Guardo até hoje um CD que encontrei na pilha de relíquias que ficava na estante do antigo apartamento onde morava com meus pais. A recordação é fresca como se o tempo fosse curto: na capa, o cabelo volumoso da cantora Simone e o número 25 entrelaçado com o seu nome em um design inovador para a época. O curioso é que eu nunca procurei nada sobre ela e nem escutei suas outras músicas, mas aquele CD foi o meu favorito durante anos.
Enquanto meu pai jogava futebol nos sábados à tarde, minha mãe e eu ficávamos no carro esperando o fim da partida e era ali onde escutávamos todo tipo de música – quanto a isso, aliás, duas considerações: 1) aquele era um tempo onde Netflix não existia; 2) preciso admitir que o nosso gosto musical sempre foi um pouco duvidoso. Foi assim que eu soube quem era a Celine Dion e a Shania Twain (mas também o SPC e o Rick & Renner), e da mesma forma fui apresentado para a Simone, que para mim era um tipo de Mamãe Noel que precisava ser escutada religiosamente a cada final de ano. Todas as músicas daquele CD me faziam acreditar que o Natal era uma espécie de redenção, um bota fora extremamente necessário para qualquer pessoa – fosse a minha mãe e seus 40 anos, fosse eu e meus 12. Até porque, a pergunta da Simone era clara e direta: “então é Natal... E o que você fez?”.
Nem sempre eu soube responder. Acho que só parei de fugir da pergunta quando já era mais velho e o exercício de olhar para um ano inteirinho que está logo ali, detrás da gente, traz a ideia do quanto precisamos suar e correr para enfrentar alguns demônios – aqueles que surgiram ao longo das semanas enquanto enchíamos a cara nas sextas e nos sábados para lutar tudo de novo na segunda, e assim sucessivamente. Sendo assim, a minha resposta para a Simone sempre foi uma só: muito. Eu fiz muito, dona Simone. Eu fiz tanto que nem deu tempo de reparar o quanto fiz, a não ser agora que dezembro bate na porta e eu mal tenho hora livre para erguer uma árvore de Natal.
Contudo, mesmo não sendo novidade para ninguém, este ano foi diferente. Pela primeira vez eu não procurei pelo CD da Simone porque fiz questão de encontrá-la no Spotify (tempos modernos, sabe como é). Eu também tive mais brechas na agenda (existiu uma?) para montar a minha árvore (era novembro e ela já estava impecável e piscando noite após noite). Por fim, talvez não tão inesperadamente assim, a minha resposta não foi a mesma quando escutei ela cantar.
Então é Natal... E o que você fez?
Encarei o celular como se encarasse a própria Simone e atrás de mim o ano mais longo e curto da história sussurrou a resposta por mim: olha... Eu não fiz muito, mas tenho certeza de que fiz o suficiente.