Um grupo de 20 estudantes da Escola Municipal de Ensino Fundamental Santa Lúcia está fazendo história em Caxias do Sul. Os alunos entre 12 e 14 anos são os sócios-fundadores da primeira cooperativa escolar da cidade, a Cooperlúcia, em Santa Lúcia do Piaí. Na associação, que segue os princípios do cooperativismo, eles são os responsáveis por administrar e desenvolver a cooperativa: organizam assembleias, escrevem atas e controlam o livro-caixa, entre outras atribuições.
Viabilizada graças a uma parceria entre a Secretaria Municipal da Educação (Smed) e o programa A União faz a Vida, do Sistema de Crédito Cooperativo (Sicredi), a cooperativa dos estudantes foi fundada na semana passada. Mas a meninada está envolvida com o projeto há mais tempo. Desde abril, recebem orientação e formação. Neste período, também criaram a logomarca da Cooperlúcia, eleita em um concurso. Agora, com a fundação e a constituição da diretoria, os alunos começam, de fato, a botar a mão da massa.
O primeiro produto da cooperativa será um repelente natural. A definição não foi por acaso. Os alunos fizeram uma pesquisa entre os moradores do distrito e identificaram que era a maior necessidade da comunidade, a 40 quilômetros do centro de Caxias. Assim que ficar pronto, o repelente será vendido. Parte dos recursos obtidos será destinada à atividades e melhorias no colégio e outra parte vai para um fundo da cooperativa.
— A gente vai trabalhar com os sócios, em brincadeiras, oficinas e em tudo o que a escola precisar, como reparos. O que precisar, a gente vai tentar ajudar para deixar a escola melhor — destaca Rubia Vergani, 12 anos, vice-presidente da Cooperlúcia.
O trabalho da cooperativa é feito no contraturno escolar. Em algumas tardes da semana, eles se reúnem para pensar em ações e estratégias. Uma delas, inclusive, que deve ser lançada em breve, é a criação de canais nas redes sociais. Com tantas tarefas, uma das lições que os alunos já aprenderam foi a organizar melhor o tempo.
— Agora temos de dividir os turnos, tirar um tempo para a cooperativa. É uma coisa que torna a gente mais responsável — frisa Daniel Zamboni, 14, presidente da Cooperlúcia.
Embora o andamento da cooperativa dependa exclusivamente dos alunos, uma professora os auxilia. Tatiana Dresch acompanha o projeto desde o início e já nota uma mudança na postura dos jovens.
— A gente percebe que eles estão mais autônomos. À medida que eles vão se apropriando, até a questão de liderança frente à escola acho que vai se desenvolver cada vez mais — avalia.
"É uma coisa incrível mesmo"
O desejo em formar uma cooperativa era antigo na Escola Santa Lúcia. Em 2018, a Smed aderiu, então, ao programa A União faz a Vida, o que possibilitou a criação da associação neste ano. Os alunos, que não faziam ideia do que era e como funcionava uma cooperativa, estão agora maravilhados.
— Está sendo uma experiência muito legal e diferente. A gente já aprendeu muita coisa e vai aprender muito mais ainda. É uma atividade única, que poucos têm a oportunidade, a gente está sendo o primeiro (colégio) em Caxias. E é uma coisa incrível mesmo — comemora o presidente Daniel Zamboni, que já pensa em seguir carreira profissional na Administração ou na Economia.
A primeira tesoureira, Larissa Zanardi, 12, está tendo a chance de exercitar o que mais gosta: a matemática. Os ensinamentos a ajudam, inclusive, a gastar melhor o seu dinheiro:
— Me ajuda a reservar, a saber gastar a quantia certa, me ajuda a ter o meu dinheiro mais organizado.
Para Rubia Vergani, um dos maiores aprendizados até agora está sendo aprender a trabalhar em colaboração:
— É algo que vai mudar a tua forma de agir, de pensar, pois a gente é sempre muito de trabalhar a competição, e a cooperação é algo totalmente diferente.
Se eles estão empolgados com a oportunidade, imagine os pais dessas crianças.
— Eles também tinham o desejo de que a gente, enquanto escola, tivesse um projeto nesse sentido, até pela realidade aqui da economia do distrito, então, estão todos muito felizes em que seus filhos estejam tendo essa oportunidade de vivenciar o cooperativismo e essa autonomia, esse protagonismo — conta Silvana Cagol, diretora da Escola Santa Lúcia.
107 cooperativas escolares no RS
São 107 cooperativas escolares no Rio Grande do Sul. Na área de atuação da Sicredi Pioneira, há 35 – já contando com a Cooperlúcia. Em outubro, serão 36, e duas em Caxias, com a fundação da Coopersete, na Escola Municipal de Ensino Fundamental Sete de Setembro, no bairro São Luiz da 6ª Légua.
A primeira cooperativa do projeto é da Escola Bom Pastor, fundada em 2010 em Nova Petrópolis, capital nacional do cooperativismo. A ideia era fomentar a doutrina cooperativa entre os jovens antes de ingressar no mercado de trabalho e criar uma nova geração de líderes comunitários.
Presidente do Conselho de Administração da Sicredi Pioneira, Tiago Luiz Schmidt, espera que mais escolas de Caxias do Sul possam fundar cooperativas nos próximos anos:
— Imagina quando essas pessoas se tornarem adultas. Não estou falando em ser ricas e bem sucedidas financeiramente, mas a possibilidade que a gente vai ter de ter melhores vereadores, prefeitos, melhores pai e mãe de família, empresários que se preocupam com seus funcionários, melhores consumidores, pessoas melhor preparadas e mais preocupadas com o bem-estar coletivo, com a autoajuda e a ajuda mútua, não só com interesses pessoais e particulares.
Outras duas escolas caxienses participam do programa A União faz a Vida: Cidade Nova e Ruben Bento Alves. Por enquanto, não há, conforme a Smed, planos de cooperativas escolares nelas.
— Vamos focar nessas duas (Santa Lúcia e Sete de Setembro). Quando se estruturarem, vão poder ajudar a criar novas cooperativas — diz Silvana Bioto, gerente administrativa da Secretaria de Educação de Caxias.
Confira as cidades da área de atuação da Sicredi Pioneira com maior número de cooperativas escolares:
> Nova Petrópolis: 7
> Morro Reuter: 4
> Feliz: 4
> Picada Café: 3
> Vale Real: 3
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