Terminei de ler o divertido romance “Você nunca mais vai ficar sozinha”, da escritora e roteirista Tati Bernardi. O título é instigante e ambíguo. Pode significar: ser mãe é o fim absoluto da solidão, pois elas jamais deixarão de se sentir responsáveis pelos seus filhos. Mas também representa a impossibilidade de se recolher em busca de algo estritamente pessoal, aquele prazer minúsculo – ver um filme, ler sossegadamente um livro – sem ser interrompida a todo momento por alguma reivindicação, principalmente na infância e adolescência. Nos últimos tempos esta vai se prolongando até os quarenta anos, aliás. Em outras palavras: toda escolha traz embutida uma renúncia, geralmente várias. A partir dessas observações surgidas ao término da leitura, lembrei de amigas e seus lamentos ao me dizerem como são constantemente cobradas por rejeitar a ideia da realização feminina sendo sinônimo de maternidade. Finda a idade fértil, passam ao largo do arrependimento por seguirem com seus propósitos. O da liberdade pessoal, por exemplo. Adoram ser donas de si mesmas. Entram e saem de casa a hora que bem entenderem, furtando-se de dar satisfação a alguém. Nada contra quem tenha resolvido obedecer ao mais arraigado instinto humano, fruto da biologia ou do condicionamento. Talvez dos dois.
São experiências diferentes, só isso. Ganha-se e perde-se em ambas as situações. Crianças são encantadoras, mas representam também uma prisão. Depende do que se espera da existência. Por outro lado, recusar-se a passar adiante os genes também pode dar, lá adiante, uma sensação de vazio. E, para muitas, o amor incondicional parece compensar as eventuais frustrações. O importante é sermos fiéis às nossas verdades. Arrependimentos inevitavelmente acontecerão, independente do caminho seguido. Porém, as cobranças sociais ainda são fortes. Quantos olham penalizados para essas pobres criaturas entradas na maturidade e não contando com o apoio de seres tão próximos! Bem, infelizmente, a realidade se encarrega de derrubar esse mito. Os asilos estão repletos de homens e mulheres abandonados, mesmo tendo diversos filhos. Embora você tenha se esmerado em dar-lhes educação, princípios éticos e tal, não há garantia de que esses seres tão amados permanecerão perto, segurando a sua mão ou apoiando-o financeiramente quando precisar. Bom caráter não é forjado pela consanguinidade.
A melhor conduta a ser seguida é fugir de qualquer conceito estanque só porque foi sedimentado pelos costumes. O estudo das sociedades evidencia maneiras diametralmente opostas de encarar a perpetuação da nossa raça. Enfrentar a angústia nascida desse dilema nos leva a algo genuinamente humano: exultar nossos acertos e perdoar o que, à luz do conhecimento e da experiência, já não se configura como um erro.