A exposição Magliani - Obra Gráfica pode ser definida como um convite à reflexão sobre as condições do ser humano, em suas características, contradições e embates. As respostas a essas indagações, no entanto, ficam a cargo do espectador que se permitir a entrar no universo sensorial criado pela artista pelotense Maria Lídia Magliani, que morreu no Rio de Janeiro, em 2012.
A partir desta terça-feira (5), na Galeria Gerd Bornheim, em Caxias do Sul, o público é convidado a conhecer e prestigiar cerca de 70 gravuras e pinturas produzidas durante a carreira de Magliani. Essas obras já foram expostas no Museu Leopoldo Gotuzzo (MALG), em Pelotas, e que irão percorrer o Rio Grande do Sul nos próximos meses.
— A obra de Magliani reflete sobre a condição do humano e não nos dá a resposta. Como a artista mesmo dizia: ela levanta perguntas. A resposta vem do olhar do espectador — define o curador da exposição, o gravurista Julio Castro.
Desde 2013, Castro se encarrega da preservação da memória e história de Magliani. Os dois dividiram o mesmo ateliê de arte durante 20 anos, no Rio de Janeiro, e mantinham uma relação próxima, não só de trabalho, mas também de amizade.
— Quando ela faleceu, resolvi procurar os herdeiros para criar um centro de referência da obra dela. Fizemos uma retrospectiva na Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre, em 2022, que foi bastante importante para promover a obra dela, porque é uma artista que teve uma enorme importância na pintura gaúcha dos anos 80, mas caiu no ostracismo. Ela teve uma vida muito difícil. Faleceu sem ter o devido merecimento sobre a sua trajetória. Então, o meu intuito sempre foi de resgatar esse legado — explica o curador.
As obras, que expõem um caráter expressionista, trazem a figura humana com diferentes elementos, desde plantas, até um bule amassado, provocando no espectador um certo incomodo. Esse estranhamento sensorial pode ser visto como um portal para acessar a essência humana, na visão da artista.
— Ela traz essa coisa visceral, essa figuração forte, carregada de um sentido bastante pessoal. A obra dela é muito marcada de uma forte sensação de contundência, de expressão visceral da imagem, da figura humana. A maior parte da produção que está aqui foi feita de 2009 em diante, quando eu fui impressor dela — destaca Castro.
Divida em séries, a exposição traz um breve histórico sobre a vida e obra de Maria Lídia Magliani. Em seguida, o visitante é guiado ao conjunto de obras Todos e, depois, a série Cartas, a maior da exposição, que se caracteriza pela desconstrução visual.
— Ela também se caracteriza por uma certa fragmentação do espaço, ou seja, dá para perceber, se olhar a sequência, que não há uma linha de horizonte, onde a figura não está no primeiro plano, não há um fundo característico... Tem muito esse caráter de algo que esteja em trânsito — explica o curador.
Por fim, a série Procura-se, produzida para a última exposição de Magliani, que traz retratos expressionistas.
— Procura-se tem muito esse caráter do retrato insólito, até um certo desconforto nesse retrato. No lugar da cabeça entra um galho, um serrote, uma planta... Eu vejo isso, hoje, como uma certa pauta de despedida, tem uma pintura dessa série que ela titula como Flora Repousa, uma espécie de autorretrato. É uma figura feminina e no lugar da cabeça, ou por trás da cabeça, tem plantas que nascem desse pescoço — descreve Castro.
A exposição fica em cartaz em Caxias até o dia 23. Depois, Magliani - Obra Gráfica vai passar por Santa Maria e Porto Alegre. A itinerância é uma parceria entre o Instituto Estadual de Artes Visuais (IEAVi), equipamento da Secretaria de Estado da Cultura (Sedac) e o Serviço Social do Comércio (Sesc/RS) e tem o objetivo de promover o incentivo à produção, a difusão e a circulação das artes visuais no território gaúcho.
Arte de rua
Nesta quarta-feira (6), em parceria com o Vielas Espaço Cultural, no bairro Euzébio Beltrão de Queiroz, a obra de Magliani será protagonista da colagem de lambe-lambes da xilogravura Bailado (2009), no muro do cemitério. O lambe é uma ampliação da obra da artista, produzido na técnica do stencil, com 182 cm. São 20 partes pintadas em tinta spray sobre papel que somadas formam a imagem final no muro. Atividade aberta ao público.
Saiba mais sobre a artista
- Maria Lídia Magliani (1946 - 2012) nasceu em Pelotas e morreu no Rio de Janeiro;
- É uma das primeiras mulheres negras a se formar em Artes pelo Instituto de Artes em Porto Alegre;
- Magliani foi pioneira em construir uma trajetória dedicada à arte;
- Em 1966, ainda estudante, realizou sua primeira exposição individual na Galeria Espaço, em Porto Alegre, tendo o professor Ado Malagoli como seu incentivador;
- Ao longo do tempo, Magliani tornou-se uma figura emblemática de sua geração, pois realizou várias exposições de sucesso nas décadas de 1970 e 1980.
Programe-se
- O quê: Magliani - Obra Gráfica, com curadoria de Julio Castro.
- Onde: Galeria Municipal de Arte Gerd Bornheim (Rua Dr. Montaury, 1333 - Centro, Caxias do Sul);
- Quando: desta terça-feira (5) até o dia 23 de março. Visitas de segunda a sexta-feira, das 8h às 18h, e aos sábados, das 10h às 16h.
- Quanto: entrada franca.