
Em uma sessão marcada por gritos de ordem e declarações contundentes contra o prefeito Daniel Guerra (PRB), artistas e produtores culturais tomaram os assentos e corredores do plenário da Câmara de Vereadores, na manhã da terça-feira, para protestar contra o corte de verba do Financiarte e também acusar a administração municipal de estar descumprindo a lei que obriga que os recursos destinados ao incentivo cultural não sejam inferiores a 1% da receita proveniente da arrecadação com o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) e com o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). A polêmica está no fato de a verba para este ano ter encolhido significativamente em relação aos três anos anteriores, passando de R$ 2 milhões para R$ 600 mil em 2017. Com isso, somente 18 projetos puderam ser contemplados entre os 184 inscritos, sendo que 69 haviam sido recomendados pelas Comissões de Avaliação, Seleção e Fiscalização (Casf).
Citando a lei 6.967, de 30 de julho de 2009, que transformou o antigo Fundo Municipal de Apoio à Produção Artística e Cultural (Fundoprocultura) em Financiarte, o vereador Rafael Bueno (PDT) utilizou o espaço do Grande Expediente para lembrar da resposta a um pedido de informações encaminhado ao Executivo questionando o total de impostos arrecadados até setembro e o que efetivamente deveria ser destinado ao Financiarte 2017.
_ Em resposta oficial, o secretário de Gestão e Finanças, João Alfredo Duarte Filho, informa os valores arrecadados até setembro de 2017 (R$ 181.104.194,03), o que já garante ao Financiarte um investimento superior a R$ 1,8 milhão, e que, até dezembro, poderá bater na casa de R$ 2 milhões, devendo o saldo ser depositado no Fundo Especial de Cultura (FEC), conforme determina o artigo 7º da lei. O secretário disse também que a Casf é soberana, cabendo a ela a decisão da escolha dos projetos a serem beneficiados _ disse o pedetista, recordando ainda a lei orçamentária aprovada no fim do ano passado para o exercício de 2017, segundo a qual a previsão total para o edital do Financiarte foi de R$ 2.468.798,55.
Às 16h, Bueno e representantes da classe artística entregaram uma representação "elaborada por diversas mãos", segundo o parlamentar, à promotora do Ministério Público (MP) Janaína De Carli dos Santos. O documento, redigido com a supervisão da assessoria jurídica do Conselho Municipal de Políticas Públicas, solicita o cumprimento da lei do Financiarte, lembrando "que o tempo é escasso, uma vez que os valores devem ser empenhados até o início de dezembro".
O Pioneiro tentou contato com os secretários da Cultura, Joelmir da Silva Neto, e de Gestão e Finanças, João Alfredo Duarte Filho, e foi informado, por meio de suas assessorias, que eles estavam em reunião e retornariam quando possível, o que não ocorreu até o fechamento desta edição.
"Isso é descumprir a lei"
Além de Rafael Bueno, vereadores de diversos partidos entraram na discussão. Gustavo Toigo (PDT) classificou a diminuição da verba como "um escárnio com a população de Caxias do Sul".
_ É um verdadeiro desmonte do que havia sido construído a muitas mãos. É muito grave esse distanciamento do poder público com as ações culturais do nosso município. Nunca tivemos tão poucos projetos aprovados _ comentou o pedetista.
_ Isso é descumprir a lei. Esse secretário interino também não vai aguentar esse desmonte da máquina pública _ emendou Alberto Meneguzzi (PSB), após ler um trecho da crônica da escritora Natalia Borges Polesso publicada na terça-feira no Pioneiro.
Rodrigo Beltrão (PT) lembrou da criação da Secretaria Municipal da Cultura, em 1997, e, posteriormente, da transformação do prédio da antiga Cantina Antunes no Centro de Cultura Ordovás. Também recordou da criação do então Fundoprocultura, que depois passou a ser denominado Financiarte, que possibilitou a descentralização dos recursos.
_ Cá estamos nós agora discutindo um retrocesso de, no mínimo, 20 anos.
O petista também citou o corte do Ministério da Cultura pelo presidente Michel Temer (PMDB) em um de seus primeiros ato de seu governo interino, no ano passado:
_ É o que vem logo na sequência. O prato principal é cortar a Secretaria da Cultura. Pra esse governo que não tem alma, não tem coração, só tem a carcaça, cultura é custo. A educação é custo, porque afinal os professores estão ganhando demais. E o prefeito não faz nenhum gesto de diálogo.
_ Essa casa tem sido o desaguadouro de um governo que não dialoga, que não conversa, que tenta massacrar os trabalhadores e colocá-los como culpados da crise _ completou Ana Corso (PT).
Alvo de críticas da plateia e dos colegas, Chico Guerra (PRB) e Renato Nunes (PR) não se manifestaram durante toda a sessão.
Outros temas
Além do Financiarte, Rafael Bueno levou para a tribuna outros dois temas: a não publicação do edital deste ano do Prêmio Anual de Incentivo à Montagem Teatral, cuja verba de R$ 255.842,70 estava prevista no orçamento geral da Secretaria da Cultura na rubrica "premiações culturais, artísticas, científicas, esportivas e outras" e a não participação da Secretaria Municipal da Cultura em edital da Secretaria Estadual de Cultura que disponibilizaria R$ 150 mil a municípios que preenchessem determinados requisitos. Bueno citou entre os exemplos de municípios da Serra que receberam a verba Jaquirana, Picada Café, Bento Gonçalves e Nova Prata.