Terceira geração de uma família de produtores de uva e vinho em Caxias do Sul, André de Gasperin tem o desafio de conduzir a Associação Brasileira de Enologia (ABE) nos próximos dois anos. Diretor técnico e enólogo-chefe da Vinícola Don Affonso e do Grupo DG do Brasil, ele pretende dar sequência ao trabalho já realizado pela entidade, valorizando cada vez mais o profissional que representa.
Nesta entrevista,o novo presidente da ABE, que além de enólogo é mestre em Biotecnologia pela Universidade de Caxias do Sul (UCS) e tem MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas, fala dos planos para sua gestão e avalia o 2020 totalmente atípico por causa a pandemia. Confira:
Quais os seus planos à frente da presidência da Associação Brasileira de Enologia?
A entidade já é consolidada, tem mais de 40 anos. Já tem o seu planejamento anual das atividades a serem realizadas, tanto a Avaliação Nacional de Vinhos, que é um evento consagrado da entidade, quanto os concursos de vinhos internacionais e do espumante brasileiro. O foco da Associação Brasileira de Enologia sempre foi e vai ser nessa gestão a qualificação do profissional, as pessoas que estão por trás de um vinho. Quando a gente adquire um vinho, a gente não imagina todo o trabalho, todo o profissionalismo que tem por trás. O foco da associação sempre vai ser o enólogo: desde capacitações, visitas técnicas, a gente traz palestrantes de todo o mundo para debater sobre determinados temas. Então, sempre com esse foco de capacitação e de valorização tanto do profissional quanto do vinho brasileiro.
Qual a sua avaliação do setor neste ano, um ano atípico por causa da pandemia?
Está terminando um ano bem complicado em relação a tudo o que tem ocorrido, a pandemia, a saúde das pessoas, pessoas que infelizmente estamos perdendo para a pandemia. Sem dúvida, não é um ano para se comemorar nada. É um ano para se repensar, é um ano para se trabalhar. Em relação ao setor também, o setor teve que se reinventar. Esse ano, de repente, em função de tudo isso, a gente observa que as pessoas abriram um pouco mais os olhos para o vinho brasileiro, o que por um lado foi bom. Em função de vários fatores, a questão cambial, a questão do fechamento das fronteiras e a diminuição do descaminho, do contrabando, o vinho nacional acabou tomando um espaço um pouco maior na gôndola e na mesa do brasileiro. Por esse lado, a avaliação é boa, mas a gente sabe que isso tudo foi um ano de se reinventar. A própria Avaliação Nacional de Vinhos, no início havia um temor de não conseguir fazer, depois a gente teve que reinventar e fazer uma versão hibrida, online e foi um sucesso, as pessoas adoraram, tanto é que nos próximos anos vai se manter o formato presencial e online. Um ano que serviu de aprendizado. Todas as pessoas, todos os setores para se manter precisaram se reinventar, e com a ABE não foi diferente. Também precisamos nos adaptar à essa nova situação.
Apesar das dificuldades, aumentou o consumo de vinho e foi considerada a bebida da quarentena.
Fazia muito tempo que o vinho brasileiro precisava ter um espaço maior na mesa do brasileiro. O próprio brasileiro pudesse reconhecer o produto de qualidade, e isso acabou culminando também com uma safra muito boa, que a gente intitulou de "a safra das safras". É um produto com uma qualidade maior, também resultou em um reconhecimento maior por parte do consumidor e, apesar de todo o problema da pandemia, enxergar sempre o lado bom das coisas, sempre com a visão de enxergar a taça meio cheia, não meio vazia e se enxergar o lado bom das coisas.Realmente, foi o ano em que o vinho brasileiro pôde ocupar um espaço um pouco maior na mesa do brasileiro.
Qual a expectativa para esse final de ano, já que o espumante é tradicional no Natal e Réveillon?
A expectativa é boa, apesar dos problemas que a gente tem observado, principalmente no segmento de eventos, que era um canal de consumo muito grande de espumantes. Por outro lado, os hábitos de consumo do espumante também se modificaram. Hoje pode-se dizer que não é mais só aquele espumante do final do ano, das festa de final de ano, mas se consome espumante o ano inteiro.
Tivemos uma safra excelente neste ano. O que esperar da próxima safra?
A expectativa é sempre boa, mas a gente depende das condições climáticas. A gente teve um período de estiagem bastante grande, na última semana amenizou um pouco. No geral, a formação da uva foi prejudicada muito pouco. A videira é uma planta que não tem necessidade tão grande em relação à questão hídrica, é uma planta que se adapta bem a climas secos. É um pouco cedo para falar sobre a próxima safra ainda, mas a gente tem boas expectativas. A gente tem agora mais dois meses pela frente que são fundamentais para a formação do fruto, para o início da maturação, da troca de cor das uvas tintas, e a gente depende das projeções e condições climáticas. O ideal é um clima relativamente seco com chuvas muito sazonais, a cada 10, 15 dias. No restante, clima seco e muito sol. É o que a uva precisa agora para maturar. E precisamos de noites frescas e dias quentes. Quanto maior a diferença de temperatura entre dia e noite, melhor a qualidade da uva.