Quem chega ao Hotel Boutique Lote 20, no roteiro Caminhos de Pedra, em Bento Gonçalves, com certeza será surpreendido pela Priscila e o Bernardinho, as duas lhamas que são os mascotes do empreendimento. Ao mesmo tempo, poucos poderão imaginar que o estacionamento coberto é uma pequena usina de geração de energia elétrica, conhecido como Carport, onde também existem dois carregadores veiculares. E tudo isso se deve não ao sol, mas à chuva.
— No dia em que estávamos analisando os melhores locais para colocarmos as placas solares e ter a energia, o telhado não comportava o número necessário de placas. Estávamos aqui fora analisando e pensando em colocar no gramado, mas ocuparia todo o espaço. Naquele momento deu uma garoa, eu falei que a nossa deficiência era a falta de estacionamento coberto e precisaríamos construir no futuro. Nesse momento, os consultores nos mostraram um sistema novo que é o carport. Eles mostraram a imagem e ficou esse espetáculo aqui — conta Rigor Bellé, um dos sócios do empreendimento.
As placas surgiram de um velho problema para quem vive na área rural, mesmo que o Caminhos de Pedra seja um dos mais importantes roteiros turísticos de Bento e da região. As medições não tinham uma sequência mensal, provocando gastos acima do normal.
— Esse é o primeiro ponto do investimento, ter o retorno, e segundo, por ser uma energia limpa. O hotel tem a dinâmica mais sustentável, a questão de água mineral, o aquecimento também é por placa solar, a gente quis fazer um investimento para placa solar e gerar energia própria, poder jogar para rede quando precisar e ter o retorno e investimento para casa, afinal é uma energia limpa — pondera Bellé, que complementa sobre o retorno do sistema instalado em setembro do ano passado. — Elas ainda não estão produzindo o suficiente, porque existe um tempo de uso. Mas já está quase atingindo, ainda usamos alguma coisa da rede. Mas a diferença já começou.
O hotel foi inaugurado em 2019, com uma temática mais acolhedora por ser pequeno. O local conta com nove suítes, todas diferentes entre si. Ele foi construído em um casarão de pedra, mas com amplo espaço externo e que vem atraindo muitos clientes por esse clima de tranquilidade que o interior oferece. Lógico que os mascotes são um ponto que chama a atenção, mas a filosofia de pensar em algo sustentável também é um diferencial para Rigor e seus sócios:
— Quando pegamos o espaço, já tínhamos um poço artesiano com uma vazão excelente, fizemos um estudo da água e é muito melhor do que aquela que está sendo vendida nos mercados. Essa questão sustentável sempre foi a nossa busca, porque, como é um hotel boutique, queríamos de explorar a qualidade em serviço e uma questão de energia limpa. Até o nosso café da manhã é diferente para evitar o desperdício — destaca Bellé.
Tecnologia foi ficando acessível nos últimos 10 anos
O setor de energia solar ainda era algo muito distante quando Tiago Cassol Severo começou a estudar o mundo das placas fotovoltaicas. Quando ele ingressou na área, em 1998, as placas chegavam a custar US$ 1 mil, com uma tecnologia que não garantia tanta produção. Tanto que esses sistemas eram mais difundidos em locais remotos, principalmente na área rural, onde as concessionárias de energia elétrica não chegavam. No entanto, isso foi mudando a partir da primeira década dos anos 2000.
— Houve uma queda vertiginosa nesses 24 anos. A energia solar se tornou muito competitiva porque o mercado chinês começou a ter diversas empresas fabricantes de painéis solares, ampliou suas exportações e o Brasil começou a absorver. Isso começa a ocorrer principalmente com a RN (regularização normativa) 482, de 2012, quando as pessoas físicas e jurídicas puderam instalar módulos fotovoltaicos em suas residências e empresas. Aí houve o boom — explica Tiago.
Outro fator que explica esse crescimento de investimento na energia renovável está nas linhas de créditos. Há pouco mais de cinco anos, os bancos começaram a abrir possibilidades de investimentos específicos para as placas fotovoltaicas, o que acabou atraindo muitas pessoas jurídicas. O levantamento da Sicredi Pioneira mostra que, desde 2016, foram disponibilizados mais de R$ 260 milhões para viabilização de 5 mil projetos em todo o Rio Grande do Sul. Somente no ano passado, foram R$ 150 milhões, mostrando como esse setor se expandiu.
— A energia renovável é legal porque, além da atitude sustentável, você vai ter uma economia significativa no consumo de energia e na fatura. Um cliente baixa tensão pode chegar a níveis bem pequenos, mas tem a tarifa de disponibilidade, diferença de Pis/Cofins, bandeiras tarifárias e iluminação pública que o cliente sempre vai pagar — lembra Tiago.
No Campus da UCS de Bento Gonçalves, onde reside e também dá aulas para turmas de Engenharia Elétrica, Tiago conseguiu aprovação e instalação de módulos de placas solares. Atualmente, esse sistema corresponde a 40% de tudo que os prédios consomem, e essa energia, além de ser um instrumento para as aulas, abastece quase toda a iluminação externa de lâmpadas dos prédios e também do estacionamento.