Exigências sanitárias rigorosas impostas pelas autoridades do Chile tem deixado caminhoneiros brasileiros, inclusive da Serra, retidos na fronteira do país com a Argentina. O imbróglio ocorre devido à não aceitação, por parte das autoridades chilenas, de testes realizados na Argentina e no Brasil para ingressar no país. Os profissionais também reclamam das condições a que são submetidos caso precisem ficar em isolamento.
O problema começou no fim da primeira quinzena de janeiro, mas se agravou dias depois, quando o Chile decidiu que somente cruzaria a fronteira quem realizasse teste PCR aplicado pelas próprias autoridades do país. Além de ser um processo lento, já que o exame precisa ser analisado em laboratório, quem testa positivo é encaminhado para um quarto isolado praticamente apenas com alimentação.
A medida revoltou caminhoneiros argentinos, que passaram a protestar na ligação dos dois países passando pela cidade de Mendoza. Segundo a presidente da Associação Brasileira dos Transportadores Internacionais (ABTI), Gladys Vinci, inicialmente, os motoristas brasileiros apoiaram o movimento. Quando decidiram seguir viagem, porém, foram impedidos pelos grevistas. Ao longo de 15 dias, cerca de 5,5 mil caminhões se enfileiraram na fronteira. A fila que atingiu 200 quilômetros de extensão, passando a área urbana de Mendoza. Em boa parte do trecho, o terreno é desértico sem vegetação e com menor infraestrutura sanitária.
— O Chile é muito resistente a abrir as fronteiras. Eles têm medo da Ômicron. O isolamento em um quarto revoltou muito os argentinos e os brasileiros sentiram o peso da maldade. Se tivesse dois ou três funcionários de uma empresa e um testasse positivo, todos iam para o isolamento — conta Gladys, que mantém contato com representantes do Itamaraty para solucionar a situação.
A empresa Frutas Silvestrin, de Farroupilha, chegou a ter entre 40 e 50 caminhoneiros retidos na fronteira, segundo o sócio João Silvestrin. Desde o início da semana, a maior parte conseguiu entrar no Chile e ele estima que faltam de 10 a 12 profissionais seguirem viagem. A fila começou a andar no início da semana, após autoridades de Mendoza assinarem um acordo com as autoridades chilenas. Agora, o Chile aceita testes negativos realizados em até 72h em Mendoza, desde que possam ser confirmados via internet pelas autoridades do país.
— Numa viagem ao Chile, o profissional normalmente fica longe da família de 12 a 15 dias e agora eles ficaram parados esse tempo. Os profissionais não querem ficar parados, querem produzir. É um deserto ali, não tem infraestrutura. A parte psicológica fica muito afetada. É triste — observa Silvestrin.
Tradicional reduto de caminhoneiros na Serra, São Marcos não tem moradores retidos na fronteira, segundo Everton dos Santos, presidente da Gasmar, entidade que representa a categoria.
Gladys estima que em dois a três dias todos os caminhoneiros retidos poderão seguir viagem, mas as cargas devem ficar represadas por até 15 dias. O problema logístico é agravado pela operação padrão dos servidores da Receita Federal, que tem dificultado importações e exportações. Já João Silvestrin estima que os profissionais da empresa de Farroupilha estejam liberados até terça-feira (8).
Motorista da Serra ficou cerca de 15 dias parado
O motorista Milto Pagna, que transporta autopeças para uma empresa de São Marcos, conta que a paralisação foi encerrada no domingo (30), mas a quantidade de caminhões era tamanha que se movimentou apenas nesta sexta-feira (4). O morador da Serra ficou cerca de 15 dias parado na região de Mendoza. Nesta sexta-feira, chegou a aduana argentina, onde fará um teste para a covid-19. Quando chegar à aduana chilena, terá de fazer uma contraprova.
Ele conta que, nos primeiros 10 dias em que ficou parado, conseguiu usufruir da estrutura de um posto de parada, com acesso gratuito ao banheiro e comida a um custo baixo. Mas depois disso, com o acúmulo de veículos, os custos se elevaram, porque o dono do local decidiu cobrar pelo banho e os alimentos se tornaram mais caros. Diante desse cenário, ele foi para outro posto, onde passou uma noite e uma manhã. Depois, foi para o acostamento da rodovia:
— Não tinha estrutura nenhuma. Simplesmente, estávamos dividindo a comida com os outros colegas. Até passava alguém para vender alguma coisa, mas sempre um preço alto. Não tinha condições de banho. Não tinha nem como eles colocarem um banheiro químico. Hoje, faz 15 dias que estou por aí.
Nesta sexta à tarde, ele conseguiu a ficha 935 para ser atendido na aduana. Por volta das 18h, o número mais recente chamado era próximo ao 350. Com isso, estima que terá a documentação examinada no início da manhã de sábado. Até chegar ao destino, terá de passar ainda por outras duas aduanas. A expectativa dele é fazer a descarga na terça ou quarta-feira da semana que vem.