É deveras interessante a maneira como muitas pessoas estão se designando no universo virtual. A mais recorrente é essa: Fulano de tal, vive na cidade de, profissão: figura pública. Como assim? Expliquem-me, por favor. Esse termo é tão vago e amplo que parece impossível caber na definição do que alguém é. Aliás, ele não diz absolutamente nada. Qualquer um pode ser. Até eu, que estou bem longe desse conceito. Até recentemente, sentíamos orgulho em preencher um formulário e depois acrescentar: professor, arquiteto, jornalista, psicólogo. E havia uma base de formação sólida, anos de estudo, outros tantos de prática e a vida se encarregando de colocar em destaque os que mereciam. Agora é bem diferente, parece. Basta dar uma olhada em qualquer rede social para descobrir a reviravolta que ocorreu nos últimos anos. Muitos salivam diante da palavra “seguidores”. Uau, tenho dez mil, trinta e dois mil, mais, mais. E, para espanto dos que ainda estão incrédulos, os que somam números na casa das centenas de milhares são exatamente aqueles que postam imagens de si mesmos. Muitas vezes sem legenda, sem nada. Só rosto e, se tiver, corpão. Ok, como diz um amigo meu, a beleza é um acontecimento. Mas, você não acha que ela precisa vir acompanhada de uma boa conversa para evitar que se esvaia rapidamente?
Sei que estou completamente fora da curva comportamental do nosso tempo. Porém, se posso chamar isso de evolução, mereço algum crédito. Esforço-me para partilhar, com quem se agrada de meu trabalho, alguma imagem, texto ou fala com um mínimo de conteúdo. Sinceramente, não considero a minha existência tão trepidante a ponto de gerar algo, digamos assim, de grande impacto todo santo dia. Procuro, isso sim, capturar alguma manifestação que fuja do banal e que tenha me emocionado. Longe dessa observância, resvalaremos no mais puro narcisismo. E dê-lhe foto de comida, de cachorrinho fofo, de passeio pelo shopping. Sei que esse papo é meio ranzinza, mas acho bom às vezes mostrar que o rei está nu. Aceitar tudo sem questionar nos priva da aptidão de desenvolver o senso crítico. E ele se faz cada vez mais necessário nestes dias de overdose de tudo. Particularmente, dedico uma fração do meu dia para esse mundo que, reconheço, pode ser bem instigante. Mas, creia, sem filtro e sem peneira, vira terra de ninguém.
Observei um fenômeno curioso: quanto mais vasculho no mundo online, mais diminui minha capacidade de concentração. Ao absorver de tudo um pouco, quase simultaneamente, acaba parecendo meio tedioso ver um filme de cada vez, ler um livro de cada vez – do começo ao fim. Portanto, é improvável que eu venha a fazer a defesa incondicional dessas conexões. Participo prazerosamente, mas com renovada prudência. Adoro ser uma figura privada. Quanto muito, um influenciador analógico.