As redes sociais normatizaram um tipo de comportamento que parecia ser pouco comum nas relações cotidianas: pode-se (e deve-se) dizer tudo o que se pensa. Você publica sem censura o que acha do dono da quitanda e também do presidente da república. Alguém o impede? Parece que chegou a hora de finalmente democratizar a opinião, essa sagrada instituição a que todos têm acesso hoje. Parabéns, a isso se chama democracia. Um fato relevante, a despeito dos ganhos provenientes dessa atitude tão contemporânea, é que desapareceu qualquer filtro, a mera possibilidade de analisar a priori o que, de certa maneira, se eternizará nesse universo volátil. Sinceramente, o que se tem visto por aí não é nada bonito. O que para muitos soa como sinceridade, facilmente receberia a designação de indelicadeza, a um escrutínio mais demorado. E se ficasse restrito a esse tipo de contato, as consequências negativas talvez fossem menos ruins. O problema é que muitos estão se autorizando essas práticas no que antigamente chamávamos de vida real. Tente lembrar, era aquela em que as pessoas conversavam entre si, olho no olho, e ainda mantinham certo pudor ao usar a linguagem que foi o pilar de todas as civilizações.
Está aí algo sobre o qual mantenho um cuidado permanente: a escolha das palavras na hora de me referir a situações ou sentimentos que envolvem os demais. Sinto literalmente pavor de magoar. Tudo é subjetivo e preciso levar em conta que o que me deixa indiferente pode ser razão de sofrimento. Como posso simplesmente sair por aí dizendo o que quero em nome de uma independência que mais machuca do que liberta? Tenho preferido ouvir largamente, nestes tempos em que a voz se tornou onipresente, bem antes da reflexão. É evidente o fascínio que as plataformas digitais exercem sobre todos nós. Elas possibilitam o acesso à informação quase ilimitada e, em tese, à consequente formação de um senso crítico que nos salvaguarda de ideias impostas por quem se imagina detentor da verdade. Sigamos por aí, mas ponderando sempre que o trato com o outro pressupõe uma avaliação do que se passa no campo da sensibilidade. Permitir-se dizer indiscriminadamente é o caminho mais curto para a grosseria, que nome diverso não há. Tenho arrepios toda vez que começam uma frase assim: “Tu me desculpe, mas vou dizer o que acho, mesmo que te ofenda.” Precisa? É bem questionável.
Não guardo nenhuma saudade da época em que as coisas eram veladas, proibidas, acanhadas. Os encontros resultam muito mais arejados e saudáveis quando nos liberamos para ampliar a autenticidade. Evitemos confundir, no entanto, autonomia com falta de educação. A vida fica bem melhor quando consideramos o outro, esse ser tão propenso a se magoar quanto eu e você.