A profissão de barbeiro é milenar. Seus primeiros registros são do Egito no Século II antes de Cristo. No entanto, esse nome surge em 1096, na França, quando um arcebispo proibiu o uso da barba no país e obrigou o surgimento de profissionais capazes de realizar esse corte. É curioso pensar que esses profissionais eram os únicos a realizarem cirurgias até o ano de 1461, bem diferente da profissão que hoje trabalha especificamente com o corte de cabelo e a barba do público masculino. Histórias não faltam, assim como altos e baixos com os quais convive esse mercado. Não faz muito, iniciou o boom de um novo formato para esses estabelecimentos, mais sofisticado e com oferta de serviços e atrações adicionais, tentando sempre um diferencial para ganhar seu público dentro de cada comunidade. Basta andar pelas ruas de qualquer cidade da Serra para avistar uma barbearia. No caso de Caxias do Sul especificamente, elas se multiplicam.
Esse fato tem vários pontos de explicação, e uma delas é a necessidade. A crise da pandemia, agravando os problemas econômicos do Brasil, deixou milhares de desempregados e novos empreendedores. Houve aí um disparo na quantidade de pessoas buscando especialização e tentado agregar uma forma de renda.
— Está aumentando (o número de barbearias), mas ainda têm capacidade de mais profissionais. Faltam profissionais com experiência, mas ao mesmo tempo está começando a inchar o mercado. Quando eu comecei aqui em Bento, era a segunda barbearia do município, e agora já tem quase 30 estabelecimentos — destaca Alexsandro Freitas Siqueira, 47 anos, que também é professor do curso de capacitação promovido pelo Senac na cidade.
Não é um negócio barato. O curso no Senac de Bento custa pouco mais de R$ 1,9 mil. Para ter bons equipamentos, são outros R$ 2,5 mil, e abrir um estabelecimento, o mais simples possível, é preciso mais R$ 10 mil. Ou seja, apostar nesse mercado atualmente exige muito estudo e cuidado, para não ser apenas mais um e acabar sucumbindo pouco tempo depois.
— A dica é verificar quantos negócios tem na região e qual é a real demanda. É difícil estruturar uma pesquisa robusta, mas fazer uns cruzamentos de população e visitar empresas que já trabalham com isso. As empresas estão aptas a essa troca, porque podem encontrar um parceiro para o seu negócio ali na frente. Ou seja, converse. O pequeno empreendedor que não tem muito recurso precisa desse trabalho investigativo, visita duas ou três empresas que trabalham com isso e converse com futuros clientes — alerta Fábio Krieger, gerente setorial de competitividade do Sebrae RS.
As novas barbearias surgiram com diversas atrações adicionais a uma bancada, espelho e a cadeira. Desde a apresentação inicial dada pela arquitetura do espaço, equipes uniformizadas e alinhadas, até o café. Não estranhe com freezers tendo cerveja ou até sala de jogos, cada uma aposta num diferencial. Em comum, todos acabam sabendo que o tratamento com o cliente segue sendo a melhor ferramenta disponível para se manter vivo em meio a tanta concorrência.
— Quando você se diferencia na questão de atendimento, mantém bom diálogo, cria conexão, o cliente não te abandonará. Vai ter momentos de queda? Vai. Mas você não pode estabelecer uma média por causa de um mês. A gente mantém o pé no chão, focamos na experiência do cliente e sempre inovando. Eu reformei a parte de cima da loja, porque quero criar algo em breve. Era um espaço onde tínhamos a sala de jogos, mas comecei a entender que o pessoal não curte isso. Eles vêm, cortam o cabelo e vão embora, preferem mais conversar com a gente na recepção do que os jogos — explica Ary Rocha, 39 anos e uma das referências no mercado serrano.
OUTROS TEMPOS
Os conceitos mudaram. Além do corte e cabelo, as barbearias comercializam produtos específicos para cabelo e barba. Agora formam ainda mais barbeiros com cursos próprios e metodologias de ensino criadas a partir da vivência. O mercado se reconstrói e é preciso estar atualizado para onde caminha, principalmente entendendo o seu cliente.
— A pessoa precisa ter certeza de que é isso o seu desejo, porque tem muita gente que acaba jogando o valor do investimento no curso fora. Tenha persistência e estude bastante, porque hoje tem muita informação. Há seis anos, você procurava no YouTube, não tinha nada sobre corte de cabelo. Hoje tem aula que ensina a segurar a tesoura, o pente, como cortar, qual é a máquina que determinado profissional usa, como desmontar e higienizar uma máquina. Tudo o que se imagina, tem — finaliza Siqueira.
“É a gestão que mantém a empresa”
Entrar num mercado que já está próximo do seu auge e consolidado exige muito cuidado para quem tem a intenção de ser um barbeiro e montar o seu empreendimento. Por isso, pesquisar e buscar informações é fundamental. Conversar é a melhor forma de compreender onde está o seu diferencial e o que poderá entregar aos possíveis clientes, e dessa forma viabilizar o empreendimento e o investimento necessário.
— A pessoa não pode se encapsular e achar que tem a melhor ideia possível. É preciso ter um processo de humildade para entender o consumidor e seus pares. Para quem entrar num mercado em expansão, precisa analisar o que esse mercado está pedindo e as empresas constituídas não estão entregando. Pode ser um atendimento diferenciado, um contato mais próximo, um serviço adicional, um produto minimamente adaptado à necessidade de um setor — explica Fábio Krieger, gerente setorial de competitividade do Sebrae RS.
No caso específico das barbearias, o segundo ponto depois de entrar no mercado é entender a parte administrativa. Ary Rocha já tem uma empresa específica para realizar cursos e workshops. Dentro desse cenário, ele já sentiu um déficit na área de gestão. O que é um ponto essencial para manter o negócio vivo.
— Cortar cabelo é obrigação, atender bem o cliente muito mais. Mas a gestão é o coração de toda empresa, senão ela quebra dentro de dois anos. Apenas 6% conseguem se consolidar no mercado em que atuam. As pessoas focam muito no operacional e esquecem da gestão. Quando entendi isso, notei que a barbearia poderia andar sem mim. Então o Ary virou uma marca, mas os clientes vêm e mantém a barbearia por causa da marca. Só que é a gestão que mantém a empresa — ressalta Ary.
O mundo da barbearia trabalha com a beleza e autoestima. Num contexto de Século 21, o empreendedor precisa entender ainda mais o mundo online. Hoje, a maioria consegue sobreviver a partir de um trabalho em rede social, e quase todos apostam hoje em tráfego pago, aplicativos para agendar horários. Não estar presente no mundo da internet pode ser fatal e aparecer na rede é quase uma questão de sobrevivência. Por isso é fundamental entender como utilizar esse tipo de ferramenta. Hoje, a maior parte dos clientes chega através das redes sociais, e é fundamental entender qual é a rede principal, que exigirá maior atenção. Bem utilizado esse recurso, o novo barbeiro poderá ter até 90% de clientes através desses canais.
— Trabalhar pelos canais digitais é extremamente importante, assim como comercializar o serviço pela internet. O ponto que dizemos aos pequenos é que às vezes ele falha por querer abraçar todos os canais, ter conta em todas as redes sociais. Qual é o canal que o teu consumidor está? Começa por um canal muito bem feito, acerta, desenvolve e depois expande para outros canais — lembra Krieger.