Pois é, a chapa vai esquentar. Chapa quente é gíria. É sinal de perigo. É prenúncio do caos. Li nos portais da internet, inclusive em GZH, que uma supertempestade solar vai nos meter em apuros em 2024. Sim, logo ali. Entre os efeitos colaterais desse fenômeno climático está a pane geral da internet, gerando um pandemônio na rede elétrica, nos satélites, no GPS e nos equipamentos de comunicação por meses.
Eu não lembro bem como foi, mas os cientistas que estão monitorando essa ebulição solar disseram que esse mesmo fenômeno já ocorreu em 1859, ano em que Charles Darwin publicou A Origem das Espécies. Irônico, não?
Entediado, catei na estante Capão Pecado, do Ferréz. Comprei e nunca tinha lido. Curiosamente, tem tudo a ver com esse lance de a “chapa vai esquentar”. Te liga na sinopse: “Em Capão Pecado, as vidas valem muito pouco, quase nada. Tudo está sempre por um fio. Como escreve Ferréz, ‘o futuro fica mais pra frente, bem mais pra frente’. Tão pra frente que muitas vezes já é tarde demais”. Segue o fio:
— Já vi de tudo aqui no Capão, coisa que até o diabo duvida, mano, cê tá ligado?
— Sobrevivo comendo coisas que ganho, mano, e até reviro os lixo, é mó treta com os cachorro, cê tá ligado?
— Já fui esfaqueado duas vezes, mano; uma pelo Luís Negão e a última foi pelo Sandrinho e o China, uns moleque forgado da p*.
Ficção? Jogo contigo que esse mesmo diálogo acontece — com variações de enredo — diariamente, em Capão Redondo, onde Ferréz se inspirou, ou aqui mesmo em Caxias, pode escolher a quebrada que quiser.
A chapa esquentou mesmo foi no Rio de Janeiro (dentro e fora das quebradas). Putz, na última terça-feira a sensação térmica bateu recorde de 58,5°C. Nunca fui muito ligado em Matemática ou Física, mas procurei na internet (que sabe de tudo) e aprendi que numa cidade litorânea, como o Rio, a água ferve à temperatura de 100°C. Falta pouco pro sangue ferver, então. Aliás, Meu Sangue Ferve Por Você é a cinebiografia do Sidney Magal, que narra uma tórrida história de amor, exibida no Festival do Rio, ano passado. Irônico, não?
Ferréz é escritor e não profeta. Ano que vem, período em os cientistas preconizam a caótica supertempestade solar, ele vai celebrar 49 anos. A sina do cara (longe de ser encarada como ironia) é transitar pelo epicentro, bem perto de onde a chapa realmente esquenta e escrever:
“Todos veem, mas não querem enxergar que o futuro nos reserva mais dor, e nossa vida é como se estivéssemos sentados olhando pela janela de um avião que está caindo rapidamente. E tudo sempre esteve tão perto e tão longe”.
Pois é, Ferréz, com ou sem a supertempestade solar, a chapa vai esquentar.