“Essa é a batcaverna”, anuncia o empresário Nei Sebben ao apresentar ao Pioneiro uma pequena sala aos fundos da autoelétrica e comércio de baterias que administra há mais de 30 anos no bairro Pio X, em Caxias. Ali, no discreto imóvel, ele também comanda a Trike Explorer, empresa que atua no conserto e fabricação de ultraleves.
Ao conciliar o hobby por aviação cultivado há mais de três décadas, o projeto paralelo surgiu naturalmente. O que inicialmente começou como uma exploração de nicho despretensiosa hoje praticamente detém o monopólio do serviço na região, pois não há concorrência. Ainda assim, ele afirma que manter uma produção “contida”, quase de garagem, lhe agrada:
– Eu não tenho registro, nem sequer divulgo e mesmo assim não dou conta da demanda. Se eu fosse entrar de cabeça iria ter que sacrificar minha paixão que são os aviões e começar a trabalhar em nível industrial. Às vezes até cogito expandir, mas, se ficar preso em construir e vender, vou deixar de fazer o que mais gosto: eu quero é voar – comenta.
Para dar conta da procura, outros dois amantes da aviação lhe auxiliam: o técnico em elétrica Gustavo Serafini e o militar da reserva Vilson Fortuna, que por mais de 30 anos exerceu atividades voltadas à área no 3º Grupo de Artilharia Antiaérea (3º GAAAe). O trio trabalha, em média, em quatro ou cinco aeronaves a cada 10 dias, de forma simultânea. Apenas cerca de 10% do serviço são terceirizados (pintura e dobras de tubos).
A maior parte dos atendimentos é para manutenção. Porém, por ano, são fabricadas – integralmente – média de cinco ultraleves, embora, conforme Sebben, “se produzíssemos um por mês, sairia tranquilo”.
– Começou como passatempo, hobby, e hoje trabalhamos à noite, sábados e domingos. Entre conciliar a autoelétrica e aqui acabo trabalhando das 7h à meia-noite – comenta Sebben.
A estrutura é modesta. Praticamente um minitorno, uma fresa, um balanceador de hélices e outras ferramentas de pequeno porte são suficientes para os três conseguirem montar o que denominam de “brinquedos”.
– Em Caxias tem uns 15 brinquedos (ultraleves). Há uns três anos, éramos em uns quatro ou cinco. Começou a surgir gente da região. Fazemos serviços para Bom Princípio, Feliz, outras cidades do Estado – explica.
Cada ultraleve tem média de 2 metros e 30 centímetros de comprimento (carrinho mais motorização) e mais de 10 metros de largura (asas). Sebben informa que os modelos fabricados pela Trike Explorer variam de R$ 25 mil a R$ 200 mil.
“Não é para ser barato. Não industrializar”
Por não possuir formalização como metalúrgica, a Trike Explorer acaba desenvolvendo trabalho num modelo quase cooperativo. Todos os clientes são amigos e colegas da prática do voo. A proximidade da relação e a paixão pela atividade tornam o trabalho, segundo Nei Sebben, mais dedicado aos detalhes.
– A mentalidade da indústria é diferente, com eles o método é “vamos vender barato e ganhar dinheiro”. Eu faço o contrário: não é para ser barato, apesar de ser, tem de fazer o melhor possível, peça por peça, quase artesanal. Não industrializar. Nosso trabalho é 100% metódico.
Esclarece:
–Nunca pensamos em pôr outra peça porque vai custar menos. Não pode pensar assim. O cliente pode se assustar no início, mas é a segurança dele, é uma engenharia muito delicada para arriscar.
No Brasil, explica, há apenas uma empresa do ramo registrada, a Trike Ícaros, em Garulhos (SP). Os modelos comercializados pela companhia paulista, no entanto, custam praticamente o dobro do preço praticado pela Trike Explorer, segundo Sebben.
–Quando você institui uma indústria, tem de homologar todos os processos de fabricação junto a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), cada aeronave já sai com nome da pessoa com prefixo. Tudo isso custa muito e é repassado para o produto – informa.
Para driblar a burocracia, a Trike Explorer fotografa todo o processo de fabricação, que passa por avaliação e recebe assinatura de engenheiro aeronáutico contratado pela empresa, que encaminha o processo para registro para a Anac.
CUSTOS E REQUISITOS
Faixa de preço
- Os ultraleves variam de R$ 25 mil (modelos simples, para uma pessoa), até R$ 1 milhão (importados).
- Para a maioria dos ultraleves não é necessário brevê (diploma de piloto), pois a legislação não obriga a certificação para pilotagem de modelos com menos de 200 kg.
- Os ultraleves têm custo baixo de manutenção. Nei Sebben estima que sejam gastos entre R$ 2 mil e R$ 3 mil para cada 200 horas de voo (média de três ou quatro anos).
Onde voar:
Na região, os ultraleves geralmente decolam ou pousam em uma pista na localidade de Vila Oliva, interior de Caxias, onde há uma faixa de 400 metros de extensão para aerotrekkings.