Rainha da noite, a Lua é mãe de todas as histórias. Sob seus raios, desfiam-se infindáveis causos encantados ao redor do fogo campeiro, contos de fadas emendam-se ao pé das camas infantis, enquanto suspiros de fantasia criam um particular luar dos amantes. Ah, a Lua e o amor! Seresta de apaixonado tem que ter por testemunha esse lume celeste, como a endossar os sortilégios da paixão. Quem ama à distância certamente pensa que seu bem também estará a mirar a mesma Lua, que passa a ser ponte de sonho de união. Enfim, a mutável Lua combina com as fases e ondulações do amor, embora seja Vênus o planeta regente do tema.
O magnetismo lunar é tal que certos viventes, no transe da contemplação, caem de amor pelo próprio astro. Que o digam os poetas. Lua Bonita, uma velha cantiga de 1953, ilustra isso. Composta pelo paraibano Zé do Norte, em parceria com Zé Martins, assim começa: “Lua bonita / Se tu não fosses casada / Eu preparava uma escada / Pra ir no céu te buscar / Se tu colasses teu frio com meu calor / Eu pedia ao Nosso Senhor / Pra contigo me casar”. Pena que há um São Jorge, marido da Lua, nesse triângulo amoroso...
Mas o contrário também pode acontecer, quando a Lua se apaixona por algum humano. Está lá na mitologia grega a história de Selene e Endimião. Selene era a primordial deusa lunar, irmã de Hélio, diurno senhor do Sol, e de Eos, responsável pela aurora. Um dia, ou melhor, uma noite, Selene deu fé de um jovem adormecido na entrada de uma gruta. Era Endimião, belíssimo camponês, que, cansado do pastoreio, sucumbira ao sono. Selene vidrou na formosura do rapaz!
E agora? Como resolver a paixão de uma deusa por um mortal? Há muitas versões para essa história, mas é consenso seu desenrolar final, em que Selene garantiu a duração de seu contemplativo amor por Endimião deixando-o a dormir eternamente. Eis a história de um belo adormecido que jamais desperta, por isso não envelhece nem morre. Conta o mito que Selene teve 50 filhas com Endimião, seu amado que só vivia no plano do sonho infinito.
Para além de elemento mágico do cenário, amada ou amante, à Lua também cabe um outro papel no contexto das relações amorosas: o de conselheira – ou aquela que traz o necessário alento às dores e ardores do amor. Cabe lembrar de um clássico do cancioneiro nacional, composto pela grande Chiquinha Gonzaga, Lua Branca. Qual cúmplice compassiva, a Lua é invocada: “Ó Lua branca / De fulgores e de encanto / Se é verdade que ao amor tu dás abrigo / Vem tirar dos olhos meus o pranto / Ai, vem matar essa paixão que anda comigo”.
Outra canção clássica, soberana das serestas – de quando havia galos, noites e quintais, não é, Belchior? – é Noite Cheia de Estrelas, difundida pelos vozeirões de Vicente Celestino e Nelson Gonçalves. O cantador apela: “Lua, manda tua luz prateada / Despertar a minha amada”. Mas não adianta, o socorro não vem, a amada segue dormindo: “Canto, e por fim / Nem a Lua tem pena de mim / Pois ao ver que quem te chama sou eu / Entre a neblina se escondeu”. E haja sofrimento à luz do luar.