Com mais tempo em casa e maior número de pessoas confinadas, as famílias brasileiras consumiram mais do que o normal nos últimos meses. Com maior consumo no mundo e a valorização do dólar, o agronegócio brasileiro ganhou força no mercado externo. E, na soma desses fatores, a lógica da inflação se aplicou: a oferta de produtos no país diminuiu, enquanto a demanda aumentou, assim como os preços.
Embora o brasileiro esteja acostumado com sazonalidades, começou a se tornar mais perceptível o esvaziamento do bolso do consumidor a cada ida ao supermercado nos últimos meses. E em tempos de incerteza financeira e alta de desemprego, o alerta foi aceso e repercute em nível nacional nos últimos dias. Em Caxias, o cenário se reflete.
— Aumentou muito, sim, o leite, a carne, frutas, os legumes, praticamente tudo. A gente tenta pesquisar o que pode, mas tudo aumentou — relata Josiane Rodrigues, moradora do loteamento Charqueadas.
Óleo de soja e arroz foram os itens que mais ganharam notoriedade pelo aumento de preços. Em Caxias, entre agosto de 2019 e agosto de 2020, os produtos aumentaram 41% e 33%, respectivamente, conforme dados do Instituto de Pesquisas Econômicas e Sociais (IPES) da Universidade de Caxias do Sul (UCS). Nesse período, o levantamento do IPES indica que o arroz (polido e parboilizado) de cinco quilos passou da média de R$ 11,26 para R$ 15,56, enquanto o óleo de soja passou de R$ 2,94 para R$ 4,31.
Em visita a mercados na tarde de ontem, o Pioneiro verificou que ambos os produtos já apresentam aumentos significativos em comparação ao apontado na última pesquisa divulgada pelo instituto. Enquanto o arroz varia de R$ 16,90 a R$ 24,90, o óleo de soja custa entre R$ 5 e R$ 6. Seguem aumentando de preço.
— Os supermercados estão segurando tudo que podem. Hoje, um pacote de arroz em certas cidades do Nordeste já está R$ 40. Aqui no RS já teríamos de estar vendendo a R$ 25, R$ 30. Estamos com R$ 20 a média, ainda não repassamos dois aumentos — conta Eduardo Slomp, presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Gêneros Alimentícios de Caxias do Sul (Sindigêneros).
A tendência, segundo Slomp, é de que ambos os produtos aumentem ainda mais nas próximas semanas até se estabilizar. O arroz, pacote de 5 kg, por exemplo, ele acredita que deve passar a custar entre R$ 27 e R$ 30 e eventualmente chegar aos R$ 40, preço que afirma ser praticado em outras regiões do país.
Aumentos incompatíveis à renda
Na avaliação do diretor do IPES-UCS, Roberto Birch Gonçalves, apesar de se fundamentar na alegação da demanda ao mercado externo, a alta nas exportações não seria motivo suficiente para justificar reajustes desse patamar.
— Não teve aumento de insumos ao agronegócio, nem a logística aos supermercados, combustível, nada disso justifica. Apenas a exportação, mas mesmo assim... É um fator único, a postura é mesmo de mais lucratividade com aumento da procura — observa Birch.
Conforme ele, para piorar, os aumentos vão na contramão da atual condição ou estabilidade financeira do consumidor:
— A pessoa, quando impõe uma parte muito grande da sua receita na cesta básica, que é o caso da população desfavorecida, sofre bem mais. Esses aumentos, se você compara com o aumento da renda, são retas contrárias. As pessoas não têm condição financeira melhor, ao passo que a cesta básica e até produtos supérfluos estão num aumento generalizado.
Exportações seriam principal motivo
A principal alegação de produtores e supermercadistas é de que a alta nas exportações dos produtos causou o aumento progressivo de preços.
— Está, sim, aumentando preço. Os outros países que não exportavam o arroz, o Brasil colocou no mercado (internacional) e foi vendido e ficamos com pouco arroz no estoque e não tem de quem importar. O foco é pensar que é sazonal e que volta a normalizar após a safra. No Rio Grande do Sul, a nossa colheita começa em janeiro, portanto, a partir de fevereiro ou março começa a normalizar — comenta Eduardo Slomp, presidente do Sindigêneros.
Segundo ele, situação semelhante acontece com a soja e a própria carne, itens que têm demonstrado altas sucessivas nos últimos meses.
Para Slomp, apenas a carne tem possibilidade de estabilizar o valor, pela variedade que o consumidor dispõe e, consequentemente, seu consumo pode equilibrar os preços de mercado. Por outro lado, afirma que tanto o leite quanto a soja não têm previsão de quando vão voltar — ou se irão voltar — ao patamar de valores que eram praticados há alguns meses:
— Acredito que vai uns três anos até o arroz voltar àquele patamar de R$ 10, R$ 15, até repor todo aquele estoque.
Tendência
Devem aumentar
:: Óleo de soja: pode chegar a R$ 7 nas próximas semanas e não há previsão de redução.
:: Arroz: a embalagem de 5 kg pode chegar à média de R$ 30 nas próximas semanas e, eventualmente, até a R$ 40. A tendência é de que reduza a partir de janeiro com a colheita.
Devem baixar
:: Feijão.
:: Leite.
Deve estabilizar
:: Carne.
fonte: Sindigêneros