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Na abertura da 26ª Feira do Livro, evento que se encerra neste domingo, a coordenadora Luiza Motta destacou uma imagem que havia presenciado há pouco. Uma senhora sorridente, com os braços abertos, contemplava a montagem da estrutura que abrigou os estandes.
Mas não se tratava de uma fã qualquer: era Maria Helena Balen, patrona do ano passado. Essa imagem poética, quase nostálgica, mostra como quem já foi homenageado pela Feira sente uma emoção especial a cada edição, diferente se comparada à experiência dos simples admiradores de livros que frequentam o espaço.
E nos 26 anos de história, apenas 24 padrinhos e madrinhas podem relatar essa história com uma intimidade peculiar.
- Cada vez que passo na praça lembro de tudo que vivi. Vibro tanto porque cada vez a Feira está maior, ela é um pouco da gente - afirma Maria Helena, radiante.
Mas a escritora está longe de viver só de doces lembranças. Acredita estar acompanhando a Feira até mais do que antes. Adora encontrar-se com as amigas para um café, prestigiar lançamentos e bate-papos literários.
Depois de ocupar lugar de destaque, gosta de, como público, aproveitar a ocasião para aproximar-se do universo da literatura e de seus produtores - no final das contas, a grande finalidade da Feira.
Patrimônios da praça
Ao melhor estilo low profile, o patrono de 2008, Eduardo DallAlba, observa com satisfação o crescimento da Feira, tanto em tamanho físico quanto em produção bibliográfica local. O autor se vê como colaborador "direto ou indireto" disso. Feira do Livro, para ele, não é sinônimo de nostalgia. Ser patrono está mais relacionado à tarefa do que ao glamour em si:
- A satisfação é menos pela vaidade do que pelo trabalho - define DallAlba, discreto.
Entre as características de sua gestão, o próprio destaca sua relação próxima com o evento. Receber o público e os livreiros e participar efetivamente das atividades são marcas das quais se orgulha.
Satisfação compartilhada pelo antecessor, Paulo Ribeiro. O autor diz que em 2007 conseguiu se envolver bastante com o encontro literário e, desde então, nunca deixou de fazê-lo.
- O patrono tem o sentimento de que passou a pertencer à Feira, como um patrimônio. Se ele interage e se integra, acaba sendo uma atração a mais - acredita. DallAlba relembra o esforço da atividade:
- Trabalha-se muito, é cansativo ser patrono, no sentido de utilidade. A percepção, no entanto, nunca é a mesma.
- A tua Feira se renova a cada ano, na convivência volta tudo - afirma Paulo Ribeiro.
Conquista expressiva
O jornalista e escritor Jimmy Rodrigues dedicou quase toda a vida a descrever o cotidiano de Caxias do Sul. Atuou por mais de 60 anos na imprensa e, ao longo de 85 anos de vida, recebeu diversas homenagens. Entre elas, a de patrono da Feira em 1987.
- Conseguir escrever um livro é uma conquista expressiva, em um Brasil que lê pouco. Promover o livro em praça pública é muito bom - afirma Jimmy.
Hoje, com a saúde debilitada, ele conta que sente falta de passear entre os corredores armados na praça Dante Alighieri e lamenta ter problemas que o impeçam de ler, pois, além de produtor de textos, costumava ser um leitor voraz. Não menos apaixonada pelos livros, a historiadora Loraine Slomp Giron é um contraponto.
Diz que não notou grandes mudanças na sua ligação com a Feira desde que se tornou patrona, em 1997. Por um motivo simples:
- Não faz muita diferença para mim. Muito antes de ser patrona já amava os livros.
Quando era guria sempre visitava a feira de Porto Alegre. Mas, segundo ela, naquela época o ofício de patrono tinha uma responsabilidade diferente do "trabalho árduo" relatado por DallAlba.
- A gente só era homenageada e pronto, não precisava ficar trabalhando. Hoje penso: que alívio que é outra pessoa! - ri.
Sensação de posse
Outra das cinco integrantes do elenco feminino de patronos da Feira, Cleodes Maria Piazza Júlio Ribeiro é bem mais entusiasmada do que Loraine.
- A sensação de território, como lugar que nos pertence, é única - afirma Cleodes, madrinha de 2005. Paulo Ribeiro a endossa:
- A relação muda depois de ser patrono. Ela vira a "nossa Feira", passa a ser zelada, cuidada com carinho.
Hoje, Cleodes sente uma intimidade com o evento pouco partilhada por outros. Admitindo uma certa vaidade, diz que esse lugar especial é reservado aos que tiveram o privilégio de ser homenageados de tal forma. E será que ela gostaria de ser patrona mais uma vez?
- Sem pudor, me lançaria à reeleição - gargalha.
- Gostaria de ser reeleita, sim - admite também Maria Helena.
Enquanto a possibilidade não se concretiza, o patrono de 2010, Marcos Fernando Kirst, despede-se lentamente do reinado. Ele não acredita na figura do ex-patrono, visto que as pessoas escolhidas para ocupar o posto têm um vínculo estreito tanto com o livro quanto com o evento.
- Passa a existir uma ligação íntima, de um padrinho eterno.
E, se a saudade já está batendo, basta esperar 2011 para reviver toda essa alegria. Afinal, a Feira pressupõe uma relação de reciprocidade: se renova a cada ano naqueles que são homenageados por ela.
Cultura e Lazer
Patronos da Feira do Livro de Caxias revivem o sentimento de apadrinhamento a cada edição
Evento se encerra neste domingo
Tríssia Ordovás Sartori
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