É no coração que, ainda que metaforicamente, surgem os sentimentos que melhoram vidas. E é no coração do bairro Euzébio Beltrão de Queiroz, em Caxias do Sul, que um lugar está mudando realidades de moradores e trabalhando na oferta de uma estrutura que os permitam sonhar com um futuro de sonhos realizados.
Desde abril de 2022, o Vielas Espaço Cultural tornou-se mais do que um ponto de encontro e convivência de amigos. Apesar do pouco tempo e de uma reformulação que ainda está longe do que os idealizadores pretendem entregar, o local já é o símbolo de uma comunidade, e oferece cursos profissionalizantes para mulheres e adolescentes, além de iniciativas sociais que abordam temas bem presentes no cotidiano de quem vive por lá.
Conforme lei sancionada em outubro de 2023 pelo prefeito Adiló Didomenico, o Vielas é considerado, inclusive, espaço de utilidade pública, título que permite a participação de parcerias com órgãos públicos municipais, institutos e fundações.
Nascido, criado e com uma vida toda ligada ao bairro, Fernando Morais, 42 anos, é o presidente da Associação de Moradores (Amob) para a gestão 2023-2025, e está à frente também do Vielas. Ele conta que um dos objetivos da atual gestão é criar caminhos para que as pessoas tenham dentro da própria comunidade possibilidades de estudar, buscar uma profissão e, até mesmo, encontrar amparo para dificuldades.
— O movimento surgiu da necessidade que a própria comunidade tinha. Pegamos um imóvel que não era utilizado, reformamos e hoje já está até pequeno, pelas demandas que apareceram. Já oferecemos oficinas de pintura, curso de barbeiro e marketing digital e o projeto Mulheres Visíveis, quando algumas profissionais vieram trazer informações sobre a Lei Maria da Penha para as moradoras. A estrutura atende quase 24 horas por dia, inclusive concentrando cestas básicas e com outras iniciativas no lado social — explica Morais.
Entre as parcerias que ajudam a sustentar as atividades estão empresas como a uPrime Marketing Digital, que forneceu computadores e os profissionais que ministraram os cursos, e a Barbearia La Firma, do bairro Desvio Rizzo, que deu toda a estrutura para as aulas de corte de cabelo e barba, ministradas no Vielas. O presidente da Amob também reforça a atuação junto ao público jovem, um dos grandes focos do projeto, com ofertas sempre no contraturno escolar dos estudantes.
— Temos um objetivo muito claro de investir na infância e na juventude, inclusive com alguns garotos que participaram das primeiras oficinas já atuando como menor aprendiz ou prestando serviços nas áreas que se qualificaram. No ano passado recebemos até uma menina que veio da região central participar da oficina de desenho, o que mostra outro lado do que buscamos aqui, que é apresentar o Beltrão de Queiroz como um lugar receptivo, que acolhe a todos, e não a zona ruim da cidade — esclarece o presidente.
No ímpeto de atrair visitantes e turistas, o Vielas pretende criar um hostel dentro da comunidade, o que, segundo Morais, irá movimentar a economia local e fortalecer quem empreende.
Arte de rua como turismo
Escondidas e dispersas pelas ruas estreitas do Euzébio Beltrão de Queiroz, 52 grafites em muros e imóveis constituem uma rota de arte urbana a céu aberto. As pinturas, que surgiram como o projeto Mosaico da Quebrada, partem para uma nova fase, contando com uma revisão no formato, por meio de uma visita guiada para os amantes da arte urbana.
De acordo com o presidente da Amob, parcerias com entidades irão proporcionar em breve a consolidação do que já existe informalmente, gerando mais uma oportunidade de intercâmbio na comunidade, desta vez por meio do turismo.
— Muita gente hoje consome e se interessa pelo grafite, e nós já estamos com algumas ações na área. Agora, vamos fazer com que todo mundo possa conhecer a história e os artistas que ajudaram nos desenhos — conta Morais.
Primeiros sonhos já tomam forma
Atento e sem vergonha de se comunicar, o estudante Neemias Morais, de 16 anos, é uma das provas de que o Vielas já rende frutos. Ele estava nas primeiras turmas do curso de marketing digital e, depois das aulas, ingressou em uma empresa do setor como menor aprendiz.
— Eu nem queria fazer o curso, pensava que era coisa de adulto e tal. Minha mãe que me inscreveu. E o curso me apresentou o que hoje eu amo, que é o marketing. Muito também pelos professores, como eles passavam o conhecimento, tudo bem prático. Quero continuar na empresa onde estou e, também, trabalhar de forma independente. Já pesquisei alguns cursos e faculdades daqui e quero muito continuar estudando – projeta Neemias.
De máquina à mão para atender mais um vizinho, Erick Renan Fagundes, 15 anos, já se considera um barbeiro. O jovem morador da comunidade aprendeu a profissão em uma das iniciativas do Vielas, e já presta serviços dentro do bairro. Com o auxílio de amigos e do próprio projeto, adquiriu os equipamentos necessários para o trabalho, e quer seguir na área para poder gerar renda.
— Cobrar, ainda não cobro. Mas o pessoal sempre acaba contribuindo. Aprendi a cortar cabelo e fazer barba no curso e gostei muito. Minha ideia é ir melhorando e investir nisso — revela Erick.
De acordo com o planejamento do Vielas, em 2024 os cursos seguirão sendo oferecidos, ampliando para o público feminino, com oficinas de maquiagem e manicure.