Até a próxima sexta-feira (29) vou publicar aqui na coluna textos de artistas, professores e intelectuais caxienses (nascidos ou que escolheram a cidade para viver). Eles escreveram sobre os destaques nas áreas de cinema, música, literatura, teatro, dança e artes visuais.
Há desde recortes locais, do que foi realizado por aqui, mas também alguns deles quiseram ampliar o foco, trazendo à luz da cena destaques da produção mundo afora.
A convidada desta sexta-feira (22) é a Tefa Polidoro, pós-doutora em Teatro. Ela nos conduz a uma revisão do que ocorreu de melhor na área do teatro, segundo a seu olhar aguçado.
Boa leitura!
*Revisitando o teatro em 2023
Olá, Marcelo! Que alegria e honra ser lembrada por ti para elaborar uma retrospectiva referente à área do teatro no ano de 2023. Tentarei elencar alguns pontos que considero marcantes deste ano que finda. Vamos lá:
Inicio exaltando a recriação do Ministério da Cultura do governo federal, sob coordenação da cantora e compositora Margareth Menezes, e todas as ações propostas e editais retomados. Um país que não investe em cultura está dizendo ao mundo que não se interessa pelo próprio povo, pela sua produção subjetiva e pelas suas expressões. Isso é convite para qualquer extorsão ou exploração estrangeira. Remontar o ministério e trabalhar em políticas públicas culturais, neste sentido, significa, além de trabalhar para o fortalecimento da autoestima do povo, também investir na soberania nacional.
Graças a esta política que perspectiva a valorização da cultura, e também às parcerias público-privadas, tenho acompanhado o crescente número de festivais organizados por e para mulheres, principalmente ao que concerne no campo das comicidades e palhaçarias, espalhados por todo Brasil. Isso ajuda na consolidação das mulheres como trabalhadoras e agentes de cultura, além de gerar trabalho, bem-estar, e contribuir para a circulação da economia.
Por falar em mulheres artistas, um marco para 2023 é a atriz caxiense Tina Andrighetti e a circulação de seu trabalho cênico “Odila”. Este espetáculo conta um pouco da história de Odila Gubert, operária da Fábrica de Munições Gazola, em Caxias do Sul, que estava na explosão ocorrida em 1943. Tina nos convida a reconstruir algumas memórias da cidade no ato cênico, fazendo-nos pensar o quanto a história de uma mulher pode ajudar a contar a história de uma comunidade. Lindo e importante para quem se interessa em conhecer sobre o chão em que pisa.
Falando do chão em que se pisa, lembrei-me das palavras do psicanalista Timbor Simcsik, no livro “Códigos e Confissões Antropológicas”: “Olhava para onde estava pisando e tentava imaginar quantas pessoas já haviam pisado naquele mesmo chão. (...) Estava aprendendo que o meu caminho era o caminho do outro”. Respeitar e reverenciar a quem veio antes trilhando estradas para que o nosso caminhar, hoje, seja possível, tranquilo e prazeroso. Como não falar sobre a morte, a passagem, o encantamento de Zé Celso Martinez? Nosso mago antropofágico... A própria história do teatro brasileiro encarnada? Para mim não há nome mais brasileiro que Zé.
Assim como Zé não desbravou o trajeto do teatro nacional sozinho, também nós aqui não andamos sós. Alguns grupos e artistas que admiro e que promoveram muito teatro por nosso Brasil, neste ano, são: Cia Lá Luna (Canelinha/SC), Os Bufões de Olavo (João Pessoa/PB), As Preciosas Ridículas (Belém do Pará/PA), As Teodoras (Porto Alegre/RS), Coletivo NEGA (Florianópolis/SC), grupo Pavilhão de Magnólia (Fortaleza/CE), cia Buffa de Teatro (Salvador/BA), a pesquisadora e palhaça Daiani Brum (Santa Maria/RS), e Arthur Gomes/drag Suzanninha (Florianópolis/SC). Existem muitos outros, mas tentando respeitar meu limite de caracteres do texto me deterei nestes. Indico a quem leu até aqui procurar saber um pouco sobre seus trabalhos, histórias e sobre seus artistas envolvidos.
Finalizo minha breve retrospectiva na expectativa de que em 2024 o teatro seja maior: em número de público, em número de artistas, em número de estudantes, em número de professores, em número de pesquisadores, em número de espetáculos e festivais, ocupando espaço maior na vida de todo mundo.
Quanto mais gente fazendo, pensando e assistindo teatro, menos gente teremos pensando, fazendo e promovendo guerras.
* TEFA POLIDORO é artista da cena e pesquisadora. Atualmente é professora colaboradora do curso de Licenciatura em Artes Cênicas da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), em Florianópolis. Pós-Doutora , doutora e mestra em Teatro pela UDESC. Entre os anos de 2003 e 2009 integrou a Cia Teatral Atores Reunidos, de Caxias do Sul, sob direção de Raulino Prezzi.