Gilmar Marcílio
O poeta Fernando Pessoa, no Livro do Desassossego, escreveu: “Minha pátria é minha língua”. Além de ser um canto de exaltação à linguagem, é um instrumento de identidade, um convite para refletirmos o quanto o verbo define a nós mesmos. Ando pensando muito nisso ultimamente e os motivos são de ordem prática. Seguidamente vou até uma loja de conveniência para comprar algum alimento. São espaços ocupados principalmente por jovens, todos sabem. Pequenos grupos de moças e rapazes, invariavelmente com uma bebida na mão, riso aberto no rosto, demonstrando claros indícios de alegria. Acho bem bonito. A vida ainda os machucou pouco e grandes preocupações não acenam em seu horizonte imediato. Porém, algo preocupante pode ser observado quando nos detemos para ouvir o que estão dizendo: a absoluta indigência das expressões e o uso sistemático de palavras chulas. Estou tentando ser elegante, mas aos mais sensíveis e educados é um verdadeiro estupro verbal. Claro, ninguém costuma ir a esses lugares para filosofar, mas é preciso valer-se de tanta grosseria? E chamam a isso de comunicar-se. Sei lá, sou de uma época em que isso fere os ouvidos e demonstra a personalidade do autor. Exagero? Talvez, mas é tão admirável ver alguém fazer uso do idioma sem transformá-lo numa espécie de esgoto para exprimir ideias canhestras.
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