Tudo parece mudar o tempo todo. Não há mais pilares sobre os quais podemos depositar nossas certezas. O mundo passou a ser volátil, efêmero. O que agora vale como verdade, amanhã pode ser substituído sem nenhuma perda de credibilidade. O que você pensa que gera na maioria das pessoas? Ansiedade. E onde elas vão se apegar? Na religião. Antes de criticar, lembremo-nos que pode ser o último bastião para aqueles que não conseguem ver sentido em quase nada. Podemos estar aproveitando a realidade imediata, mas isso se esgota diante da primeira crise. Melhor apostar em Deus do que em algo que se desmancha no ar. Ou seja, nada parece ser sólido. Essa é uma das leituras possíveis de estarmos constantemente misturando o concreto com o transcendente. O apelo a “valores” que se sustentam pela vida afora, ultrapassando a duração de, por exemplo, o último modelo de IPhone, desejo de consumo de tantos. É muito arriscado apostar hoje em dia. Ao final da tarde, poderá ser considerado obsoleto. Quando investimos no eterno, o risco de nos equivocarmos é bem menor. Claro, é um salto em terreno desconhecido, mas para muitos continuará se justificando fazer essa entrega.
Tento ver com menos severidade essas manifestações de fé. Há muito charlatanismo, sem dúvida, mas isso parece se estender a quase todas as áreas em que o humano está presente. Qualquer tipo de culto tem um poder de catarse tremendo. Nem todos podem frequentar o consultório de um psiquiatra ou de um psicólogo. Padres e pastores acabam desempenhando esse papel. Sem contar que os ritos despertam uma sensação de pertencimento. E estar inserido numa comunidade, ser amparado diante do desânimo que assola a tantos, tem um poder terapêutico imenso. Podem estar dispostos até a pagar dez por cento de seu salário. Humano, demasiado humano. Substituir o incômodo da orfandade pela segurança não é pouco. Historicamente, podemos detectar vários momentos que servem de referência. A ruptura de uma realidade estável, geralmente através da revolução dos costumes, joga a população em uma espécie de desespero brando. E então será preciso ter apegos imediatos. Para a grande maioria, compensa a barganha, desde que o chão em que pisavam lhe seja devolvido.
Aí surgem as teorias conspiratórias e que pareciam ter sido abandonadas há séculos. Tudo para unir novamente em grupo quem está se sentindo perdido. Você começa a acreditar em terraplanismo, nos malefícios das vacinas, na concepção de que o universo foi criado em sete dias, etc. O interessante é que sempre encontrará multidões dispostas a confirmar essas pseudoverdades. Paciência. Em breve o pêndulo se inclinará para o outro lado. Evoluímos muito e esses aparentes retrocessos são pontuais. Vão-se os governos e os messias. Fica a capacidade de raciocínio. De alguns, pelo menos.