ambiente de trabalho.