Imagine a seguinte cena: Três casais e um homem solteiro, todos amigos entre si, reúnem-se no apartamento de um deles para jantar. Ao primeiro brinde, alguém propõe uma brincadeira que julga inocente: durante algumas horas, enquanto estiverem fazendo a refeição, colocarão seus celulares sobre a mesa. Qualquer ligação ou mensagem que entrar será partilhada com os demais. Em princípio sem grande resistência, todos acabam aceitando. O que se verá em seguida oscila entre o horror e a comédia. Sem nunca deixar de ser divertido e reflexivo ao mesmo tempo, o filme Perfectos Desconocidos (Netflix), do diretor Álex de la Iglesia, pretende ser uma radiografia crua das relações afetivas, sobretudo aquelas contaminadas pela corrosiva passagem do tempo. Em diversos momentos, inevitável perguntar a si mesmo: será que eu teria a coragem de entrar num jogo assim? Tudo que vivo, em termos afetivos e sexuais, pode ser escrutinado em praça pública? Parabéns se respondeu com um categórico sim às duas questões, sem pestanejar. Eu, como a maioria dos mortais, hesitaria, pois quem não guarda algo que não quer partilhar com os demais? Provavelmente está longe de ser bombástico, mas, por situar-se nos escaninhos da intimidade, assim quer permanecer.
Opinião
Gilmar Marcílio: perfeitos desconhecidos
Você deixaria seu celular sobre a mesa, partilhando com todos as ligações e mensagens recebidas?
Gilmar Marcílio
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