Tal qual a personagem de seu livro A Moça Tecelã (Editora Global, 20 págs., R$ 45), a escritora Marina Colasanti também tece mundos. De suas mãos brotam contos, crônicas, poesias, ensaios, obras para crianças, para jovens e para adultos, textos que abordam o feminino, a arte, os problemas sociais, o amor, a vida — já são mais de 60 livros desde a estreia nesse universo, em 1968. Aos 80 anos, completados no último dia 26, a escritora desembarcou esta semana em Caxias do Sul para uma maratona de atividades na 33ª Feira do Livro, que incluiu um bate-papo com o público, na sexta-feira, e terá ainda uma mesa de poesia, neste sábado, e outra sobre o Prêmio Hans Christian Andersen, no domingo – ambas abertas e com participação gratuita.
E se os leitores comemoram a vinda dessa que é uma das mais premiadas escritoras do país (são oito Jabutis, quatro Orígenes Lessa, dois Monteiro Lobato e diversos selos de livro Altamente Recomendável da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil, a FNLIJ, entre outros), ela também sente-se satisfeita em voltar a Caxias.
– Eu já conheço e amo intensamente essa região. Ao chegar, me sinto em casa – garante Marina, italiana de nascimento mas que se mudou para o Brasil ainda criança.
Escritora, ilustradora e tradutora, Marina é múltipla. Acaba de lançar Quando a Primavera Chegar (Editora Global, 112 págs., R$ 39,90). Recebe em novembro o troféu do 13º Prêmio Ibero-Americano SM de Literatura Infantil e Juvenil, do qual foi anunciada vencedora mês passado (e que deve reforçar a presença de seus livros nos países de língua espanhola). Publica crônicas semanais no seu site. Percorre o país participando de feiras e outros eventos literários. E escreve, sempre com novos projetos.
Confira a entrevista ao Almanaque:
Almanaque: A senhora está completando 80 anos de vida e tem quase 50 de carreira como escritora. Como vê a evolução da literatura brasileira nesse período?
Marina Colasanti: Para período tão longo nosso espaço não basta, seria necessário um artigo crítico ou um ensaio! Apontarei apenas alguns pontos: a quantidade de livros editados aumentou enormemente (mas os livros literários não aumentaram em igual proporção); a presença das mulheres se tornou mais visível; melhorou grandemente a qualidade, gráfica e de conteúdo, da literatura infanto-juvenil.
Aliás, o leitor de hoje é semelhante ou diferente do leitor de quando a senhora começou na literatura, no final dos anos 1960?
Essa entidade "o leitor" não existe. Cada leitor é um leitor diferente, com suas inquietações, seus interesses e suas perguntas. Espero que cada leitor de um livro meu faça sua própria leitura, se aproprie do texto como se o tivesse criado. Se isso responde à sua pergunta, o meu primeiro livro (Eu, Sozinha), editado em 1968 , está sendo reeditado agora.
"Quando a Primavera Chegar" é descrito como um conto de fadas. Isso significa que ainda existe lugar para a magia, mesmo em meio a todas as dificuldades da realidade atual?
Não se trata de magia. Meus contos de fadas não têm fadas. Trata-se de linguagem simbólica, cuja penetração é a mais ampla, e para a qual sempre haverá lugar.
Qual o papel da literatura infantil?
Alimentar a formação. E preparar os futuros leitores adultos.
Pesquisas como a Retratos da Leitura no Brasil mostram que o brasileiro ainda lê pouco. O que é preciso para mudar esse cenário?
Todo mundo sabe o que é preciso, há décadas estamos falando disso e elencando os elementos necessários. E apesar disso, pouco ou quase nada mudou. Talvez seja uma surdez nacional. Portanto, serei bem objetiva, precisa-se de uma coisa só : vontade política.
Qual o papel dos professores nesse contexto? E dos pais?
Só professores leitores, apaixonados por leitura, fazem crianças leitoras. Quando os pais são leitores sabem perfeitamente o que fazer. Quando não o são, podem contar para os filhos as histórias que conhecem, as que lhes foram contadas, ou contar o seu passado, a sua própria infância, histórias da família. Narrativas impulsionam o desenvolvimento e podem, adiante, levar ao encontro com os livros.
Qual a importância do contato entre escritor e público proporcionado por feiras do livro, como esta da qual a senhora participará aqui em Caxias do Sul?
É o momento em que o leitor pode fazer perguntas diretas ao autor. E, sobretudo, é quando o livro ganha plena visibilidade, é exibido como um objeto de desejo, publicizado, torna-se — ainda que por poucos dias – parte do cotidiano.
A senhora escreve, ilustra, traduz. Qual dessas atividades lhe dá mais prazer? Por quê?
Se alguma delas não me desse prazer não a exerceria, posto que ninguém me obriga. Eu preciso de todas elas e com todas elas me realimento e me enriqueço.
Quais são os seus próximos projetos?
Um livro de poesia para adultos já está com a editora e sairá em meados do ano próximo. Um livro de poesia para crianças já está sendo ilustrado pelo insuperável xilogravador Rubens Grilo. E eu não paro de escrever, e de fazer projetos de livros (mas só falo deles quando estão prontos!).