Qualquer um de nós, em algum momento, já se deixou levar pela magia do cinema. Quem esquece o primeiro filme que assistiu numa tela maior que o próprio quarto? Em algum momento, qualquer um de nós foi dormir feliz por ter realizado um sonho. Não é sempre que a vida nos permite cumprir os compromissos que marcamos com os nossos sonhos, afinal. Na última sexta-feira, Antônio Rosalvo da Silva realizou um sonho acalentado ao longo de seus 60 anos: assistir a um filme no cinema.
O escolhido foi Saneamento Básico (2007), comédia dirigida pelo gaúcho Jorge Furtado e estrelada por atores e atrizes que Antonio só conhecia das novelas que assiste com a mulher, como Camila Pitanga, Lázaro Ramos, Wagner Moura e Fernanda Torres. A exibição era parte da Semana do Meio Ambiente em Caxias. A sessão exclusiva para pacientes renais atendidos pela Rim Viver, oferecida pela Unidade de Cinema e Vídeo da Secretaria da Cultura, não foi exatamente uma novidade. Seu Antonio é que é novidade na ONG, onde ingressou oito meses atrás.
Portador de doença renal há oito anos, o construtor civil aposentado por invalidez –as costas não aguentaram o trabalho pesado – iniciou as sessões de hemodiálise no ano passado, na mesma época em que passou a frequentar a entidade sediada em frente ao shopping San Pelegrino. No mês que vem, fará os últimos dois exames para entrar na fila de transplante.
– Sempre quis conhecer o cinema, só que nunca se ajeitou, sabe? Sou muito caseiro – comenta, como quem nunca teve muito aí pra isso.
De falas curtas, Antônio expressa seu encantamento pelo olhar, o maior emissário da alma. Foi assim no trajeto a pé até o Centro de Cultura Ordovás, com as mãos enfiadas nos bolsos da jaqueta para proteger da tarde gelada, seguiu assim enquanto se divertia com a impecável atuação de Paulo José, responsável pelas falas mais engraçadas do filme, e não foi diferente ao acender das luzes na sala de cinema.
– Muito bonito – limita-se a comentar para a amiga e colega Eva Silveira, que o acompanhou no caminho de volta.
– Da próxima vez quero trazer minha esposa – acrescenta.
Amigo de Antônio e presidente da Rim Viver, Evandro Neckel resumiu a satisfação de proporcionar aos colegas renais aquela tarde, proposta pelo educador social Samuel Oliva.
– Quando o paciente chega até nós, a primeira coisa que fazemos é mostrar a ele que a vida não acabou. O convívio através de atividades como oficinas de artes e culinária, rodas de conversa e cinema, ajuda a devolver a autoestima e o prazer das pequenas coisas – reflete.
Durante 12 horas por semana, divididas em três dias, Antônio Rosalvo está preso a uma máquina. Nas outras 156 horas da semana, a vida segue plena e convidativa a novos sonhos.